Política

Julgamento de Bolsonaro, dia 2: advogados de ex-presidente e generais questionam provas da trama golpista, delação de Cid e conduta de Moraes

A defesa de Bolsonaro afirmou que não há 'uma única prova' da participação do ex-presidente no 8 de janeiro e contestou a delação de Cid. O advogado disse ainda que pena de 30 anos 'não seria razoável' e pediu absolvição

Por G1 03/09/2025 15h25
Julgamento de Bolsonaro, dia 2: advogados de ex-presidente e generais questionam provas da trama golpista, delação de Cid e conduta de Moraes
Celso Vilardi, advogado de Bolsonaro, no segundo dia de julgamento no STF - Foto: Rosinei Coutinho/STF

O segundo dia do julgamento de Jair Bolsonaro e outros sete réus pela trama golpista teve apresentação das defesas do ex-presidente e de três generais.

A defesa de Bolsonaro na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) ficou a cargo dos advogados Celso Vilardi e Paulo Cunha Bueno.

Em suas argumentações, a defesa afirmou que Bolsonaro é inocente e que não há provas que o liguem aos atos golpistas, aos ataques de 8 de janeiro e ao plano de assassinar autoridades;
Disse também que a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de Bolsonaro, não se sustenta. E que houve várias violações do acordo;
Afirmou que Cid mentiu e "não é confiável";
Que o processo andou muito rápido no STF, e que por isso a defesa não pôde analisar todos os elementos;
Afirmou que Bolsonaro não incitou movimentos golpistas nem atos violentos;
E que a denúncia fala de atos preparatórios e que não houve tentativa de golpe. Segundo a defesa, todas as medidas discutidas estavam previstas na Constituição;
A defesa pediu a absolvição de Bolsonaro e disse que uma pena de 30 anos de prisão não seria razoável.

Nesta quarta-feira (3), a sessão aconteceu apenas na parte da manhã e durou quase quatro horas.

O julgamento voltará só na próxima terça-feira (9), a partir das 9h, com o voto do relator, o ministro Alexandre de Moraes. 

Veja o que disseram as defesas:

O advogado de Bolsonaro afirmou que “não há uma única prova” que ligue o ex-presidente aos ataques de 8 de janeiro e que o seu cliente não atentou contra o estado democrático de direito. Ele também questionou a delação de Mauro Cid, disse que o ex-ajudante de ordens mudou versões e “não é confiável”.

“Essa minuta, esse depoimento, não há uma única prova que atrele o presidente [ex-presidente Bolsonaro] à Operação Luneta, ao Punhal Verde e Amarelo e ao 8 de janeiro. Nem o delator falou isso. Não há uma única prova”.

O defensor afirmou que as contradições do tenente-coronel são motivos para anulação da colaboração premiada.

"Ele [Cid] mudou a versão várias vezes. E isso não sou eu que estou dizendo, é, na verdade, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal, no último relatório de novembro, quando se disse que ele tinha inúmeras omissões e contradições."

Vilardi argumentou que Cid foi "dirigido" e "induzido" a implicar Bolsonaro em um golpe. Ele negou a participação do ex-presidente na tentativa de golpe e disse que todas as medidas discutidas pelo núcleo estavam previstas na Constituição.

Ele disse também que a defesa não teve acesso a provas utilizadas no processo e que não houve prazo suficiente para a atuação. Sobre esse ponto, Vilardi criticou a maneira como a PF disponibilizou as provas colhidas, que somavam mais de 70 terabytes de dados.

"Nós não tivemos o tempo que a Polícia Federal e o Ministério Público tiveram [para analisar as provas]. São bilhões de documentos. Eu não conheço a íntegra desse processo".

Sobre a minuta do golpe, a defesa tentou desqualificar o documento. A defesa negou que Bolsonaro tenha discutido com os comandantes da Marinha e do Exército uma ruptura democrática e disse que, depois de uma reunião de dezembro no Alvorada, o assunto se deu por encerrado.

O defensor de Bolsonaro voltou a sustentar que ele realizou a transição para o governo Lula, no final de 2022, sem criar obstáculos — o que, na visão da defesa, contraria a acusação de tentativa de golpe.

"A prova produzida pela defesa mostra que o presidente Bolsonaro determinou uma transição".

Uma prova disso, segundo Vilardi, é que os comandantes das Forças Armadas não estavam atendendo as ligações de José Múcio, nomeado ministro da Defesa por Lula no final de 2022, e Bolsonaro foi responsável por fazer uma ponte entre eles.

O advogado reclamou de cerceamento de defesa, pediu absolvição de Bolsonaro e afirmou que 30 anos de prisão para o ex-presidente não seria razoável.

🔎O que pesa contra Bolsonaro? A investigação da Polícia Federal coloca Bolsonaro como planejador, dirigente e executor dos atos que levariam ao golpe de Estado. Um dos trechos do relatório afirma: "Tinha plena consciência e participação ativa" nas ações do grupo.

🔎 Já a Procuradoria-Geral da República afirmou, em denúncia, que o ex-presidente liderou uma organização criminosa que praticou "atos lesivos" contra a ordem democrática e que estava baseada em um "projeto autoritário de poder".

Braga Netto

José Luís Oliveira Lima, advogado do general Walter Souza Braga Netto, foi o último a falar. Ele passou boa parte do seu tempo contestando a validade da delação de Mauro Cid, disse que “não fica em pé de jeito nenhum’. Para o advogado, Cid “mente descaradamente”.

"Eu sou um defensor do acordo de delação premiada. Mas ele tem que ser coerente, tem que ter provas".

Para ele, o documento tem "vícios".

"Não se pode condenar alguém com base em uma narrativa. Tem que se condenar por provas".
Ele também afirmou que o tenente-coronel do Exército foi pressionado a delatar, o que já foi negado pela própria defesa de Cid.

'O que tem contra Braga Netto é essa delação mentirosa e 8 prints adulterados', diz defesa

O advogado afirmou que o ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice nas eleições presidenciais de 2022 é "inocente" e deve ser absolvido no julgamento sobre tentativa de golpe.

🔎 Braga Netto está preso no Rio de Janeiro sob a acusação de ter obstruído as investigações da trama golpista.

A exemplo da defesa dos demais réus, o advogado de Braga Netto reclamou da quantidade de documentos anexados ao processo e do pouco tempo para analisá-los. “É evidente que a defesa foi cerceada”, afirmou José Luis de Oliveira Lima.

Sobre a acusação que Braga Netto teria levado dinheiro para financiar o plano golpista, o advogado disse que Cid não foi assertivo sobre a data e as circunstâncias da entrega.

"É essa fala que vai pôr na cadeia o meu cliente por mais de 20 anos, 30 anos? É com essa mentira, com esse vai e volta que o meu cliente vai permanecer na cadeia e vai morrer no cárcere? Ele não consegue dizer onde foi, ele não consegue precisar a data".

🔎 O que pesa contra Braga Netto? A Procuradoria-Geral da República afirma que o general coordenou as ações mais violentas do grupo acusado de tramar um golpe de Estado após as eleições de 2022. E teve papel central na engrenagem golpista, mantendo contato direto com os manifestantes e articulando ações clandestinas com militares ligados ao governo.

Augusto Heleno

Primeiro a falar, o advogado de Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), questionou a conduta de Moraes em relação a testemunhas do caso e disse que um juiz não pode se tornar “protagonista do processo”.

“Nós temos uma postura ativa do ministro relator de investigar testemunhas. Por que o Ministério Público não fez isso? Qual é o papel do juiz julgador? Ou é o juiz inquisidor? O juiz não pode em hipótese alguma se tornar protagonista do processo."

Defesa do General Augusto Heleno questiona conduta de Alexandre de Moraes

Matheus Mayer Milanez negou a politização do GSI e disse que o general não pressionou militares por golpe.

"Que fique claro: nenhum militar foi procurado pelo general Heleno, nenhum militar foi pressionado [por ele]".

O advogado também questionou o uso da agenda de Heleno como prova, assim como negou a infiltração de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Outro ponto destacado pelo advogado foi o afastamento entre Heleno e Jair Bolsonaro. A defesa citou o depoimento do ex-assessor de comunicação do GSI afirmando que Heleno foi perdendo espaço no dia a dia do ex-presidente.

"Realmente, general Heleno foi uma figura de destaque. General Heleno foi uma figura política importante, tanto para a eleição quanto para o governo. Mas este afastamento é comprovado. Este afastamento da cúpula decisória".

A defesa de Augusto Heleno afirmou que o fato de ele ser citado como integrante de um gabinete de crise após um eventual golpe de Estado não significa que ele tenha participado da elaboração dessa proposta.

🔎 O que pesa contra Augusto Heleno? Ex-ministro do GSI é acusado de integrar o núcleo estratégico da organização criminosa e de ter papel ativo nas articulações golpistas. A PGR cita uma agenda com teor golpista apreendida em sua casa como indício de envolvimento.

Paulo Sérgio Nogueira

O advogado Andrew Fernandes, que representa o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira, afirmou que seu cliente tentou demover Bolsonaro de tentativas golpistas.

"O general Paulo Sérgio tinha a responsabilidade de ser o ministro da Defesa e honrar a memória de Caxias e das Forças Armadas".

Segundo a defesa, as provas de que ele não fez parte da trama foram os ataques sofridos por outros membros das Forças Armadas.

"Ele sofreu ataques virtuais. No dia do gabinete de crise, cadê o general Paulo Sérgio? Ele não está lá. Tá mais que provado que o general é inocente".

General Paulo Sérgio tentou demover Bolsonaro de tentativas golpistas, diz defesa

Para o advogado, "está mais do que provado que o general Paulo Sérgio é inocente".

"Ele não fazia parte dessa organização criminosa".

O advogado de Paulo Sérgio afirmou ainda que foi "infeliz" a fala do general sobre a fiscalização das urnas eletrônicas ser para "inglês ver". Ele diz que a parceria entre o Ministério da Defesa e a Justiça Eleitoral sempre rendeu bons frutos, como o teste de integridade com biometria.

🔎 O que pesa contra Paulo Sérgio Nogueira? Ex-ministro da Defesa é acusado de ter buscado apoio das Forças Armadas para a tentativa de golpe e de ter papel ativo na articulação do núcleo crucial. A PGR aponta que ele participou de discussões para sustentar a ruptura institucional.