Política

Governo do Estado e movimentos sociais repudiam novos ataques racistas

Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares, comete atrocidades contra negros

Por Carlos Victor Costa com Tribuna Independente 04/06/2020 08h35
Governo do Estado e movimentos sociais repudiam novos ataques racistas
Reprodução - Foto: Assessoria
Ferindo a sua própria identidade racial, o presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo, voltou a ser destaque nacional, ao classificar – em uma reunião a portas fechadas com dois servidores, no dia 30 de abril – o movimento negro como “escória maldita”, que abriga “vagabundos”, e chamar Zumbi dos Palmares de “filho da puta que escravizava pretos”. Em outro trecho do áudio obtido pelo jornal Estado de S. Paulo, ele se refere a uma mãe de santo como “macumbeira” e prometeu botar na rua diretores da autarquia que não tiverem como “meta” a demissão de um “esquerdista”. O Ministério Público Federal (MPF) já havia encaminhado representação à Procuradoria da República no Distrito Federal, no mês passado, pedindo que Sérgio Camargo responda na Justiça por improbidade administrativa. A iniciativa foi tomada depois de Camargo ter determinado, no dia 13 de maio – data em que a abolição da escravatura completou 132 anos –, a publicação de uma série de artigos depreciativos sobre Zumbi, símbolo do movimento negro no Brasil, no site oficial da instituição e nas redes sociais. Mais um constrangimento que parte de integrantes do governo Bolsonaro repercute em Alagoas. Ainda na terça-feira (2), o governador Renan Filho (MDB) utilizou o seu Twitter para repudiar a fala de Sérgio Camargo. “Manifesto repúdio em nome dos alagoanos e da memória de Zumbi dos Palmares, guerreiro em defesa da liberdade. Você não nos representa, Sérgio Camargo”. REPULSAS Membro do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial de Alagoas (Conepir), e coordenador do Núcleo de Estudos Afro brasileiros da Universidade Estadual de Alagoas (Uneal), Clébio Araújo classifica as falas de Sérgio Camargo como criminosas. “Nós do movimento negro entendemos que ele está agindo de forma criminosa em dois aspectos: tanto em quanto gestor, por crime de improbidade mesmo, a condução que ele está dando para as políticas da fundação e ele verbaliza isso nos áudios que vazaram. Que vai fazer retaliações a aspectos centrais das comunidades negras tradicionais, que são as comunidades religiosas de matriz africana e os capoeiristas. Ele age criminosamente ao fazer aquelas afirmações de que não vai ter dinheiro para nada lá, que desistam de qualquer recurso, inclusive declarando como presidente da fundação que vai recusar emendas parlamentares para investimentos nessas áreas, isso por si só já atenta contra os interesses do próprio órgão”. RACISMO As declarações de Sergio Camargo, segundo Clébio também configuram crime de racismo, quando ele faz menção a Yalorixá Mãe Baiana, mãe Adna Santos, como sendo macumbeira. “Ela é uma pessoa altamente comprometida com a questão do combate ao racismo e ele faz menção a ela de forma extremamente preconceituosa por ela ser de religião de matriz africana, usando o termo macumbeira. A outra situação que configura racismo é a declaração dele que o movimento negro é composto por uma escoria formada por vagabundos. Qual é o pressuposto que ele tem para fazer uma afirmação dessa? A não ser o preconceito explicito contra os membros do movimento negro justamente em função de serem negros e quando eu digo negro, não é só terem a pele preta, mas se posicionarem culturalmente do ponto de vista das suas identidades a partir das africanidades”. Para o militante do Coletivo Cia Hip Hop de Alagoas e integrante do Instituto do Negro de Alagoas, Geysson Santos, o silêncio do governo federal, apesar de ser lamentável, não é novidade. “Na verdade, as declarações do Sérgio Camargo só compactuam com uma agenda do próprio governo, se não fosse, o Bolsonaro sequer tinha nomeado o Sérgio Camargo depois de toda mobilização que houve por parte do movimento negro. Para o governo federal, a parcela da população que não o apoiou, é seu inimigo”. Geysson Santos destaca ainda que a postura de Sérgio Camargo se trata de uma divergência política em respeito ao seu pai, Oswaldo Camargo, um intelectual histórico do movimento negro brasileiro, que contribuiu de forma poética e política na consolidação e legitimação do Movimento Negro no Brasil. “Entretanto, seu filho segue o caminho inverso. Sérgio Camargo ficou conhecido não por atuar positivamente no movimento negro, e sim por protagonizar polêmicas com esse setor, onde, entre vários acontecimentos, proferiu comentários como ‘A escravidão era um negócio lucrativo tanto para os africanos que escravizam, quanto para os europeus que traficavam escravos. A diferença é que europeus não escravizam mais. Já os africanos…’, reproduzindo uma narrativa desonesta, revisionista e medíocre com o que representou a luta do negro em toda diáspora”. Sociólogo explica conflitos como criação de pautas-bomba   Para o sociólogo, Carlos Martins, o governo Bolsonaro tem uma linha ideológica que desde sempre foi bem evidenciada e paralelo a isso a estratégia que esse governo tem utilizado é a da distração, como por exemplo, criar pautas-bomba, além de fazer ataques a fundamentos importantes como a igualdade muito defendida pelos movimentos sociais e em particular o movimento negro, que trabalha na causa da igualdade racial. [caption id="attachment_379650" align="aligncenter" width="648"] Carlos Martins diz que grupos do governo seguem a linha racista (Foto: Sandro Lima / Arquivo)[/caption] “Quando eu digo Bolsonaro, eu estou falando de um grupo que ele representa e desde sempre tem se posicionado com posições racistas em relação a essas questões. Todos que assumem um cargo no governo Bolsonaro vai cumprir essa pauta bomba, vai fazer o papel de deslegitimar determinados princípios. O que o Sérgio Camargo faz é nada menos que se utilizar da condição de ser negro, ele está sendo utilizado claro, ele sabe disso, e concorda com isso, em nome de assumir posição de privilegio, ele se presta a esse papel de fazer esses ataques de deslegitimar a luta contra o racismo. Ele é só mais um fantoche do governo Bolsonaro para fazer distração dentro de uma agenda racista e misógina”, argumenta. De acordo com o sociólogo. as pautas-bomba são apresentadas como uma distração para a opinião pública, para a imprensa, para a população, mas principalmente para a imprensa que demanda pauta. “Então as pessoas vão ler o quê? Vão assistir o quê? A partir da imprensa e o governo manipula a imprensa também, faz a imprensa construir na direção dessas pautas-bomba e aí outras questões importantes estão sendo encaminhadas lá no Congresso Nacional, principalmente dentro desse processo. Foi assim desde o começo, as pautas-bomba são usadas para distrair e manipular a imprensa e por consequência a população, enquanto isso as privatizações estão acontecendo, mas isso não é pauta, não está sendo discutido. O Paulo Guedes fala da privatização dos bancos públicos, mas isso não tem sido pauta, o que tem sido pauta são sempre essas pautas-bomba, essas distrações, porque repara, chamar o movimento negro de escória maldita rende mais matéria do que privatizações”, finaliza.