Economia

Oposição deve tirar Bolsonaro do conforto discutindo os temas econômicos, diz Ciro

Ao El País, pedetista disse que as pautas identitárias são importantes, mas ficar apenas nelas é deixar o presidente 'escolher o campo de batalha' e levar vantagem

Por Jornal GGN 08/01/2019 09h39
Oposição deve tirar Bolsonaro do conforto discutindo os temas econômicos, diz Ciro
Reprodução - Foto: Assessoria
Se a oposição entrar na onda de Jair Bolsonaro e discutir apenas pautas identitárias, o presidente ficará exatamente onde pretende ficar: na zona de conforto, onde pode manter o capital político que conquistou nas urnas em 2018. Se quiser chacoalhar o governo, o ideal é que a oposição puxe Bolsonaro para discutir os temas econômicos, a começar pelas medidas que gerarão emprego, que sequer foram mencionadas no discurso de posse do eleito de extrema-direita. Em entrevista ao El País, Ciro disse que as pautas identitárias são importantes, mas ficar apenas nelas é deixar Bolsonaro "escolher o campo de batalha" e levar vantagem. "Seria um grave erro a gente aceitar a provocação do Bolsonaro de discutir identitarismos. A esmagadora maioria do povo brasileiro, que é pobre, está desempregada, assustada com a violência, maltratada na rede de saúde... Essa gente tende a entender nossas razões se estas razões forem discutidas. Mas se a gente for discutir 'kit gay'... não que o assunto não mereça discussão. Estou só dizendo que o Bolsonaro não pode escolher o campo de batalha." Para Ciro, "Bolsonaro trabalha com duas agendas. Uma ele vai reinar mais facilmente, que é a agenda de costumes: redução da maioridade penal, facilitar o acesso à arma, agravar a legislação de execução penal. (...) A outra agenda, que é para a qual devemos chamá-lo, é a do emprego, palavra que ele não citou uma vez sequer, nem no discurso oficial. Devemos chamá-lo para a questão dos juros, da inadimplência de 63 milhões de brasileiros que estão com o nome sujo no SPC. Para discutir a questão da aposentadoria", disse. "Precisamos discutir aqueles assuntos que ele vai fugir deles", acrescentou. Segundo a visão do ex-presidenciável do PDT, as questões econômicas impõem ao novo governo dois problemas: o primeiro é que são pautas naturalmente graves e complexas. O segundo é que Bolsonaro "não entende o problema, a equipe dele não entende o problema e, quando entende, interpreta de forma equivocada. Portanto, o remédio que vão propor será o remédio errado, que tenderá muito mais a agravar a doença socioeconômica do Brasil do que mitigá-la." O PT E A RESSACA DO SEGUNDO TURNO Confrontado com o fato de que viajou à Europa em meio ao segundo turno da disputa presidencial, deixando a chapa de Fernando Haddad (PT) sem apoio oficial do PDT, Ciro respondeu com críticas ao que chama de "burocracia petista". Ele também afirmou que seu apoio oficial não faria diferença numa eleição cujo resultado já vinha sendo indicado pelas pesquisas de opinião, com derrota iminente do PT. E acrescentou que o problema do PT não é Haddad mas a cúpula que detém o poder há anos. "Não estava na minha mão. (...) Se eu achasse que ia fazer diferença [o apoio oficial], eu engolia de novo [as críticas e subia no palanque do PT], como engoli lá atrás [com Dilma]. Agora, me obrigar, por uma solidariedade ao campo progressista... o Haddad é progressista, sem dúvida. Mas o PT é uma força corrupta. Estou falando da cúpula do PT, não da sua base", disparou. Em outra passagem, Ciro afirmou: "Votei no Haddad como cidadão, mas não voto mais nesta burocracia do PT. Não faço campanha com eles nunca mais. De lá pra cá eles se corromperam. Essa é a triste, dura e sofrida realidade. Apodreceram. Tomaram gosto pelas benesses do poder." Indagado sobre a possibilidade de fazer oposição ao governo Bolsonaro ao lado do PT, Ciro disse que é uma ideia viável. Mas insistiu que, para isso, a "burocracia" do PT precisa recuar e abrir-se para o diálogo com as demais legendas de centro-esquerda e esquerda. "Nosso inimigo não é o PT. Agora, nós precisamos não nos comprometer. Estou falando sob o ponto de vista histórico. Precisamos dar ao jovem brasileiro uma plataforma em que ele não precise de um salvador da pátria, de um guru, de um líder carismático que, preso, de dentro da cadeia, fica mandando recado. Isso é o fundo do poço. Não quer dizer que a gente abandone o Lula. A questão central do país não pode ser identitarista ou o salve Lula. Enquanto a agenda for esta, estamos fazendo exatamente o que o Bolsonaro quer que a gente faça." Ciro ainda revelou que está escrevendo um livro sobre os caminhos para o País, e disse que irá se dedicar a palestras e a apresentar ao jovem brasileira "a" via alternativa a Bolsonaro. Ele também disse que dará a Bolsonaro uma trégua de 100 dias, para ele se adaptar à realidade do governo, menos pelo presidente e mais por "respeito" aos milhões de brasileiros que o elegeram. "(...) nós temos que ter essa sensibilidade." Segundo o jornalista Florestan Fernandes Junior, responsável pela entrevista, Ciro apresentou-se, sempre que pôde, como o "pós PT".