Interior

Esquema irregular de venda de óculos renderia R$ 960 mil a oftalmologistas

Mutirão realizado por médicos em Murici oferecia consultas gratuitas, desde que fossem pagos valores abusivos por óculos

Por Tribuna Independente 07/03/2017 10h44
Esquema irregular de venda de óculos renderia R$ 960 mil a oftalmologistas
Reprodução - Foto: Assessoria

Cerca de 1.600 pessoas na cidade de Murici, em Alagoas, se tornaram alvo de um suposto esquema de irregularidades detectado pelo Conselho Regional de Medicina de Alagoas (Cremal). A fiscalização constatou a prática de venda de óculos com alegação de prestação de serviço social e diagnósticos oftalmológicos imprecisos. Cada óculos seria vendido a R$ 600,00, o que poderia gerar uma renda média de R$ 960 mil apenas na cidade.

A fiscalização realizada na manhã de ontem (6) identificou que três médicos de São Paulo realizavam triagem de pacientes em cidades alagoanas onde aconteciam os mutirões. A empresa, registrada em Goiás, que tinha os médicos como sócios, produzia os óculos de acordo com os atendimentos realizados, mas com um preço muito acima do mercado.

“Eles não cobravam a consulta, mas nos valores dos óculos já vinha a consulta embutida. Os óculos chegavam a R$ 600,00, onde um óculos para pessoas de baixa renda, com receita, não passa de R$ 200,00. Só em Murici iam atender 1.600 pessoas. Imagina o lucro que eles teriam”, diz o presidente do Cremal, Fernando Pedrosa.

Ainda segundo Pedrosa, as irregularidades vinham sendo investigadas há três meses, mas o suposto esquema estava em atividade no Estado desde setembro do ano passado.

“A equipe médica entrava em contato com a Secretaria de Saúde dos Municípios com a alegação de que iria realizar um trabalho comunitário”, diz Fernando Pedrosa.

Um paciente de Marechal Deodoro fez a denúncia a partir de um produto mal confeccionado pela empresa, a partir daí as investigações começaram.

“Como esses médicos haviam se inscrito no conselho, solicitando a inscrição provisória, dizendo que iam fazer um trabalho humanitário, nós acreditamos que era uma ONG [Organização não Governamental]. Aí, foi quando uma pessoa que tinha feito exame de vista  e os óculos com essa empresa procurou uma conselheira nossa dizendo que não tinha ficado bom e que ia deixar de pagar, mas tinha começado a sofrer ameaças de cobrança, de inclusão em cadastro de crédito, foi aí que descobrimos que não era trabalho humanitário, que era um trabalho vinculado e irregular”, explica.

A prática segundo o presidente do Cremal “não é legal e nem ética, chamada de venda casada”, porque obriga os pacientes a confeccionarem os óculos a partir de uma consulta aparentemente ‘gratuita’. Outro problema encontrado foi a forma como o diagnóstico era realizado, com um equipamento insuficiente para detectar patologias na visão.

“Eles fizeram uma triagem e identificaram quem supostamente pode ter um déficit visual. O equipamento que eles têm lá não é suficiente para a consulta. É uma máquina destinada à medição do grau, que não detecta outros problemas. É possível que pessoas tenham sido diagnosticadas inadequadamente ou pago por óculos que não precisavam de fato”, destaca o presidente.

COMUM

A venda casada de consultas e óculos é recorrente no Estado, diz o presidente Fernando Pedrosa. Segundo ele, o órgão está em alerta e realizando fiscalizações no sentido de coibir práticas irregulares.

“Nós estamos nesse encalço também, já condenamos um médico que trabalhava com isso e estamos aguardando a decisão da Justiça para dar divulgação da sentença. Muitas pessoas, sem a devida capacitação, atuam receitando óculos. É o caso dos optometristas. Para eles precisamos do apoio da Polícia e Vigilância Sanitária porque não são médicos. Fizemos uma operação em Arapiraca há três semanas nesse sentido”, diz.