Cidades

Mineração de sal-gema provocou afundamento de bairros de Maceió

Extrações feita pela Braskem são responsáveis danos causados à população de Bebedouro, Mutange e Pinheiro

Por Evellyn Pimentel com Tribuna Independente 09/05/2019 09h02
Mineração de sal-gema provocou afundamento de bairros de Maceió
Reprodução - Foto: Assessoria
Após mais de 400 dias de espera, moradores dos bairros do Pinheiro, Bebedouro e Mutange, em Maceió, receberam nesta quarta-feira (8) a informação conclusiva de que as atividades de mineração da Braskem são responsáveis pelo fenômeno de subsidência, ou afundamento, da região. Num clima de forte tensão e com a presença de autoridades, órgãos públicos locais e federais, além dos moradores, a audiência pública realizada no auditório da Justiça Federal em Alagoas (JFAL) trouxe a apresentação do geólogo e coordenador dos estudos do serviço Geológico do Brasil, Thales Sampaio. Segundo ele, o que tem havido na região é um processo de desestabilização do terreno decorrente da exploração de sal. “O CPRM [Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais] com base em todos os estudos chegou à conclusão que está havendo desestabilização das cavidades de sal-gema provocando halocinese, [movimentação do sal], e criando uma situação dinâmica com reativação de estruturas geológicas antigas, subsidência [afundamento] do terreno e deformações rúpteis na superfície [trincas no solo e nas edificações] em parte dos bairros Pinheiro, Mutange e Bebedouro”, disse Thales. Em outras palavras e confirmando os estudos do professor e pesquisador Abel Galindo, entrevistado em diversas oportunidades pela reportagem da Tribuna Independente, as minas da Braskem foram perfuradas em áreas de falhas geológicas. O fenômeno provocou a reativação destas falhas, principalmente a denominada “Falha do Mutange” que tem provocado os maiores impactos. A exploração de sal-gema provocou a movimentação do sal, culminando na formação de um processo chamado de halocinese. Ou seja, houve desabamento dos tetos das minas, despressurização, e uma informação considerada inesperada até pelo CPRM, algumas chegaram a mudar de forma e posição. “A equipe técnica analisou também dados de sonares que foram integrados com informações geológicas e de extração de sal em ambiente 3D. O resultado mostra que há indícios de que a atividade de extração de sal-gema alterou o estado de tensão in situ [natural ou normal] de todas as unidades geológicas, gerando colapso de algumas cavidades e aumentando a instabilidade das unidades”, destacou o relatório. Uma das minas, a de número 7, situada às margens da Lagoa Mundaú subiu 150 metros, passando da camada de sal a 900 metros para uma camada acima, a 750 metros. “É um resultado inesperado, pois estas cavidades preenchidas pelas salmouras gerariam anomalias consultivas em vermelho e não em azul. Significa que as salmouras que deveriam estar nas cavidades”, explicou Thales Sampaio sobre os resultados de um dos métodos geofísicos empregados pelo CPRM. “No sonar de 2019, a mina 19 apresenta uma forma geométrica muito irregular e inusitada para o padrão esperado. O reduzido volume, em comparação ao levantamento do sonar anterior, leva à hipótese do colapso quase total dessa cavidade. A mina 7 foi paralisada em junho de 1987 [32 anos]; e os resultados dos sonares de 1989 e 2019 mostram uma grande variação vertical na posição da cavidade [200m]. Isto pode ser explicado pelo contínuo desplacamento do teto da cavidade” Ainda segundo o relatório, seis minas da Braskem se fundiram. “De acordo com os relatórios existentes da Agência Nacional de Mineração, pelo menos seis minas se juntaram duas a duas, formando assim três grandes cavidades”. O estudo de sonar entregue pela empresa Braskem corresponde a 8 das 35 minas da empresa, sendo 3 ativas e 5 inativas. No entanto, segundo Thales Sampaio, pelo fato de a Braskem não ter fornecido até a data de apresentação do relatório, as informações das 35 minas, não é possível determinar a real situação delas. “Foram detectadas evidências de desabamento parcial em profundidade na região das minas 7 e 19. A ocorrência de desabamentos em outras minas não pode ser descartada, haja vista a ausência de dados recentes de 27 das 35 cavidades existentes”, reforçaram os estudos liberados nesta quarta pelo CPRM. CPRM reitera a necessidade de evacuação em áreas residenciais   Para os moradores que estiveram presentes à apresentação do laudo da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), a sensação foi de alívio. Durante a audiência pública, houve pedidos de “Fora Braskem” e “Bloqueio Já”, em alusão ao pedido de bloqueio de R$ 6,7 bilhões nos lucros da mineradora, impetrado pelo Ministério Público Estadual (MPE) e Defensoria Pública Estadual (DPE). Ao fim da apresentação, um grupo de moradores pediu providências. [caption id="attachment_299073" align="alignright" width="213"] Geraldo Vasconcelos defende maior efetividade para cobrar medidas contra a Braskem (Foto: Sandro Lima)[/caption] Para Geraldo Vasconcelos, a confirmação de que o fenômeno não foi causado por agentes naturais traz alívio à população. “O movimento agora quer a efetividade do bloqueio, amanhã [quinta-feira, 9] ou depois estaremos no Tribunal de Justiça de Alagoas pedindo a celeridade no bloqueio. Estamos satisfeitos. O CPRM fez ciências e não se deixou levar por pressões políticas ou econômicas, como deve ser. Sabíamos que era a Braskem, mas o que não sabíamos que fosse de uma forma tão contundente. Acreditávamos que seria uma culpa com ações secundárias, mas esses fatores foram insignificantes” PROVIDÊNCIAS Apesar de tornar pública a causa dos fenômenos, a audiência pública não apresentou as providências que serão adotadas a partir de agora. O mapa de feições foi atualizado e segundo CPRM atinge novas áreas que precisarão ser evacuadas, no entanto os órgãos presentes na audiência ainda não haviam definido como o processo se dará. Segundo o secretário Nacional de Proteção e Defesa Civil, coronel Alexandre Lucas Alves, reuniões ao longo desta semana serão realizadas com órgãos públicos locais e uma base da Defesa Civil Nacional será instalada em Maceió a partir da próxima semana. “Sabemos que é preciso realizar um novo cadastramento e outras áreas serão desocupadas. São prejuízos econômicos e sociais. Retirar pessoas de suas casas é um prejuízo social incalculável. Temos que trabalhar a defesa como um sistema no qual todos devem se agregar a analisar o que pode ser feito, quem efetivamente vai ter que sair, vai ser monitorado, qual o limite da área. Isso não é simples, é muito complexo. Como o CPRM reuniu mais de 50 profissionais, a partir de agora temos que reunir profissionais também do mais alto gabarito para que a gente possa solucionar esse problema”, justificou. Serviço Geológico não conhece atual condição das 35 cavidades   Segundo o geólogo Thales Sampaio, do Serviço Geológico do Brasil, é certeza de que há risco para as famílias que estão residindo no bairro do Pinheiro. [caption id="attachment_299074" align="aligncenter" width="640"] Moradores que participaram da coletiva celebraram o resultado do laudo apresentado pelos técnicos (Foto: Sandro Lima)[/caption] “O mapa de feições continua valendo porque as casas já estão em estado de perigo. O novo mapa que está pronto, precisa estar compreensível e por isso não vamos falar sobre ele hoje [quarta-feira, 8]. Esse mapa integra todas as informações, vai mostrar os processos que geram risco ou perigo. Depois de muitas reflexões nós do Serviço Geológico do Brasil não podemos garantir a presença de moradores no bairro do Pinheiro. Nós não sabemos como estão as 35 cavidades, só sabemos como estão 8. Por não sabermos, não podemos garantir a integridade dos imóveis” , detalhou. ROMPIMENTOS Ainda de acordo com o laudo apresentado pelos geólogos da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), seis eventos sísmicos foram registrados nos pontos onde há minas decorrentes da exploração de sal-gema realizados pela empresa de mineração Braskem. “O movimento foi sentido porque teve um epicentro raso, o pequeno sismo não foi responsável pelos quebramentos. A forte percepção foi em decorrência da baixa profundidade a 1000, 1100 metros. Eventos sísmicos no Pinheiro não são tradicionais, esse tipo de sismos pode estar associado a um deslizamento entre dois blocos ou rompimento entre blocos”, argumentou Thales Sampaio. DRENAGEM Para o geólogo Thales Sampaio as hipóteses iniciais de que a exploração de aquíferos e condições geotécnicas e ocupação do bairro do Pinheiro, em Maceió, estão descartadas porque por si só não causam os fenômenos registrados. “A falta de drenagem e saneamento não explica o que está acontecendo no [bairro] Pinheiro. Fatores geotécnicos não pode ser associado ao processo de subsidência [afundamento]. Eles não são a explicação, mas assumem papel importante”. DEFESA CIVIL O coordenador da Defesa Civil de Maceió, Dinário Lemos explicou que a partir da divulgação do laudo do CPRM, a situação passa para outra realidade. “Agora é um novo momento. Vamos sentar com eles para que possamos programar novas ações. Nos reuniremos durante a semana e em diante começam os trabalhos internos para isso”, comentou.