Cidades

Pinheiro: “Há perguntas que precisam ser respondidas”

Para a professora e pesquisadora da Ufal Rochana Campos, solução paliativa pode ser dada à região do Pinheiro até conclusão de estudos

Por Tribuna Independente com Evellyn Pimentel 09/03/2019 09h44
Pinheiro: “Há perguntas que precisam ser respondidas”
Reprodução - Foto: Assessoria
A reportagem da Tribuna Independente conversou com a Doutora em Geociências e professora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Rochana Campos sobre o fenômeno geológico que tem ocorrido no bairro do Pinheiro em Maceió. Rochana Campos tem participado das reuniões e discussões em torno do tema.  Ela classifica a situação como “única no Brasil” e defende o trabalho realizado pelo Serviço Geológico do Brasil na elucidação das causas das rachaduras. Ainda segundo a pesquisadora, uma medida paliativa pode ser executada na região para evitar o agravamento das fissuras, mas é preciso paciência para que todas as etapas das investigações sejam realizadas. Tribuna Independente - Existe a possibilidade das hipóteses levantadas pelo CPRM - exploração de aquíferos, extração de salgema e falhas geológicas - estarem convergindo para causar o fenômeno das rachaduras ou só um desses fatores já poderia causar todo o processo? Rochana Campos - O primeiro fator é o arcabouço geológico, já existe, está lá. Desde que o Pinheiro se formou. Quando os continentes se separaram, já estava tudo falhadinho. Como essas falhas lá embaixo podem estar interferindo em cima é o que está sendo investigado. E por que só agora? Também é outra pergunta que se deve fazer. Há muitas perguntas que precisam ser respondidas. As falhas já estão lá. Eles [CPRM] estão comprando fotografias de dez anos atrás para saber como esse bairro vem se comportando. Eles estão usando o melhor que se tem na parte geológica, mas não podemos ter respostas da noite para o dia. Por outro lado temos a população há um ano sem respostas. O processo de afundamento, que chamamos na geologia de subsidência, já estava acontecendo há dez anos e pode ter vindo de mais tempo. Só que não se tem muitas informações. Quem é morador antigo sabe que ali era um encharcado, que foi aterrada uma boa parte, mas isso não justifica o fissurado. O que justifica estar fissurando é um processo geológico. Está lá embaixo. Como isso está se dando, isso é que o CPRM está investigando. Aí surgiram as hipóteses por exemplo, de que poderia ser água subterrânea, aí o CPRM está perfurando uma série de poços para identificar solos colapsados por essas falhas. A falha é uma espécie de cicatriz do solo, e por aí vai. Eles estão fazendo estudos de até 1.500m. Então vai ultrapassar a camada de sal e eles vão poder saber o que está acontecendo. Tribuna Independente - É possível vislumbrar uma saída, uma solução diante das hipóteses apresentadas pelos técnicos do Serviço Geológico do Brasil? Rochana Campos - Existe uma proposta [paliativa]. Retirar toda a água da bacia endorreica, ou seja, fazer um sistema de drenagem que tire toda essa água do local. É possível tirar a água, é uma das primeiras propostas. Retirar a água da chuva, porque não é com a chuva que piora? Toda vez que chove piora a situação. Então uma das propostas é enquanto não tiver o estudo todo, completo, retirar água daquele local. Só que é um projeto caro, se fosse um morro seria mais fácil, mas ali precisaria de um cinturão no bairro inteiro para não deixar a água da chuva chegar. Colocar um sistema de bombas com capacidade para isso... Depois dos estudos finalizados é que virão as outras propostas, reurbanizar, reflorestar áreas. Mas isso é cedo, sem o fim da investigação. Não podemos culpar o CPRM. As pessoas não entendem que o processo geológico não é algo fácil de estudar. É um caso único. Alguns equipamentos foram comprados agora especificamente para esse projeto. É preciso cuidado. Temos ali pessoas, pessoas que só têm aquela casa para morar. Que estão aposentadas. É o lado social. Tribuna Independente - Diversas publicações atestam a existência de falhas geológicas no solo de Maceió. O que pode contribuir para que estas falhas estejam dando esse “reflexo” na superfície? Rochana Campos - Uma reativação. A chuva passando por esse plano elevando os finos. Quando a água escorre, vai lavando. Por isso que dizem que quando chove é preciso sair. Mas tudo precisa ser provado através dos estudos. Tribuna Independente - Considerando sua experiência,  as ações realizadas até o momento pelas Defesas Civis e Serviço Geológico têm sido adequadas? Rochana Campos - Falamos desde o início que é preciso paciência. Mas é difícil ter paciência com a casa toda fissurada. O mapeamento da área de risco foi correto de ser feito. Toda região que apresente risco precisa disso. Para que se tenha noção onde está o foco, onde está pior. O treinamento que foi feito no dia 16 está correto. Podem dizer que deu errado e realmente deu, mas é melhor fazer do que não fazer nada. Porque naquele momento se acontecer uma coisa pior, que pode acontecer ou não, as pessoas precisam de um acompanhamento. Aquilo [simulação] serviu como um norte, uma ação da Defesa Civil Estadual e Municipal. O treinamento é preciso para identificar as falhas e acertos, é melhor do que não fazer nada. O problema de tudo é a ansiedade e eu entendo perfeitamente a ansiedade, porque se o único bem que você tem na vida é uma casa, você se aposentou, num país onde o salário de aposentado é de fome, vamos para a realidade... A partir daquele momento cada um que dissesse coisas malucas, os fake news de que iria afundar tudo, o bairro inteiro cair num poço de cloro... Isso não existe, não se pode fazer isso com as pessoas, é falta de respeito. Tribuna Independente - Em janeiro, o Serviço Geológico do Brasil anunciou que o relatório final dos estudos que vêm sendo realizados desde o ano passado devem ser divulgados em junho deste ano. Com todas essas etapas de investigação é possível que ao final ainda não seja detectada a causa do fenômeno? Rochana Campos - O Próprio Thales [especialista do CPRM] falou em reunião no Ministério Público que na pior das hipóteses, se nada for encontrado, eles continuariam os estudos. O problema é que todo mundo quer respostas. Mas geologicamente é uma situação difícil, única no Brasil, que não se pode dar um diagnóstico de imediato. É feito médico, o paciente chega com uma doença desconhecida, ele vai começar com o exame de sangue que é o mais básico até chegar aos exames mais sofisticados. O problema é que ali em cima temos pessoas morando. Estamos lidando com o social. Tribuna Independente - Com o recente aparecimento de rachaduras também em imóveis no bairro de Bebedouro é possível estabelecer uma relação? O fenômeno pode estar em ampliação? Rochana Campos - Pode ser uma ampliação, um prolongamento das falhas que têm lá embaixo. O que aconteceu no primeiro momento, em abril do ano passado foi que o CPRM fez o mapeamento das primeiras casas rachadas e um levantamento até 15 metros, é pouco. Como o CPRM é um órgão público precisa de licitação, desde o ano passado, setembro, eles esperavam pela autorização para contratar os equipamentos. Enquanto isso, a população, o Ministério Público, os vereadores, os deputados, cada um que diga uma coisa. Ainda  não podemos acusar ninguém, nem dar uma resposta definitiva. Até agora não se tem um problema nas encostas, em Bebedouro já apareceu, no Cepa também. Há uma área onde tudo ocorre, por quê? Agora todo mundo está em alerta e isso ajuda. Infelizmente não há nada concreto. Tribuna Independente - No dia 5 de dezembro  de 2018 a Prefeitura de Maceió publicou o Decreto Nº. 8.658 que declarou situação de emergência nos bairros do Pinheiro, Bebedouro e Mutange. Na sua avaliação, há necessidade que esses dois outros bairros precisem passar também por estudos? Rochana Campos - Se está aparecendo acredito que provavelmente eles vão se adentrar naquela área, tanto de encostas. Inclusive também a Braskem está fazendo estudos, porque é de interesse dela. Ela não está sendo questionada? Não sou advogada deles, não tenho nada a ver, não podemos acusar. Desde o início eu continuo dizendo que não podemos acusar ninguém. Quando acusamos alguém temos que ter provas técnicas.  Eles têm estudos até 100 metros que mostram as fissuras, mas ainda é pouco, precisamos de mais informações.