Cidades

Sono está entre as principais causas de acidentes nas estradas

Em Alagoas, não há dados concretos; nas rodovias federais ocorrem quase 4 mil casos de motoristas que dormiram ao volante

Por Lucas França com Tribuna Independente 24/11/2018 08h35
Sono está entre as principais causas de acidentes nas estradas
Reprodução - Foto: Assessoria
Ter uma boa noite de sono traz benefícios ao organismo que nenhuma outra atividade é capaz. A responsável por isso é a melatonina, conhecida como hormônio do sono. Ela regula o sono e repara as células, expostas a estresse, poluição e demais danos, durante as horas de descanso. Porém, quando se deixa de dormir, são muitos os malefícios, sendo essa atitude responsável, inclusive, por acidentes de trânsito. A Perkons - empresa de soluções inteligentes para segurança no trânsito - ouviu especialistas no assunto para saber quais as recomendações e cuidados que os motoristas devem ter para não correr riscos ao volante. E segundo o levantamento da empresa, os dados são alarmantes. Isso porque, no país cerca de 60% dos acidentes rodoviários envolvendo motoristas profissionais portadores das carteiras de habilitação C, D e E estão relacionados ao sono e fadiga. O médico e diretor de comunicação da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Dirceu Rodrigues Alves Júnior, ressalta que dos 60% dos acidentes com relação ao sono ou fadiga, 42% são atribuídos ao sono e 18% à fadiga. “A privação do sono prejudica os sistemas imunológico e hormonal, além de não restabelecer os neurotransmissores, o que traz consequências como falta de concentração, atenção, raciocínio e, consequentemente, diminuição das atividades necessárias para conduzir um veículo. Se considerarmos todos os acidentes ocorridos em rodovias, áreas rurais e urbanas, sono e fadiga são a terceira maior causa de acidentes de trânsito no país, ficando atrás apenas do uso de álcool e drogas ao volante (2º lugar) e do excesso de velocidade (1º lugar)”, revela Dirceu Alves. DESCANSO Sabendo dos perigos que corre a quem está frequentemente acompanhado do volante, o governo federal estabeleceu regras para o exercício da profissão. A Lei 13.103/15, conhecida como ‘’Lei dos Caminhoneiros’’, pode ser aplicada para todos os motoristas profissionais de transporte de cargas e de passageiros. “O motorista de veículo de transporte rodoviário coletivo de passageiros ou de cargas não poderá dirigir por mais de cinco horas e meia ininterruptas, devendo ser observados para o transporte de carga, 30 minutos para descanso dentro de cada seis horas; e, no caso do transporte de passageiros, 30 minutos para descanso a cada quatro horas na direção. Em ambos os casos é admitido o fracionamento do tempo de condução e de descanso, desde que não ultrapasse o limite de cinco horas e meia ininterruptas à direção do veículo”, diz um dos trechos da Lei. Caminhoneiros descumprem lei, mesmo com riscos   Valder Nascimento, 42 anos, é caminhoneiro há cinco anos, viaja por grande parte do país e sabe a importância de dormir bem antes de seguir viagem. ‘’Uma noite de sono bem dormida ajuda o melhor desempenho na profissão. Mas, muitos motoristas autônomos preferem tirar a viagem direto (exemplo, se for uma viagem de 12h) para chegar ao destino mais rápido e descansar de vez quando chegar lá”, comenta. O caminhoneiro disse que quando está na estrada, geralmente à noite, descansa. “Descanso à noite, mas se for uma viagem que o produto só possa viajar a noite (exemplo transporte de frango) é preferível seguir viagem e só descansar no destino final”, completa. Quem trabalha como motorista profissional e conhece bem a lei é Adeildo Alexandre de França, 59 anos e há 10 anos na estrada. ‘’A noite é preciso descansar mesmo até porque está na lei. É imprudência dirigir com sono ou fadiga. Sentiu um ou outro, o correto é parar imediatamente para não por em situação de risco sua própria vida e a vida de terceiros”,  ressalta Adeildo. Apesar de não ter dados ligados ao sono e à fadiga como as causas principais de acidente, o núcleo da Polícia Rodoviária Federal em Alagoas (PRF-AL) explica que nas causas presumíveis de acidentes de trânsito o órgão não trabalha com “sono e fadiga”. A principal causa presumível de acidentes de trânsito em todo o país é falta de atenção, e pode ser que sono e fadiga estejam inseridos nesse item. “Para evitar tais imprudências, a PRF sempre trabalha em suas fiscalizações com uma abordagem educativa. Em operação realizada no mês passado com foco em veículos de carga, em Alagoas, a PRF focou sua fiscalização verificando através do tacógrafo se os motoristas estavam respeitando o tempo de descanso adequado para poder dirigir. Fiscalizar o uso de drogas também se faz necessário, já que é sabido que muitos caminhoneiros se utilizam de anfetaminas, o famoso rebite, para inibir seu sono e dirigir por mais tempo. A PRF tem feito trabalho contínuo no Estado no tocante a esse tema, tanto que, recentemente, tivemos a XVI Operação Temática de Peso e Dimensões [Oteped] com excelentes resultados”, explica a assessoria de Comunicação da PRF em Alagoas. A PRF informou que nas rodovias federais, em 2017, 3.796 acidentes foram causados por condutores que dormiram ao volante. Isto resultou em 3.629 pessoas feridas e 371 mortos em todo o País. Ideal é dormir no mínimo 8 horas, diz especialista   Estudos mostram que a relação entre a quantidade de horas dormidas e o tempo que se está dirigindo influencia diretamente na qualidade da condução. Por exemplo, se o condutor dormir cinco horas e meia, a chance de ele causar um acidente de trânsito é 10 vezes maior do que quem dormiu por oito horas. E quanto menos se dorme, mais se aumenta o risco. Se o repouso for de quatro horas e meia, o risco sobe para 12 vezes; quando o descanso é de apenas três horas e meia, o perigo salta para 20 vezes. Para não fazer parte das estatísticas, a orientação é simples: se o condutor não puder relaxar o suficiente antes de dirigir, não deve pegar a estrada. A neurologista Adriana Santos Saldivar Mendonça, da MedRadius, explica que o sono regula todo o metabolismo, funcionamento do corpo, produzindo o hormônio de crescimento - GH, e reduzindo os níveis de cortisol - hormônio do estresse. “O sono também regula a temperatura corporal, além de consolidar a memória (o que aprendemos durante a vigília se consolida na memória durante o sono). Quanto aos acidentes, a privação de sono diminui a capacidade de tomada de decisão, aquela que precisamos para ter reações rápidas, pois o nível de alerta está diminuído no córtex cerebral. O sono ainda fortalece o sistema imune e contribui para o bem-estar de maneira geral”, explica. O neurologista entrevistado pela Perkons, Gustavo Franklin, orienta que o ideal é dormir a cada 14 horas e ter uma noite de sono entre sete e oito horas seguidas.  “Um indivíduo acordado a mais de 20 horas, ou seja, privado de sono, manifesta efeitos semelhantes à de uma pessoa embriagada. Táticas como tomar café, ligar o rádio e o ar condicionado fazem com que o motorista fique mais atento por breves instantes, disfarçando o sono, mas não o evitando ou o tratando de fato. O pior é que ele não irá perceber o momento em que esses artifícios passam a não fazer mais efeito e o primeiro sinal pode ser, justamente, um acidente”. Já em relação aos remédios que ajudam a manter o indivíduo acordado mesmo ele não tendo o descanso necessário, Saldivar alerta para que sejam evitados. “Devem ser evitados e nunca utilizados sem prescrição médica. Algumas pessoas que têm doenças relacionadas ao sono, como a narcolepsia (incapacidade de se manter acordado - sonolência excessiva), podem ser usados tais medicamentos, mas apenas com indicação médica”, completa. De acordo com a especialista, os remédios podem causar alguns efeitos colaterais como: tontura, boca seca, turvação visual, taquicardia, perda de apetite, sensação de cansaço extremo, formigamentos em extremidades (pés e mãos).  “Lembrando que o uso desses medicamentos (o famoso rebite - derivados de anfetaminas) tem risco cardiovascular elevando a frequência cardíaca, consequentemente a pressão arterial, podendo causar acidentes vasculares cerebrais (AVC) e infarto do miocárdio, se houver outros fatores de risco como obesidade e sedentarismo, que é muito comum em motoristas profissionais”, lembra Adriana. Detran-AL realiza trabalho educativo permanente   Quem também vem realizando um trabalho educativo para alertar os motoristas dos perigos de dirigir sem o descanso necessário é o Departamento Estadual de Trânsito (Detran/AL). “Em todas as palestras ministradas em empresas em geral, principalmente de ônibus, faculdades, escolas, abordamos esse tema”, disse a chefe de Educação para o Trânsito do Detran/AL, Ana Buarque. De acordo com Ana, os pontos abordados em palestras ministradas pela Educação de Trânsito do Detran-AL, no tocante a “sono e fadiga’’ e suas consequências  para os motoristas profissionais ao volante são as causas que estão relacionadas ao uso de álcool, drogas, transtorno depressivos, ansiolíticos e outros. Já a consequência  para o motorista que utiliza alguns desses artifícios é a  redução da visão de longa distância, perda da capacidade sensorial, lentidão motora, perda de equilíbrio e direção e a redução da capacidade de perceber os riscos. Já a Superintendência Municipal de Transporte e Trânsito de Maceió (SMTT), não realiza nenhum trabalho específico com base nos itens sono e fadiga, porém alerta para que os motoristas só dirijam com estiver bem dispostos e descansados.