Economia

Casa de ferreiro, espeto de pau

INSS em Alagoas à beira do colapso por causa de aposentadoria de servidores

Por Wellington Santos com Tribuna Independente 30/03/2018 08h29
Casa de ferreiro, espeto de pau
Reprodução - Foto: Assessoria

A crise no atendimento aos segurados nas agências do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em Alagoas atingiu sua fase mais aguda esta semana devido à falta de servidores para atendimentos aos segurados nos postos. O agravamento da situação esta semana teve pelo menos dois casos de agressão a servidores por causa de demora no atendimento, além de outro por superlotação em postos de Maceió por número insuficiente de funcionários.

E como diz um ditado popular recorrente, “não há nada tão ruim que não possa piorar”. Sim, porque o sistema de atendimento pode entrar em colapso total em pouco tempo em Alagoas, ironicamente, no tocante a uma das funções sociais da atividade-fim do Instituto: boa parte - quase a metade dos funcionários do INSS no Estado -, está na iminência de se aposentar e estrangular definitivamente o sistema de concessão de benefícios tais como - além das aposentadorias - o seguro-desemprego, auxílios-doença, reclusão, acidente, pensão, salário-maternidade, entre outros.

Essa possibilidade real de colapso ficou ainda mais evidente na reunião ocorrida nessa quinta-feira (29) entre representantes do Sindicato dos Trabalhadores em Seguridade Social (Sindprev) e a chefe de Gestão de Pessoas do INSS, Edleide Sales, na qual foi revelado que dos atuais 629 servidores do Instituto, pelo menos 297 deixarão o INSS até janeiro de 2019, ou seja, quase metade do quadro funcional.

“Desse total, ainda temos outro problema. Cinco por cento desse número encontra-se de licença médica, o que corresponde a menos 16 servidores. Seria o caos total”, disse à Tribuna Independente Célio dos Santos, logo após a reunião com a chefe de Gestão de Pessoas do Instituto. “Só de reposição com estes novos dados precisamos de 297 e para dar condições mínimas de atendimento e evitar os problemas atuais como a demora no atendimentos seriam precisos algo em torno de 900 servidores”, estima o presidente do Sindprev.

O quadro atual de 629 servidores do INSS em Alagoas, entre peritos, médicos e servidores, têm que dar conta de 41 agências para atender a quase 2 milhões de segurados no Estado.

Número de agências quintuplicou

Mas o colapso iminente no sistema de atendimento previdenciário não é “privilégio” só de Alagoas. Em meio à crise no atendimento aos segurados nas agências do INSS devido a falta de servidores, recentemente mais de 300 servidores do órgão em todo o país tiveram a aposentadoria liberada e publicada no Diário Oficial da União. No Rio, que sofre com o caos no atendimento, mais de 50 segurados deixaram a ativa, o que complica ainda mais a situação dos postos.

Em reportagem publicada no jornal EXTRA, do Rio de Janeiro, o presidente do INSS, Francisco Lopes, disse que existe a possibilidade de que a falta de servidores “vire uma bola de neve e leve à perda de controle na linha de frente da Previdência Social, que é a concessão de aposentadorias, pensões e auxílios”. Segundo informou Lopes, não existe, hoje, indicativo do Ministério do Planejamento de que haverá um novo concurso para o INSS em 2018. Para que o concurso aconteça, é necessário fazer as contas, botar tudo na ponta do lápis, para ver se será possível uma seleção de servidores ainda este ano.

A estimativa inicial é de que seria preciso um concurso para 16 mil vagas e distribuí-las para todo país.

[caption id="attachment_81378" align="aligncenter" width="450"] Marcelo Lima diz que MPF errou alvo: ‘Problema é de Brasília’ (Foto: Edilson Omena)[/caption]

Em entrevista à Tribuna Independente, o coordenador do Programa de Educação Previdenciária, Marcelo Lima, ratifica os números do Sindprev e do próprio INSS e disse que o quadro é preocupante. “Estávamos trabalhando com um percentual de pouco mais de 30% servidores em vias de se aposentar, mas agora a coisa é ainda mais séria porque tínhamos a ideia de que perderíamos até janeiro de 2019 pouco mais de 200 trabalhadores, mas com esses novos dados o número dos que vão se aposentar chega a quase 50% ou mais de 300 servidores”, afirmou.

Lima informa que, em dez anos, o número de agências do INSS em Alagoas quintuplicou e que só por este fato novos servidores concursados/contratados deveriam acompanhar o quantitativo de agências. “Há dez anos existiam em Alagoas apenas oito agências. Em abril estaremos inaugurando a 42ª agência no Estado para atender a quase 2 milhões de segurados”, informa.

Iminência do caos; previdência nas barras dos tribunais

Lima admite que se os quase 50% de servidores não forem repostos para atender a demanda a tendência é o colapso no sistema. “Temos até o dia 5 de agosto de 2018 para chamarmos o pessoal classificado do concurso de 2016, é o prazo máximo, porque depois dessa data ele perde a validade”, revela. O gestor explica que nesse concurso 14 vagas foram destinadas para Alagoas. “Chamamos todos, mas ficaram classificadas mais 48 pessoas. Esperamos que pelo menos mais dez concursados sejam chamados até o dia 5 de agosto, porque a coisa é seríssima, é o mínimo do mínimo”. Mas, ao mesmo tempo, o coordenador do Programa de Educação Previdenciária faz um alerta: “Mas tudo isso depende do Ministério do Planejamento, responsável pelos estudos de novos concursos. Precisamos urgente de mais um novo concurso este ano, mas tudo depende do Ministério”, completa.

AGRESSÕES A SERVIDORES

Para se ter ideia da gravidade do que pode levar o completo colapso do sistema de atendimento do INSS em Alagoas, três casos chamaram atenção essa semana. O primeiro foi o flagrante da falta de servidores para atender o acúmulo de pessoas na agência Monte Máquinas, no Tabuleiro do Martins. O que pode ser constatado nas fotos as quais a Tribuna teve acesso, com guichês de atendimentos vazios e um número muito grande de segurados à espera de atendimento.

O outro foi ainda mais grave, conforme relatou Marcelo Lima. “Uma servidora nossa foi covardemente agredida com um tapa no rosto por um senhor na agência Ary Pitombo, localizada no centro de Maceió”, denunciou Lima. Segundo ele, o agressor reclamou da demora no seu atendimento. “A servidora tem mais de 60 anos de idade e mais de 40 anos de serviços prestados ao INSS. O agressor foi preso em flagrante pela PM e entregue à Polícia Federal. O pior é que ele estava com um advogado, que ainda tentou justificar a agressão, ao invés de ele mesmo repreender a atitude injustificável de seu cliente”, afirma Lima, ao acrescentar que o agressor foi solto, pagou fiança, mas foi enquadrado no Estatuto do Idoso.

Outro caso foi denunciado nessa quinta-feira pelo presidente do Sindprev, Célio dos Santos. “Um segurado jogou uma pasta de documentos em uma médica perita no posto de atendimento Monte Máquinas, no bairro do Tabuleiro, em Maceió, mas ela preferiu não fazer uma denúncia formal”, disse o sindicalista.

IMBRÓGLIO JURÍDICO

Fora os imbróglios na questão dos atendimentos e da perda de funcionários, o INSS no Estado ainda espera o desfecho do imbróglio com o Ministério Público Federal em Alagoas (MPF/AL) que obteve, ano passado, decisão favorável em Ação Civil Pública (ACP) para a redução do tempo de espera em perícias médicas realizadas pelo órgão. Pela decisão liminar, os agendamentos das perícias deverão ser realizados em até 45 dias a contar da data do requerimento do benefício ou a partir da data do agendamento para aferição da incapacidade.

[caption id="attachment_81379" align="aligncenter" width="450"] Kaspary diz que órgão deveria cumprir obrigação, ao invés de protelar (Foto: Sandro Lima / Arquivo)[/caption]

A ação, de autoria dos procuradores da República Niedja Kaspary e Marcelo Jatobá Lôbo, constatou ainda indícios de fraude no registro de ponto; recusa em realizar perícias médicas não agendadas, mesmo com tempo disponível; faltas aos expedientes, com abono manual pelas chefias; descumprimento e/ou redução da carga horária; e número insignificante de perícias realizadas foram algumas das irregularidades verificadas no inquérito. Como agravante da situação, algumas testemunhas denunciaram mal atendimento por parte de alguns médicos.

A decisão foi proferida pelo juiz federal Raimundo Campos, da 13ª Vara Federal em Alagoas.

Mas o INSS apelou e obteve liminar favorável e a sentença só produzirá efeitos após sua apreciação pela 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região Tribunal, no Recife.

Sobre a ação movida pelo MPF, Marcelo Lima nega que haja falta de gestão no órgão. “Numa decisão mais recente, um juiz nos deu uma liminar entendendo que não é uma questão de gestão aqui em Alagoas, mas de governança, ou seja, eles deveriam cobrar isso de Brasília e não de Alagoas”, justificou.

“Eles derrubaram a liminar lá no TRF-4, mas o juiz aqui julgou o mérito e decidiu procedente a ação do MPF. Mas temos que aguardar a decisão lá do Recife”, respondeu à Tribuna Niedja Kaspary.

“O trabalho que nós fizemos foi feito entre 4 e 5 anos no INSS e não era por número reduzido de funcionários ou servidores, mas por falta de gerenciamento. Eu só acredito que esse problema nessa agência específica é de número reduzido se o INSS nos mandar a relação de servidores”, desafiou Kaspary, ao ser informada sobre os problemas ocorridos essa semana na agência do Tabuleiro do Martins.

“O INSS, ao invés de cumprir a ação e seu desiderato institucional, fica recorrendo e protelando”, disse Kaspary, ao informar que o processo já tem relator. “Mas esta ação independe de nossa vontade agora, depende dos procuradores regionais”, finalizou.