Política

Juiz Marcelo Tadeu: “Lava Jato trouxe prejuízos ao país”

Magistrado também diz que Judiciário é elitista e está com medo de prender Lula; ele disputar a eleição neste ano

Por Carlos Amaral com Tribuna Independente 24/02/2018 08h36
Juiz Marcelo Tadeu: “Lava Jato trouxe prejuízos ao país”
Reprodução - Foto: Assessoria
Crítico da Lava Jato, o juiz Marcelo Tadeu, da 12ª Vara Criminal da Capital, acredita que a operação trouxe prejuízos ao país, sejam econômicos ou morais, porque tem como alvo apenas um lado do sistema político brasileiro. À Tribuna Independente, o magistrado também se posicionou sobre o Judiciário e alertou para uma “elitização” deste poder cujos reflexos, segundo ele, surgem agora. Para Marcelo Tadeu, a Justiça tem lado e é o da classe dominante. Tribuna Independente – O senhor tem sido, há muito tempo, um crítico da Lava Jato – inclusive foi ao Paraná participar de um “tribunal popular” –, continua com a mesma opinião sobre a operação? Marcelo Tadeu – Sim. Na medida em que a operação avança, mais ficam claros os equívocos que foram praticados na Lava Jato. Com prejuízos, até certo ponto, de difícil reversão para o país. Tribuna Independente – Que prejuízos? Marcelo Tadeu – Financeiros, econômicos e até morais também. Por quê? Porque a suposta bandeira da moralidade que estaria dentro da Lava Jato, como se todos ali fossem pessoas de altíssima probidade, está colocada em xeque. De que maneira a gente atesta isso? Primeiro que a forma que ela tem atuado, direcionado a apenas um setor do sistema político. Não foi o sistema todo trazido para ser enfrentado dentro da Lava Jato, com práticas incorretas dentro do ponto de vista ético. Mas não foi isso que ficou claro na condução da Lava Jato. Esse é o primeiro ponto. A falta de simetria de atuação, a falta de distribuição, de comportamento idêntico para qualquer lado das agremiações partidárias dentro da estrutura do sistema político. Ficou extremamente prejudicada a confiabilidade daqueles que compõem a Lava Jato, tanto no âmbito policial quanto judicial. Isso também se revela mais claro com algumas situações como a do Tacla Duran [ex-advogado da Odebrecht e da UTC], situações que realmente colocam em xeque a atuação ou a própria honestidade no enfrentamento da questão da corrupção. Tribuna Independente – Essa postura da Lava Jato que senhor fala atinge também o comportamento do Judiciário daqui para frente, tende a ficar mais partidarizado, no sentido de optar por um lado? Marcelo Tadeu – Olha, na verdade é o seguinte: o que está acontecendo hoje, a partir da Lava Jato e o comportamento do Judiciário brasileiro, não é nada de novo. Apenas se revelou, talvez por um momento de quase ruptura. Ou vai ou fica. É agora ou nunca. Ou se mata um projeto de poder ou não se retorna ao outro projeto. No final, a Lava Jato ficou como algo veio para interromper um caminho que o Brasil estava se propondo a traçar e tenta-se agora outro caminho. Isso está muito claro com o golpe dado no Brasil no governo da Dilma Rousseff [PT]. A ascensão do governo do Michel Temer [MDB] veio com um neoliberalismo fortíssimo, destruindo direitos sociais e fundamentais. Tribuna Independente – A condenação do ex-presidente Lula (PT) é alvo de muitas críticas desde a sentença do juiz Sérgio Moro e agora, mais recente, a do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4)? Qual a sua avaliação desses julgamentos? Marcelo Tadeu – O TRF4 não pôde fazer muita coisa se não manter aquela estrutura construída pelo juiz Sérgio moro na sentença de primeiro grau. Ou seja, falta substância probatória, que é o principal. Se falta substância probatória, não é possível condenar ninguém. Nem Lula, nem ninguém. Na verdade, o que aconteceu naquele julgamento já era previsível. Nós já sabíamos qual seria o resultado. A partir daí você nem pode dar muita credibilidade ao Judiciário. Tribuna Independente – O senhor acredita que o Lula será preso antes da eleição, ou depois até? Marcelo Tadeu – Eu acho que a prisão do Lula é muito analisada. Vontade eu acho que não falta na estrutura atual de poder. Vontade não falta. Mas eles têm medo. Tribuna Independente – Medo de uma revolta popular? Marcelo Tadeu – Sim, eles têm medo. Lula tem uma simbologia muito grande. O Lula simboliza, ainda que não se queira, a classe pobre. A origem dele, a região de onde veio, tudo isso continua vivo na classe média alta. É uma luta de classes o que está ocorrendo no Brasil. O Lula, apesar de ter feito um governo que garantiu muito ao sistema financeiro, o remunerou muito, mas todo mundo ganhou dinheiro com o Lula. É impressionante como eles queriam ganhar dinheiro sozinhos. Todo mundo ganhou, inclusive a pobreza, mas eles não querem a pobreza ganhando. Tribuna Independente – Recentemente foi ventilado na imprensa que o senhor será candidato a deputado federal neste ano. É isso mesmo, será candidato? Marcelo Tadeu – Pretendo sim. Estou apenas no aguardo de o Tribunal declare a minha aposentadoria. Tão longo isso se concretize vou visitar as agremiações partidárias para ver se me aceitam e eu possa disputar um mandato. Tribuna Independente – O senhor ainda não iniciou as conversas com os partidos? Marcelo Tadeu – Já estou iniciando. Tribuna Independente – Partidos do campo da esquerda, de centro? Marcelo Tadeu – Não tenho a menor condição de trabalhar a direita porque ela tem uma visão neoliberal extremamente perniciosa, a meu ver. Estou naquela linha que busca o equilíbrio de classe. Tribuna Independente – O cargo é o de deputado federal mesmo ou está aberto a outras possibilidades? Marcelo Tadeu – Estou aberto a tudo, se for parlamento. Deputado federal, estadual, Senado. Tribuna Independente – Como o senhor avalia a representação política alagoana hoje, a bancada no Congresso, na Assembleia? Marcelo Tadeu – Precisa renovar muito. Aqueles que querem realmente disputar poder precisam ter consciência que a política é a arte de servir ao povo. Sem demagogia. O problema é que a política brasileira se transformou em algo do avesso. Usam a estrutura para serem servidos pelo povo. E aí, complica. Fica difícil. Acho que essa mudança de paradigma precisa acontecer, e ela acontece a partir do momento que você coloca o povo em primeiro lugar. Eu posso dizer isso porque em minha vida, na minha magistratura, realmente sempre usei a Justiça com o seu objetivo que é o povo.