Política

Racismo não gerou pena em regime fechado

OAB/AL registra aumento de 80% nas denúncias do crime de racismo, porém não há pessoas presas em Alagoas e nos demais estados do país

Por Thayanne Magalhães - repórter / Tribuna Independente 09/11/2023 07h51 - Atualizado em 09/11/2023 07h56
Racismo não gerou pena em regime fechado
Juiz Ygor Figueiredo acredita que a Justiça tem evoluído e as sanções aplicadas combatem o crime no país - Foto: Assessoria

Uma pesquisa recente revelou que nenhum réu acusado de cometer um crime racial foi condenado a cumprir pena em regime fechado no Brasil, no período entre julho de 2010 e outubro de 2022. Muitos desses crimes ocorreram online. Esses resultados são provenientes de um estudo conduzido em colaboração pela Faculdade Baiana de Direito, JusBrasil e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

O estudo pioneiro mapeou e analisou casos julgados pelos tribunais brasileiros envolvendo os tipos penais de Injúria Racial e/ou Racismo praticado contra vítimas negras em redes sociais. Toda a pesquisa reuniu uma complexa análise de 107 acórdãos disponíveis no banco de dados do JusBrasil.

A Lei de Racismo existe há mais de 30 anos e ser condenado pelo crime ainda é raridade no país.

Na opinião do juiz Ygor Figueiredo, da 14ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de Alagoas, ainda temos uma longa caminhada para uma sociedade livre de preconceitos.

“A prevenção geral que se consegue com a imposição de penas a quem transgrida a lei, também é um passo importante nesse sentido, mas estamos evoluindo e as sanções aplicadas, mesmo que não sejam em regime fechado, fazem com que aquele que comete o ilícito deixe de ser primário, sofra restrições parciais em sua liberdade e tenha que pagar multas ou prestações pecuniárias”, disse o magistrado em entrevista à Tribuna Independente.

O juiz explica que o crime de Racismo está previsto no art. 20 da Lei n.º 7716/89 e prevê pena de 1 a 3 anos de reclusão.

Segundo o magistrado, o Artigo 2º diz que, se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido por intermédio dos meios de comunicação social, de publicação em redes sociais, da rede mundial de computadores ou de publicação de qualquer natureza; se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido no contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público (Incluído pela Lei nº 14.532, de 2023); pena: reclusão, de 2 a 5 anos, e proibição de frequência, por 3 anos, a locais destinados a práticas esportivas, artísticas ou culturais destinadas ao público, conforme o caso.

“De acordo com o Artigo 33 do Código Penal, em regra, as penas são cumpridas em regime fechado quando são superiores a 8 anos ou quando o réu é reincidente. Entre e 4 e oito anos a pena é cumprida em regime semiaberto, mas aqui em Alagoas não existe unidade para cumprimento em regime semiaberto. Penas menores de 4 anos são cumpridas em regime aberto ou substituída por restritiva de direito”, explicou.

Ygor Figueiredo explicou ainda que a lei 14.532/2023 aumentou a pena do que se costumou chamar de injúria qualificada, que também tem cunho preconceituoso. Segundo o magistrado, a pena antes era de 1 a 3 anos e passou a ser de 2 a 5 anos, além de passar a existir um tipo penal própria na lei de Racismo. “Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional pode levar a pena de reclusão de dois a cinco anos e multa”.

“Trata-se de comportamentos que eram frequentemente naturalizados e, com a evolução da sociedade, está sendo reprimido com cada vez mais rigor, o que é fundamental para uma sociedade mais igualitária. Se por um lado a legislação ainda dificulta, em regra, condenações no regime fechado, por outro ela vem acompanhando, ainda que de forma lenta, a evolução social e trazendo mais mecanismos para garantir o respeito a todos os indivíduos sem qualquer distinção de raça, crença, gênero ou orientação sexual, o que pode ser visto com o aumento das penas como a lei 14532/23”, concluiu.

Casos atendidos pela OAB são recentes e não há condenações

Em Alagoas, a Comissão de Promoção da Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/AL) divulgou, na última terça-feira (7), os números referentes às denúncias de racismo, injúria racial e racismo religioso registrados neste ano de 2023. Foram 25 casos contabilizados, o que representa um aumento de quase 80% em relação ao ano de 2022, quando foram registradas 14 ocorrências no ano inteiro.

Em entrevista à Tribuna Independente, o advogado Wilton Melo, membro da comissão, disse que, apesar do aumento de denúncias de racismo, intolerância religiosa e injúria racial, a Ordem não tem conhecimento de condenações referente a esses casos.

“Contudo, os casos atendidos pela comissão são relativamente recentes, nós entendemos que os prazos são necessários para que o processo seja devidamente instruído, que as partes tenham direito à ampla defesa e ao contraditório, nem sempre é o prazo que a sociedade espera que seja. Mas que permanecemos atentos, e com o advento da Vara especializada em crimes contra vulneráveis, acreditamos que teremos cada vez mais notícias de condenações por crimes raciais no estado”, opina o advogado.

“Nosso papel, enquanto comissão de Promoção de Igualdade Racial, é proporcionar segurança jurídica às vítimas e principalmente conscientização da sociedade. Estamos vigilantes para que esses casos não fiquem impunes. Temos uma boa comunicação com a Delegacia Especial dos Crimes contra Vulneráveis, através da Yalorixá Tia Marcelina, responsável para esse tipo de crime, bem como, seguimos dialogando com o judiciário para reafirma o compromisso contra o racismo”, concluiu.

De acordo com os dados enviados à reportagem da Tribuna Independente, a comunicação do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL), confirmou que não há nenhum caso de crime de Racismo tramitando registrado no sistema do Tribunal. Existem casos tramitando como injúria que podem envolver racismo. São 231 processos de injúria tramitando, 6 especificamente como injúria relacionada a “preconceito”. Porém, os demais, desse total, também podem envolver preconceito e racismo, e está cadastrado no sistema apenas como injúria, de forma genérica.