Política

Trocas no governo têm demandas do “Centrão”

Recentes trocas no Ministério da Defesa e nas Forças Armadas geraram muito barulho

Por Texto: Carlos Amaral com Tribuna Independente 02/04/2021 12h40
Trocas no governo têm demandas do “Centrão”
Reprodução - Foto: Assessoria
As recentes trocas de comando no Ministério da Defesa e nas Forças Armadas geraram, na última semana, muito barulho, seja pela surpresa das renúncias/saídas dos órgãos, seja pelo tom de cartas divulgadas, como a do general Fernando Azevedo e Silva à qual ele afirmou ter atuado para preservar as Forças Armadas como “instituições de Estado”. Isso fez ligar o alerta em muitos setores da política brasileira. Contudo, para o cientista político Ranulfo Paranhos, as trocas já deveriam estar no horizonte do governo de Jair Bolsonaro (sem partido). O problema foi sua falta de publicidade. “Isso já estava no radar do Bolsonaro para algum momento, mas não da forma como ele fez. O Bolsonaro primeiro faz uma reforma política na surdina e, talvez, ele, os generais e o Arthur Lira soubessem. Essa tentativa de fazer reforma na surdina é primeiro por conta dessa intriga dele com a imprensa”, analisa. “Aí aparece o general Azevedo emitindo nota, depois aparece o José Levi e fica todo mundo querendo saber o que tá acontecendo com o Governo. É uma reforma, e não custava ter avisado, faremos uma reforma ministerial, novos nomes serão indicados e outros nomes sairão. Ponto. Mas essa insistência dele em pautar o governo como sendo inimigo da imprensa, como o próprio Estado sendo inimigo da imprensa, é o primeiro erro”, completa o cientista político. Ranulfo Paranhos ainda ressalta a “baixa na poeira” dos dias seguintes, mas aponta para a possibilidade de arestas do governo com o Exército brasileiro. “Essa poeira começa a sentar. A renúncia ou a entrega dos cargos dos outros três generais, do Edson Pujol e dos outros dois, isso me parece ser preciso esperar mais um pouco que esse tiro saiu muito pela culatra porque feriu a hierarquia. O Braga Neto feriu a hierarquia. Se ele pensava em ter apoio do exército, parece que o efeito vai ser o contrário”, diz. CENTRÃO Na avaliação de Ranulfo Paranhos, a nomeação de Flávia Arruda para a Secretaria de Governo da Presidência da República é uma vitória do Centrão, mas menor do que possa parecer. “O Centrão não é um partido político para você negociar no atacado. Ele é um conjunto de parlamentares com interesses particulares e, às vezes, interesses contrários. O interesse de um pode ferir o do outro, mas, no geral, são interesses fisiológicos e particulares e sempre negociados no varejo. Ou seja, ela vai ter como demanda interesses de varejo e não no atacado. Interesse de parlamentares individuais e não do conjunto é muito difícil de manusear, de negociar. Me parece que isso é outra coisa que não pode dar certo. O Centrão tem essa dificuldade grande. É tanto que a gente tem até dificuldade de chamar coalizão com o Centrão. É uma coisa que não faz sentido você montar uma coalizão com o Centrão”, comenta o cientista político. Outro fator que dificulta a relação com o Centrão, segundo Ranulfo Paranhos, é a pouca margem para liberação de recursos, devido ao fraco desempenho da economia, ainda mais diante do cenário de pandemia. “Bolsonaro tem vivido apenas de turbulências” A Tribuna procurou parlamentares da bancada alagoana para saber como eles avaliam o atual cenário. Apenas Paulão (PT) retornou à reportagem. Para ele, o momento do governo Bolsonaro é de turbulência, mas não há correlação de forças para um autogolpe. “A conjuntura tá ficando muito adversa, já que ele foi um dos responsáveis devido à falta de gestão em relação a pandemia, diferente de outros líderes, num plano internacional”, comenta ao destacar o negacionismo do governo diante da Covid-19. “Nega ciência, não respeita protocolos que a ciência preconiza como uso de máscara e distanciamento, e ainda estimula o tratamento precoce, que não tem recomendação científica. Ele ainda tenta criar um conflito, jogando uma parcela da população contra os que estão fazendo o dever de casa. Ou seja, quem obedece à ciência. Para completar, o general responsável pelo departamento de saúde do Exército colocou no boletim na Ordem do Dia o que o Exército estava fazendo para proteger a sua tropa, utilizando todos mecanismos que o Ministério da Saúde preconiza”, completa. Na avaliação do parlamentar, o fato de o Exército realizar as medidas protetivas recomendadas pela comunidade científica teria sido o fato derradeiro que gerou a troca no Ministério da Defesa e nos comandos das Forças Armadas. Ainda segundo a avaliação do parlamentar, Jair Bolsonaro está perdendo sua base social de apoio e tende a ceder mais espaços ao Centrão. “Ele faz um processo de acordo para o Congresso Nacional, junto com o Centrão, no sentido de garantir a pauta econômica. Para isso, ele teve que ceder todos cargos necessários e vai ceder muito mais, entrando em contradição com discurso de campanha, de não fazer ‘toma lá, dá cá’, mas está com a porteira aberta, porteira aberta passando a boiada”.