Política

Lei amplia os espaços para mulher

Juiz Paulo Zacarias, do 4 º Juizado da Violência Doméstica, reforça a contribuição da Maria da Penha em Alagoas

Por Tribuna Independente 11/03/2017 13h00
Lei amplia os espaços para mulher
Reprodução - Foto: Assessoria

Passadas as comemorações alusivas ao Dia Internacional da Mulher, um assunto que sempre vem à tona é a violência contra elas. Para falar sobre o assunto, a reportagem da Tribuna Independente entrevistou o juiz Paulo Zacarias, titular do 4º Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Maceió. O magistrado falou sobre os avanços da Lei Maria da Penha e disse ser contra a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que segundo ele equivocadamente transformou uma simples lesão em ação pública incondicionada.

Tribuna Independente - Mesmo com campanhas educativas e punições para agressores, a violência contra mulher ainda é uma realidade em Alagoas e no país. Estamos no caminho certo no combate à violência?

Paulo Zacarias - Estamos, porque o principal foi feito que foi a inauguração da Lei Maria da Penha em 2006, a lei 11340 no mundo jurídico brasileiro, que veio atender aos anseios das mulheres vitimadas do Brasil. Agora temos um instrumento legal que combate sistematicamente à violência doméstica. Portanto, nós temos assim um marco legislativo importante porque a lei transformou o que era invisível no visível. Transformou o que era crime de bagatela, crime de menor potencial ofensivo em um crime mais grave, um crime qualificado. Por exemplo, uma lesão leve praticada por qualquer cidadão comum tinha a pena máxima de 2 anos. E agora a pena sob uma lesão leve praticada num ambiente domestico e familiar é de três anos. Justamente para não ser considerado crime de menor potencial ofensivo. Então foi uma mudança muito importante.

Tribuna Independente - A Lei Maria da Penha conseguiu reduzir os nú- meros de violência contra a mulher em Alagoas. Tem esses dados?

Paulo Zacarias - Esses dados eu não tenho. O que eu posso dizer é que essa lei (Maria da Penha) deixou as mulheres mais empoderadas, protegidas e conscientes. Então, antes elas não buscavam tanto a proteção legal e agora estão buscando. Digo que pra o número de denúncias ter aumentado foi devido as mulheres terem mais consciência, não é que tenha diminuído a violência, espero que tenha diminuído, não tenho dados sobre isso. Agora que os homens passaram a ser punidos, isso sim, que eles estão mais medrosos com as consequências das agressões e dos crimes, isso eu tenho certeza, porque muitos já foram presos, outros estão respondendo a processos, o que antes não existia. Porque antes dessa lei existia a chamada transação penal nos crimes de menor potencial ofensivo, na transação penal e na composição civil não há processo. Aí os homens não eram condenados, mas agora tem processos deu mais força as mulheres.

Tribuna Independente - A Lei Maria da Penha garante a aplicação de medidas protetivas, que consistem, por exemplo, em afastar o agressor do lar e determinar uma distância mínima de aproximação da vítima. Mas vemos em muitos casos que mesmo com a proteção da lei muitas mulheres são agredidas e até assassinadas. A lei não protege totalmente?

Paulo Zacarias - A lei não é penal. Ela é considerada heterotópica. Ela ataca várias frentes em defesa das mulheres. O que ela tem de menos nessa lei é matéria penal e ela nem sequer define o que é crime contra a mulher. A lei apenas aumentou a pena da lesão leve para três anos quando antes era dois e proibiu a aplicação da lei 9099 (infração de menor potencial ofensivo). Ela é uma lei multidisciplinar, que além de buscar conscientizar as mulheres também manda articular os poderes constituídos no estado. O que faz todos os órgãos trabalhar em prol das mulheres. Essa lei visa dar oportunidade para as mulheres no mercado de trabalho, para que ela não tenha uma dependência econômica e que essa dependência faça com que ela fique forçadamente com o agressor.

Tribuna Independente - Geralmente, a mulher que mais sofre violência doméstica é a que reside na periferia?

Paulo Zacarias - Não. Em nossos dados pela quantidade de processo as pessoas que vivem nas classes chamadas C, D e E, possuem muitas queixas, mas também temos muitos processos das classes A e B. Tanto que eu acabei (quinta-feira, 9, antes da entrevista) de fazer uma audiência com uma mulher da classe alta. Tem aqui médicos, professores universitários, corretores, policiais, têm todas as classes respondendo processos. É um crime “democrático” porque o homem violento não está na classe baixa, está em todas as classes. Um fato é que as mulheres mais carentes têm até vergonha de se dirigir a uma delegacia e prestar queixa contra o seu companheiro.

Tribuna Independente - Mesmo com uma lei que é colocada em prática, o receio em denunciar seus companheiros ainda persiste?

 Paulo Zacarias - Persiste. Muitas mulheres querem salvar seus casamentos, não querem deixar seus maridos e não querem ser deixadas por eles. Elas querem que eles sejam transformados, que deixem de ser violentos, irresponsáveis e em muitos casos usuários de drogas. As mulheres buscam a felicidade, querem viver em paz e em harmonia com seus parceiros. E essa transformação é cultural, passa por vários fatores. Não é uma lei dessas que vai mudar de uma hora para outra a conduta de ninguém. A lei é boa, mas os transgressores não são bons.

Tribuna Independente - Hoje são cerca de 15 mil ações no Estado envolvendo violência contra a mulher, sendo quase 8.900 penais. A cada mês, aproximadamente 100 casos chegam somente à unidade, que funciona no Centro da Capital. Esses números preocupam?

Paulo Zacarias - Preocupam porque nós não queríamos que nenhuma mulher sofresse violência em Alagoas. O ideal seria que não houvesse esses números. Mas, eles são altos porque só em Maceió nós temos 72% dos crimes de todo o Estado. A gente espera que com essa conscientização e a valorização da mulher, que a lei se torne desnecessária. 

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