Cidades

Fiscalização é suspensa no final de semana por falta de técnicos

Casos de intoxicação por metanol continuam aumentando; até sexta-feira, 113 tinham sido notificados em todo Brasil

Por Valdete Calheiros – colaboradora / Tribuna Independente 04/10/2025 08h10 - Atualizado em 04/10/2025 08h48
Fiscalização é suspensa no final de semana por falta de técnicos
Festa realizada sexta-feira suspendeu venda de bebidas destiladas - Foto: Divulgação

Apesar dos casos de intoxicação por metanol estarem aumentando no Brasil, em Alagoas não haverá fiscalização por falta de técnicos, na Vigilância Sanitária de Maceió (Visa), que é o órgão responsável por fiscalizar nos estabelecimentos comerciais se há venda de bebidas adulteradas. Os trabalhos serão retomados nesta segunda-feira (6).

A Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) explicou que as ações de fiscalização nos estabelecimentos são de responsabilidade das Vigilância Sanitárias Municipais. Em Maceió, a Vigilância Sanitária explicou que, por enquanto, não dispõem de equipes de fiscalização que façam plantões aos finais de semana. “As fiscalizações ocorreram durante a semana e serão retomadas a partir da próxima segunda-feira, dia 06”, adiantou.

Na quinta-feira (2), além da Vigilância Sanitária de Maceió, o Procon do município iniciou operação contra bebidas adulteradas na capital. A ação conjunta tem caráter educativo para orientar estabelecimentos sobre procedimentos seguros de comercialização.

Os comerciantes receberam orientações sobre o cumprimento das normas de segurança, armazenamento e comercialização previstas no Código de Defesa do Consumidor.

Os responsáveis pelos estabelecimentos estão sendo instruídos a adquirir produtos apenas de fornecedores registrados, exigir e arquivar nota fiscal eletrônica, verificar informações de rotulagem e manter controle de acesso aos estoques.

De acordo com a Vigilância Sanitária, ao comprar bebida o consumidor deve verificar o rótulo: toda bebida deve trazer CNPJ da empresa, informações claras sobre o fabricante e o registro junto ao Mapa – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, órgão responsável por autorizar e fiscalizar a produção de bebidas no Brasil.

E, ainda, procurar o selo de inspeção, que contém a presença do selo fiscal, um indicativo importante de regularidade, exigir nota fiscal, uma forma de coibir o comércio clandestino e evitar compras pela internet ou em locais sem credibilidade, uma vez que, a oferta de preços muito baixos pode esconder riscos graves à saúde.

Até sexta-feira, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), em Alagoas, afirmou que o número de clientes nos estabelecimentos não havia sofrido alterações durante a semana. A entidade adiantou, no entanto, que uma melhor avaliação poderá ser feita apenas nesta segunda-feira (6), quando tiver passado o final de semana.

O presidente da entidade, Marcus Tullio Albuquerque Alves Batalha, gravou um vídeo onde afirmou que o tema é sensível e que a Associação tem intensificado a orientação a empresários do setor.

“São orientações que também servem ao consumidor final: como ficar atento se o rótulo da bebida está violado, como está a garrafa, se o preço está abaixo do valor de mercado. São dicas para que o consumidor compre com mais confiança e os empresários possam vender com segurança”, destacou.

A recomendação é que os consumidores fiquem atentos à procedência das bebidas e evitem produtos de origem duvidosa.

Festa suspende venda

Os organizadores da festa de samba Sexta Terapêutica, que aconteceria ontem, no bairro Jaraguá, em Maceió, anunciaram a suspensão da venda de bebidas destiladas – como gim, vodca e uísque – por medida de segurança. A decisão foi tomada após registros de intoxicação por consumo de bebidas alcoólicas adulteradas em outros estados do país.

Apesar de Alagoas não ter registrado casos até o momento, os responsáveis pelo evento afirmaram, em nota, que a medida é preventiva e visa garantir a segurança dos participantes. Eles também informaram que outras opções de bebidas estarão disponíveis durante a festa.

Treinamento

A Abrasel, a Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD) e a Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe) estão realizando uma série de treinamentos online, gratuitos e com certificado, com orientações práticas para empreendedores serem hábeis a identificar bebidas falsificadas de produtos autênticos.

A primeira edição da capacitação contou com a participação de mais de duas mil pessoas. Durante o treinamento, os participantes receberam orientações detalhadas sobre como identificar sinais de falsificação em garrafas, tampas, rótulos e líquidos.

A tampa é considerada o principal ponto de segurança dos produtos. Tampas originais apresentam acabamento preciso, sem amassamentos ou espaçamentos, e com arte impressa de alta qualidade. Já a presença de lacres plásticos sobrepostos a tampas decoradas é um forte indicativo de adulteração.

Conforme o presidente da ABBD, Eduardo Cidade, é essencial separar o setor produtivo formal – que cumpre padrões rígidos de qualidade, segurança e conformidade regulatória – da atuação criminosa do mercado ilegal.

Casos

De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil costuma registrar cerca de 20 casos por ano de intoxicação por metanol, em geral relacionados a tentativas de suicídio ou autoagressão ou de pessoas em situação vulnerável, como moradores de rua, que consomem combustível por causa do teor alcoólico.

O Ministério está em um processo de negociação com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) – o escritório regional da Organização Mundial da Saúde (OMS) nas Américas – para estabelecer uma reserva estratégica do antídoto fomepizol.

Este medicamento é crucial no tratamento de intoxicações por metanol e etilenoglicol, substâncias que podem ser extremamente perigosas se ingeridas. No entanto, o fomepizol ainda não possui registro no Brasil, o que limita significativamente seu uso no país.

A iniciativa visa aumentar a segurança e a disponibilidade de tratamentos eficazes para essas intoxicações, que têm se tornado uma preocupação crescente entre as autoridades de saúde.

Atualmente, o único antídoto disponível no Brasil para tratar intoxicações por metanol é o etanol farmacêutico. Este tratamento está restrito a apenas 32 centros de referência de intoxicação do Sistema Único de Saúde (SUS), o que limita o acesso em casos de emergência.

O fomepizol, por outro lado, é recomendado pela OMS como uma alternativa eficaz. A ideia do Ministério da Saúde é viabilizar o registro e reforçar os estoques de antídotos no país.

O Ministério da Saúde informou na tarde da sexta-feira (3) que foram registrados 113 casos suspeitos de intoxicação por metanol no Brasil. Desse total, 101 são em São Paulo (11 confirmados e 90 em investigação), seis casos estão sendo investigados em Pernambuco, dois na Bahia e no Distrito Federal e um caso está em investigação no Paraná e Mato Grosso do Sul. O óbito confirmado é da capital São Paulo. Outros 11 estão sendo investigados. Oito em São Paulo, um em PE, um na Bahia e um no Mato Grosso do Sul.

Polícia Federal

O Ministério da Justiça e Segurança Pública colocou a estrutura da Polícia Federal à disposição das polícias científicas estaduais e do Distrito Federal para ajudar no trabalho de perícia do metanol, inclusive a capacidade técnica de identificar o chamado “DNA do metanol”, que pode dar a pista se a substância tem origem vegetal ou de combustíveis fósseis.

O órgão afirmou que o Instituto Nacional de Criminalística da PF será responsável pelo que chama de exames avançados de isótopos estáveis, método que permite rastrear a origem do metanol nas amostras contaminadas.

Veja como diferenciar

O tempo de aparecimento dos sintomas é uma das pistas mais importantes. Enquanto a ressaca aparece logo após o consumo excessivo de álcool, os sinais da intoxicação por metanol surgem geralmente entre 12 e 24 horas depois.

No organismo, o metanol se transforma em ácido fórmico, que pode causar lesões graves no nervo óptico, alterações neurológicas e até a morte. Pequenas quantidades já podem ser fatais, e por isso qualquer suspeita deve ser levada a sério.

Entre os sintomas de intoxicação por metanol estão o comprometimento visual: visão borrada, manchas escuras e cegueira, que pode ser parcial ou permanente (relatados em até 72% dos casos); dor abdominal intensa ou desconforto gástrico; disfunções neurológicas: sonolência desproporcional, confusão mental, dor de cabeça intensa, tremores ou até coma; complicações cardiovasculares, como infarto (mais raras).