Cidades

MUVB apoia o fim do acordo da Prefeitura de Maceió com a petroquímica

Moradores concordam com representação feita no MPF por diversas entidades e levantaram outros argumentos

Por Ricardo Rodrigues - colaborador / Tribuna Independente 26/01/2024 09h33 - Atualizado em 27/01/2024 05h59
MUVB apoia o fim do acordo da Prefeitura de Maceió com a petroquímica
Para moradores, valor liberado já estaria defasado, por conta de fatos novos que surgiram, como o colapso da mina 18, no final de 2023 - Foto: Edilson Omena

O Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB) apoia a iniciativa tomada por quatro entidades ambientais, entre elas o Greenpeace, de pedir ao Ministério Público Federal o fim do acordo da Prefeitura de Maceió com a Braskem.

Em nota à reportagem da Tribuna Independente, os integrantes do MUVB disseram que concordam com a representação assinada por essas entidades e levantaram outros argumentos que caminham nesse mesmo sentido.

O primeiro deles, tão importante quanto os demais, é com relação ao valor da indenização paga à prefeitura, R$ 1,7 bilhão, considerando muito pouco diante dos prejuízos causados à cidade pela mineração da Braskem em Maceió.

“Quais estudos foram feitos para se chegar à conclusão de que os prejuízos causados pela Braskem ao Município foram da ordem de R$ 1,7 bilhão? Ninguém sabe e esses estudos não constam no processo judicial que homologou o acordo”.

Os integrantes do Movimento argumentam ainda que “concordar que o praticante de uma infração ou de uma agressão se aproprie do bem lesado ou agredido é concordar que o infrator tire vantagem do seu ato ilegal”.

Disseram ainda que o valor liberado já estaria defasado, por conta de fatos novos que surgiram, como o colapso da mina 18, no final de 2023. Quando isso ocorreu, “o prefeito correu para Brasília para pedir empréstimo de 40 milhões de dólares”.

Reclamaram ainda da falta de participação popular e de transparência, por parte da prefeitura, nas tratativas com a Braskem. Além, da falta de ajuda às vítimas e aos municípios vizinhos que também sofreram com a mineração predatória.

Para os integrantes do Movimento, querer usar o dinheiro do desastre sem ouvir e ajudar as vítimas “é assumir uma atitude de covardia e de traição ao povo de Maceió, em particular com os atingidos pela empresa criminosa ambiental”.

A representação, pedindo ao MPF o fim do acordo da prefeitura com a Braskem, é assinada pelo Greenpeace Brasil e mais quatro entidades ambientais: Observatório do Clima, Instituto Alana, Associação Terrazul e Instituto Arayara.

NOTA DO MUVB

Acordo Braskem e Prefeitura de Maceió e alguns de seus problemas na nota:

“O primeiro problema do Acordo Braskem e Prefeitura de Maceió é a questão das informações acerca da dimensão dos danos causados pelo desastre da Braskem ao Município de Maceió. Quais estudos foram feitos para se chegar à conclusão de que os prejuízos causados pela Braskem ao Município foram da ordem de R$ 1,7 bilhão? Ninguém sabe e esses estudos não constam no processo judicial que homologou o acordo.

Houve algum procedimento administrativo no MPF tratando do caso? Também não sabemos e nada foi informado para os maceioenses. E como não se tem a informação básica e primária tudo o mais torna-se temerário dizer!”

Movimento enumera diversos problemas no acerto entre as partes envolvidas

A nota do MUVB elenca ainda outras questões:

“A CBTU em razão da perda da sua linha de trem/VLT, ou parte dela, está cobrando da Braskem mais de R$ 2 bilhões. Porque todos os prejuízos do Município de Maceió ficaram em apenas R$ 1,7 bilhão? Abrangendo perdas de escolas, postos de saúde, trafegabilidade de ruas, espaços de lazer etc. etc.?

Falar que o valor da indenização cobre a perda da receita tributária e a perda de diversos bens públicos, é falso! Uma indenização por ato ilícito não permite a apropriação por parte do causador do dano do bem ou bens destruídos ou prejudicados por ele.

Concordar que o praticante de uma infração ou de uma agressão se aproprie do bem lesado ou agredido é concordar que o infrator tire vantagem do seu ato ilegal!

Um objeto como um livro pode apresentar um valor econômico (o preço do livro), um valor de uso (o conteúdo do livro, o assunto que o livro aborda) e pode ainda ter um valor sentimental (o livro foi um presente do meu pai no dia do meu aniversário de 10 anos). Quem destruiu este livro tem o dever de pagar o valor econômico dele e um dano moral porque destruiu um bem de valor sentimental para seu dono, mas não terá nunca o direito de se apropriar deste livro. O livro mesmo destruído continuará com o seu dono, pelas razões que o dono quiser ficar com ele.
A terra, particularmente a terra urbana, é um importante meio de produção e a terra urbana é a mais importante e mais valorizada terra que existe.

Dizer que a terra pereceu (art. 1275 do Código Civil) é falar de algo que não aconteceu, pois, a terra não desapareceu, apenas está com seu uso normal temporariamente impedido, mas nada impede que passe a ter no futuro seu uso regularizado. Em outros casos de desastres ambientais essa terra agredida foi transformada em parque público para os moradores, em memorial das vítimas, sempre em bens públicos, sem qualquer possibilidade de interferência do infrator, como está sendo no Caso Braskem.

Destinar a terra urbana danificada ao causador do dano, transformando uma indenização por ato ilícito, em que o causador do dano deve pagar ao lesado sem levar nada em troca, é desvirtuar o que seja uma indenização por infração ambiental, para transformá-la em uma compra e venda.

A simples possibilidade de o infrator interferir sobre o futuro da cidade, pois ele está adquirindo os imóveis que destruiu, é favorecer o delinquente e beneficiar quem grandes males causou à cidade e as suas vítimas.

Então é falsa a aplicação do art. 1275 do Código Civil para o caso. E mesmo se fosse a situação de aplicação, teria que transformar essa área em uma área pública, e não pertencente à Braskem, a infratora, pois essa posição fere o princípio da reparação integral, considerando que o causador do dano não pode ter privilégios e poderes sobre a área que destruiu. Isso deve ser de propriedade pública municipal.

Falar de Plano Diretor para definir a destinação da área é “esquecer” que do modo que foi feito, a Braskem ficando dona da área, de que é o dono quem manda sobre o que está no seu domínio. Pode não se usar seu pleno poder de dono hoje, mas quem duvida que daqui a 10, 20, 30, 40 anos isso não se altere!?

Pelo acordo o valor acertado é sim para fatos novos, tanto é assim que houve o dolinamento da mina 18, que provocou novos problemas e ao invés da Braskem assumir os novos danos, o Prefeito correu para Brasília para pedir uma autorização de um empréstimo de 40 milhões de dólares e de construções de casas pelo programa minha casa minha vida para os novos atingidos, livrando a Braskem de suas responsabilidades.
Dizer que as indenizações das vítimas é problema das vítimas é dar as costas para a população da cidade e a Prefeitura deixar de cumprir um dos principais papeis de um ente político administrativo que é a defesa de sua população. Abandonar as vítimas é assumir uma atitude de covardia e de traição ao povo de Maceió, em particular com os atingidos pela empresa criminosa ambiental!

Sobre o uso dos recursos da indenização, eles deveriam estar inseridos no orçamento, em razão do princípio da universalidade orçamentária, devendo as parcelas pagas no ano de 2023 ser objeto de um crédito adicional e do ano de 2024 está previsto na lei orçamentária, mas o prefeito achou que recebeu um cheque em branco e que pode gastar como quiser.

Um administrador responsável e comprometido não abandona o povo, principalmente os setores mais vulneráveis desse povo, e nem considera que pode gastar o dinheiro público como quiser”.