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Relatório final da situação de moradores do Bom Parto e Flexais será apresentado em janeiro de 2024

Por Ana Paula Omena I Lucas França - Tribuna Hoje 13/12/2023 12h29 - Atualizado em 13/12/2023 18h01
Relatório final da situação de moradores do Bom Parto e Flexais será apresentado em janeiro de 2024
Conselhos cobram medidas eficazes e humanizadas para moradores do Bom Parto e Flexais - Foto: Sandro Lima

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a OAB Alagoas apresentaram na manhã desta quarta-feira (13) um diagnóstico prévio acerca da situação dos moradores do Bom Parto e dos Flexais, e sugeriram medidas eficazes e humanizadas a serem adotadas na condução do caso. A previsão é que o relatório final da missão, que está em fase de elaboração, seja apresentado ao CNDH para aprovação no início do ano que vem.

“O Conselho Nacional dos Direitos Humanos é um órgão autônomo do governo federal e nós, quando recebemos a denúncia feita pela OAB seccional de Alagoas, montamos uma equipe de missão com relatores independentes para verificar as graves violações de direitos humanos que têm ocorrido na cidade de Maceió”, frisou Marina Dermman - presidente da CNDH.

“Hoje nós vamos dar um informe sobre o que vimos, porque percorremos algumas comunidades, entramos nas casas das pessoas, vimos in loco o que está acontecendo, mas também tivemos importantes reuniões, agendas, com o poder executivo, tanto do Estado como do governo federal, municípios e também do sistema de justiça e a partir disso vamos emitir já algumas recomendações de pronto. O relatório final da missão está em elaboração e possivelmente vai ser apresentado ao Conselho Nacional dos Direitos Humanos para aprovação de seu pleno no início do ano que vem”, reforçou Dermman.

Ainda conforme a presidente do CNDH, a equipe chegou no dia 10 último, no momento em que houve o colapso da mina 18, e imediatamente foi para a comunidade do Bom Parto ficando por lá até 22h da noite. “Chegamos no final da tarde e as pessoas nos falaram que não tinha ninguém do poder público, tampouco da Defesa Civil e nós vimos isso, porque ficamos bastante tempo junto à comunidade, vendo a situação das casas, a situação das pessoas, a situação do território como um todo. E nos causa enorme preocupação, a falta de informação e informação de confiança às pessoas atingidas”, destacou.

Marina Dermman - presidente da CNDH (Foto: Sandro Lima)



Ana Carolina Barchet - conselheira federal e presidente da comissão Nacional de direitos humanos - enfatizou classificando a situação como sendo de crime ambiental continuado e que os órgãos devem atuar juntos para cobrar ações concretas e montar uma força tarefa para fiscalizar o que já foi feito e o que deve ser feito.

“Uma ideia é essa reparação de transformar o local em um espaço de parque ambiental. Além disso, não são órgãos que têm que provar o crime, é a empresa que deve mostrar que não cometeu o crime. Mas nesse caso o crime está claro e os danos à população e ao meio ambiente estão evidentes", disse.

“Não podemos permitir que as licenças da Braskem atuem em outras áreas de Alagoas. Essas licenças devem ser suspensas. Ela tem que mudar as suas práticas de atuação. Essa é uma sugestão que damos para a OAB. A empresa precisa reparar de imediato o crime contra a humanidade”, salientou Barchet.

Para ela, informação ambiental e em direito humano não pode ser feita em sigilo, pois segundo Ana Carolina, isso só favorece a própria empresa já que não mostra práticas sustentáveis. “A empresa faz dessa maneira sem divulgar para manter seus valores internacionalmente, sendo desse porte é difícil responsabilizar criminalmente, pois não tem uma face e querem o lucro, enquanto tiver isso não irá resolver nada, por isso destaco a suspensão das licenças." defendeu.

Ana Carolina Barchet - conselheira federal e presidente da comissão Nacional de direitos humanos (Foto: Sandro Lima)



De acordo com Wagner Paes - presidente da OAB/AL, é de fundamental importância a presença dos conselhos e órgãos na análise e produção deste relatório que vai contribuir sobre a maneira para a efetivação dessa situação, trazendo soluções concretas para a situação das vítimas da Braskem.

“Traz alguma luz, traz a importância de ouvir as pessoas, de ouvir aqueles que estão na ponta e no final dessa situação, além de dar um olhar mais atento, mais dissociado completamente de qualquer viés político, já que a população que vem sofrendo muito ao longo dos últimos anos também passa agora por mais uma violação que é o direito à informação”, observou.

“Há uma medida de informações associadas à realidade que prejudicam para além dos moradores, prejudicam o turismo, prejudicam a população, a sociedade e é preciso a gente ter um olhar mais atento, mais responsável sobre as informações também que são divulgadas nas redes sociais, na imprensa e através de todo o repertório das redes sociais”, completou Paes.

De acordo com Alexandre Sampaio - presidente da Associação dos Empreendedores e Vítimas da Mineração, a presença da Comissão Nacional de Direitos Humanos em Maceió reforça a luta por direitos, encabeçada pela Defensoria Pública do Estado, que pede a realocação na justiça das comunidades do entorno do mapa, como o Bom Parto, Flexais, Marquês de Abrantes, Vila Saem, entre outros.

“Isso é fundamental na nossa opinião, porque traz um olhar externo para mostrar que as violações são flagrantes dos direitos humanos nessas comunidades. Eu acho que traz também uma força institucional para a luta das vítimas, já que há diversos tipos de ameaças e constrangimentos que, na verdade, só reforçam a postura do poder econômico da Braskem em relação à atuação das lideranças. E, finalmente, eu acho que também põe a justiça em alerta, porque ela veio também apurar aquela noite do terror quando uma decisão de um juiz da terceira vara, que substituiu outro, autorizou o uso da força para retirar do mapa de risco pessoas que não tinham feito acordo com a Braskem ainda”, explicou Alexandre Sampaio.

Roberto Moura, presidente da Comissão dos Direitos Humanos da OAB Alagoas, lembra das inúmeras denúncias e a composição de três relatórios disponíveis acerca do assunto com violações do direito à saúde, ao trabalho e comércio, transporte, segurança, moradia digna, educação, saúde mental, crime ambiental, entre outros.

“Queremos o máximo de transparência, não é porque estamos diante de uma empresa de grande monta que devemos baixar a cabeça, pelo contrário, a partir daí precisamos traçar medidas concretas de uma situação nunca vista no mundo. Então, precisamos estabelecer medidas firmes e um acompanhamento estimado, principalmente aos atingidos. Domingo estivemos no local, onde haviam várias bases, mas nenhuma assistência do poder público àquela comunidade. Por isso, precisamos dar assistência humanizada à toda a população e principalmente aos mais atingidos por situação de vulnerabilidade social e econômica”, ponderou.

Defensor Público reforça que moradores ilhados devem sair urgentemente da região


O defensor público Ricardo Melro voltou a reforçar a realocação dos moradores do Bom Parto e Flexais das áreas afetadas pelo afundamento do solo causado pela Braskem. Ele lembrou da ação civil pública para retirada das pessoas na primeira tentativa que durou cerca de um ano, de forma consensual com a empresa e outros órgãos, porém todos negaram.

“Essas vítimas são as cobaias do experimento de reurbanização, por isso fomos à justiça, estamos questionando algumas cláusulas desse acordo, mas até o presente momento a justiça não deu uma resposta que a população necessita. E não é porque eu quero, e não é também porque elas querem, apesar de que a palavra delas tem que ser levada muito em consideração, porque eles que estão com a pele em jogo lá, sabendo o que está acontecendo”, mencionou.

Segundo Melro, há estudiosos da Ufal dizendo a mesma coisa, antropólogos do MPF, da Faculdade de Urbanismo, Arquitetura, Defesa Civil, Conselho de Direitos Humanos local, todos os órgãos imparciais, autônomos, competentes, e nada disso foi levado em consideração. “O que foi levado em consideração foi um relatório pago pela Braskem a uma empresa. Jogaram tudo na lata do lixo em prol de um relatório pago pela Braskem. E não levaram em consideração as palavras das principais pessoas que são as vítimas”, desabafou.

Defensor público Ricardo Melro (Foto: Sandro Lima)



Ainda conforme o defensor público, a justiça não deu o respaldo à liminar totalmente equivocada. “Pedimos em consideração diante dos novos acontecimentos, não foi apreciado. Mas, eu repito, não precisa ter risco de afundamento naquela região, o risco é social. Ele é inviável para aquelas pessoas continuarem lá. Estão adoecendo com problemas de saúde mental de toda a ordem. Estão desesperadas. É preciso empatia. É preciso sair, sim, de todos os seus gabinetes. Conviver com aquelas pessoas. Andarem naquele local. Fazer audiência para ouvir de fato todo mundo lá dentro da região para poder realmente saber o que é correto fazer para elas. Estamos lutando por isso. E aguardamos esse relatório que será apresentado hoje do Conselho Nacional de Direitos Humanos, pessoas que têm uma expertise muito boa e que venham ao encontro da realidade, porque se vier, a gente vai levá-lo para a justiça como mais um elemento para que o juiz decida, mas decida rápido e a favor dessas pessoas, antes tarde do que nunca. As pessoas têm pressa e têm sede de justiça”, finalizou.