Política
Movimento sindical resiste com dificuldade em Alagoas
IBGE apontou que índice de filiações aos sindicatos voltou a crescer em Alagoas, mas ainda segue muito abaixo da média nacional
Em pesquisa publicada em novembro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Alagoas apresenta alta pela primeira vez, desde 2016, no índice de sindicalização dos trabalhadores. A pesquisa é referente ao ano de 2024. Apesar do número positivo, o Estado ainda figura em último lugar, ao lado de Sergipe, com apenas 6,8% das pessoas organizadas através de sindicatos. O número representa alta de 1,3% comparado com 2023.
Em 2016, o percentual chegou a 9,4% dos trabalhadores alagoanos sindicalizados. De lá pra cá, em todos os anos teve queda. Hoje, a média nacional está em 8,9%, e a do Nordeste em 9,3%. A alta em Alagoas foi maior que a variação registrada no Brasil e no Nordeste entre 2023 e 2024. Enquanto Alagoas subiu 1,3 pontos percentuais, o Brasil subiu 0,5 e o Nordeste recuou 0,2. O Estado com mais sindicalizados no país é o Piauí, com 13,9%.
Observando a realidade atual e comparando com as organizações sindicais de décadas atrás, é possível perceber que há uma mudança drástica na capacidade de mobilização. As razões para explicar o fenômeno são muitas, ouvindo os atores do processo. Reformas na legislação, interferências da tecnologia que trouxe novas formas de relações de trabalho, e até mesmo uma mudança de mentalidade nas novas gerações da classe trabalhadora.
Lideranças sindicais acreditam que esse é um momento de retomada, e que o movimento do Governo Federal teve influência tanto no momento de queda, quanto na atual retomada. Dafne Orion, presidente do Sindicato dos Urbanitários de Alagoas, vê as bases voltando a compreender a relação direta entre a organização de classe com os seus próprios direitos.
“Acredito que o aumento na sindicalização se deva ao avanço nas conquistas da classe trabalhadora e ficou muito perceptível que a luta sindical é um dos grandes pilares para que isso aconteça. Isso tem se traduzido, tem refletido também num governo que tem compromisso com os sindicatos, com as centrais dos trabalhadores que apoiaram, que fizeram campanha para esse governo”, avalia.
Pautas que estão sendo levantadas trouxeram a atenção de volta. “Então, colocar na rua pautas como fim da escala 6 por 1, são os sindicatos que tem feito esse debate nas ruas, um debate ousado e a classe trabalhadora tem enxergado isso, o fim da isenção do imposto de renda, para quem ganha até R$ 5 mil, isso atinge diretamente a classe trabalhadora também. A luta nos acordos coletivos, o avanço para manter o reflexo do ganho real no salário-mínimo, que isso se repita nos acordos, também eu acredito que seja, isso que tem feito com que a classe trabalhadora de novo perceba a importância que os sindicatos têm e da classe trabalhadora se organizar como um todo”, destaca, em contato com a reportagem da Tribuna Independente.
À frente de um dos grandes sindicatos do Estado, Dafne tem acompanhado o processo de privatização de sua base, que era formada por serviço público e migrou para o privado. (Eletrobras se tornou equatorial, Casal se tornou BRK).
“O recorte que a gente faz em Alagoas é muito interessante, porque Alagoas vivenciou, da pandemia para cá, um boom, né, de empresas que chegaram ao estado, mas pagando salários muito baixos, inclusive até abaixo do salário-mínimo. Então, os avanços têm sido pequenos diante desse distanciamento tão grande da realidade. Os sindicatos têm buscado eliminar essa prática tão nociva de salários precarizados, de empregos precarizados, de acordos rebaixados, mas a distância ainda é muito grande por isso, porque infelizmente empresas grandes, né, no setor de energia, de saneamento, se instalaram no estado mas com salários rebaixados, sem piso para categorias que são importantes, para categorias consolidadas, sem querer pagar piso salarial”.
Cenário é otimista, mas a reforma trabalhista causou impacto negativo
Ciente dos desafios, mas otimista em relação ao potencial que visualiza nas novas gerações, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação em Alagoas (Sinteal), Izael Ribeiro, acredita que é possível construir um bom diálogo com as novas e antigas gerações.
“Sabemos que não há outro caminho para conquistar direitos e até manter os que já foram conquistados na luta, se não o fortalecimento da categoria através do sindicato. É uma guerra difícil, porque até no algoritmo das redes sociais o debate é desigual, mas na prática, a trabalhadora e o trabalhador sentem que não têm força para enfrentar o patrão sozinhos. Então seguimos fazendo a mesma luta que é feita há décadas, com nossas bandeiras nas ruas, mas aprimorando também as formas de comunicação, as ferramentas digitais e tudo o que estiver ao alcance para mobilizar a base”, avalia.

Izael acredita que as categorias do serviço público atualmente enfrentam forte impacto da reforma trabalhista, que ampliou contratos temporários e relações precarizadas, e que podem ser ainda mais penalizadas se a reforma administrativa for aprovada.
“Isso é um desafio, mas temos buscado saídas. É fundamental que a classe trabalhadora compreenda que pautas como essas, que estão sendo discutidas no Congresso Nacional, mudam completamente a nossa vida. Então temos trabalhado para levar isso à base antes de ser votado. Às vezes não estamos com uma multidão em Maceió, mas temos uma ação virtual massiva pressionando os parlamentares. Não podemos achar que dá pra ser igual aos anos 80, há uma outra dinâmica, mas temos a certeza de que só a luta nos garante”, ressalta.
“Neoliberalismo desmobiliza a classe”
Ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Alagoas (Sinteal), entre 1997 e 2003, Lenilda Lima, também faz uma análise sobre o indicador Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que aponta Alagoas com uma alta no índice de sindicalização dos trabalhadores.
À Tribuna Independente, ela explica que a principal diferença entre o momento atual e o de sua gestão, é que há uma fragmentação da classe trabalhadora.
“Hoje nós temos vários contratos temporários onde você tem categorias diferentes dentro do mesmo campo. Antigamente, não. Nós tínhamos somente o servidor público efetivo. Hoje nós temos o efetivo, o chamado monitor, que não é monitor, é o contrato temporário. Nós já tivemos e bolsistas e nós temos mais variados, temos terceirizado e quarteirizados então isso é alastrou”, diz.
Ela resgata o momento mais forte dos sindicatos, no final dos anos 80, e que havia um senso comum mais favorável. “Primeiro nós tivemos um aceno ao movimento sindical após todo um processo de redemocratização do país onde as pessoas estavam extremamente motivadas, os movimentos fortes, as pessoas se entendiam enquanto classe trabalhadora isso era algo muito, muito forte. Então, nós tínhamos lideranças fortes”, contextualiza.

Aposentada, mas atuante no movimento até hoje, Lenilda viu as mudanças acontecerem e entende que se trata de um projeto neoliberal (redução do papel do Estado na economia, priorizando o livre mercado, a livre concorrência e a diminuição da intervenção estatal) de desmobilizar a classe.
“Na verdade, a reforma trabalhista abriu as portas para esse novo tipo de contratação. E é lógico que isso fragiliza a classe trabalhadora. Somado a isso, tem outras mudanças do mundo do trabalho. Por exemplo, quando vieram as novas tecnologias, quando vem o mundo digital, muda também. Hoje as pessoas fazem muitas disputas na rede. Então, hoje você tem dois tipos de mobilização: o da rede e o das ruas. Uma não substitui a outra, mas muitas pessoas acham que substitui, principalmente para as pessoas que trabalham em home office. Como você chegar até elas? Como você organizar todo esse povo com tipos diferenciados de contratos com o nível de informalidade que nós temos?”.
Olhando para o presente, Lenilda vislumbra que o caminho mudou, mas a militância segue ocupando as ruas. Para além das questões salariais, há outros fatores mobilizando, mas que em médio prazo vai se converter em organização classista.
RELAÇÕES
DE TRABALHO
A questão sindical também tem sido alvo de estudo entre os acadêmicos. Para o historiador Jailton Lira, professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), a principal causa da baixa sindicalização vem da mudança nas relações de trabalho.
“Eu acho que essa taxa de sindicalização, digamos assim, negativa não tem relação com o perfil das lideranças e não tem relação com qualquer pressão patronal. O fato é que as grandes categorias organizadas no setor privado ou no serviço público, no setor privado, a área dos metalúrgicos, dos bancários e no setor público, a área da saúde, da educação, são categorias que passaram por uma série de modificações ao longo do tempo”, justifica.
A presença cada vez mais forte da tecnologia impactou, na avaliação de Jailton. “No caso do setor privado, setor bancário, por exemplo, é um setor que perdeu muitas pessoas nas últimas décadas. As pessoas foram demitidas, os bancos foram extintos, especialmente os públicos, e o processo de informatização acabou tomando emprego desse pessoal. Algo semelhante aconteceu no ramo metalúrgico. E as novas, digamos, categorias ou profissões, que estão surgindo são profissões que não tem uma organização política que possa estabelecer algum tipo de organização mais substancial dessas pessoas, me refiro basicamente aos trabalhadores dos aplicativos”, diz.
A posição baixa de Alagoas em relação ao país, Lira atribui ao perfil econômico. “Nossa particularidade tem a ver de fato com a nossa matriz econômica pouco diversificada. Então a gente tem o mercado de trabalho que contrata pessoas com baixa formação, a gente não tem indústria de peso, a gente não tem uma expansão do comércio, pelo contrário, a gente talvez tenha um crescimento e tem do setor terciário, principalmente na área do turismo e de serviços, que são áreas de trabalho que também, embora empregue em grande número, não contam com organizações sindicais fortes e expressivas”.
Desinteresse das novas gerações tem sido prejudicial e aflige sindicatos
Já o historiador Fabiano Duarte, do Instituto Federal de Alagoas (Ifal), soa pessimista sobre o futuro dos sindicatos.
“Infelizmente a gente não consegue ainda perceber uma mudança significativa no perfil das lideranças. Pelo contrário, as mudanças que ocorreram na legislação trabalhista, principalmente no governo Bolsonaro [2019-2022] e no governo Temer [2016-2018], e a mais sensível delas entre todas, é o fim da obrigatoriedade do imposto sindical, ele prejudicou muito, principalmente os sindicatos dos trabalhadores do setor privado, seja ele indústria ou comércio. Os sindicatos tiveram uma queda vertiginosa nacionalmente”.

Na visão dele, há desinteresse das novas gerações. “Os jovens trabalhadores que estão adentrando no mercado de trabalho de carteira assinada não têm muito interesse. Na verdade, é uma afiliação sindical obrigatória, por conta das questões legais. E a gente não vê assim os principais sindicais, os principais sindicatos com novas lideranças ascendendo. A gente vê as mesmas lideranças e um ou outro jovem participando da diretoria, mas com funções mais ainda, vamos dizer assim, de segundo escalão. Aqui e acolá que você vê renovações, poucas ainda”.
Segundo as pesquisas do historiador, isso é também responsabilidade das direções sindicais.
“No ano passado nós fizemos um dossiê dos sindicatos e neste dossiê a gente não percebe essa política de renovação. Porque você tem um problema, não é só a questão da direção sindical não ter a política para fazer essa renovação, porque aí tem que fazer formação na base, tem que fazer formação de novos dirigentes”.
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