Política

Projeto sobre alimentos ultraprocessados aguarda regulamentação pelo governador Paulo Dantas

De autoria do deputado José Wanderley, PL proíbe oferta e comercialização deste tipo de alimentos nas escolas de Alagoas

Por Valdete Calheiros – colaboradora / Tribuna Independente 13/09/2025 08h20 - Atualizado em 13/09/2025 08h47
Projeto sobre alimentos ultraprocessados aguarda regulamentação pelo governador Paulo Dantas
Deputado José Wanderley (MDB) diz que projeto é de suma importância para a saúde dos estudantes - Foto: Adailson Calheiros

Aguarda sanção do governador Paulo Dantas (MDB), o projeto de lei (PL), de autoria do deputado estadual José Wanderley Neto (MDB), que proíbe a oferta e a comercialização de alimentos ultraprocessados nas unidades escolares das redes pública e privada. A expectativa é de que o projeto vire lei nos próximos dias.

O texto foi aprovado, terça-feira (9), de forma unânime e em segundo turno, na Assembleia Legislativa de Alagoas. As instituições de ensino terão 180 dias para se adequarem à norma. O prazo começa a contar depois que o projeto passar pela sanção do poder executivo.

O deputado José Wanderley destacou que a legislação representa um avanço para a saúde pública, lembrando que estudos comprovam os riscos do consumo desses produtos na infância para o desenvolvimento de doenças crônicas como câncer e problemas cardiovasculares.

Ele explicou que Alagoas será o primeiro estado do país a ter uma legislação voltada à preocupação alimentar, ainda nas idades iniciais e dentro do ambiente escolar.

“Às vezes, em casa, os familiares controlam a alimentação, mas nas escolas, longe do olhar familiar, crianças e adolescentes consomem este tipo de alimento. Desta forma, vamos ampliar os cuidados”, considerou o parlamentar que é médico cardiologista.

O parlamentar também ressaltou, que a medida incentiva o consumo de alimentos naturais da agricultura familiar no cardápio dos alunos, movimentando a economia local, principalmente em municípios menores.

O deputado citou ainda a colaboração das deputadas Fátima Canuto e Cibele Moura, ambas do MDB, que considera coautoras da proposta e disse esperar que o governo sancione o texto sem vetos em benefício da saúde pública.

O médico pediatra e presidente da Sociedade Beneficente do Coração de Alagoas (Casa do Coraçãozinho), Cláudio Soriano, citou a Organização Mundial de Saúde (OMS) para explicar que a base de uma vida longeva e saudável está baseada em três pilares: dormir bem, exercitar-se bem e alimentar-se bem com dieta balanceada e saudável.

“Contudo o que vemos com frequência é a invasão de alimentos ultraprocessados no ambiente de convívio das crianças. Justamente por isso, acredito que o projeto em questão é de grande relevância, pois o ambiente escolar tem bastante influência nos hábitos dos escolares e que a preservação de um ambiente saudável com oferta de alimentos saudáveis e adequados para o seu crescimento e desenvolvimento são essenciais”, destacou.

Pediatra Cláudio Soriano diz que projeto é importante para Alagoas (Foto: Adailson Calheiros)

Na avaliação do médico Cláudio Soriano, esse período crítico da criança e do adolescente tem uma importância vital no desenvolvimento de bons ou maus hábitos e que a simples exposição e oferta facilitada destes ultraprocessados para esse público, aliado à intensa propaganda da mídia, e também acrescido aos maus hábitos alimentares da família (pais e irmãos) por si só já são um grande obstáculo na aquisição de bons hábitos que podem diferenciar o presente e futuro cardiovascular e também de doenças degenerativas.

“A ciência já demonstra que mesmo com a herança familiar de obesidade, hipertensão e diabetes podem ser moduladas e inclusive distinguir em uma situação de epigenética, onde segundo a OMS a presença de bons hábitos de vida como o sono reparador de ao menos 8 horas, exercícios vigorosos de uma hora por dia e, enfim uma alimentação saudável e equilibrada otimizam a qualidade de vida e superação de doenças degenerativas em especial o câncer e doenças cardiovasculares”, salientou.

NUTRIÇÃO

Ultraprocessados podem causar

obesidade e outras doenças

“Segundo Rafael Azeredo, a escola é um espaço decisivo, onde os hábitos se formam. O PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar), o Decreto nº 11.821/2023 e orientações do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) já indicam restrições à venda, doação e publicidade de ultraprocessados nas escolas. Mais recentemente, o Decreto nº 11.936/2024 excluiu esses produtos da cesta básica, reforçando a prioridade para alimentos “in natura” e minimamente processados.

“Evidências mostram que maior consumo de ultraprocessados está associado a mais risco de obesidade e doenças crônicas. Por outro lado, restringir a oferta em escolas reduz o consumo e melhora a qualidade da dieta. Assim, proteger o ambiente escolar não é exagero: é agir no presente para garantir saúde no futuro”, pontuou o nutricionista.

Presidente do Conselho de Nutrição da 6ª Região, Rafael Azeredo (Foto: Sandro Lima)

Conforme o nutricionista e presidente do Conselho Regional de Nutrição da 6ª Região (CRN-6), Rafael Azeredo, o Brasil vive uma transição alimentar entre a diminuição da desnutrição e o rápido aumento do sobrepeso e da obesidade, inclusive entre crianças e adolescentes.

“Esse cenário se relaciona à presença massiva de ultraprocessados, produtos baratos, duráveis e hiperpalatáveis que o Guia Alimentar para a População Brasileira recomenda evitar”.

Ainda segundo o nutricionista, a realidade é paradoxal. Em 2022, afirmou ele, 58,7% dos domicílios brasileiros enfrentavam algum grau de insegurança alimentar, enquanto os índices de excesso de peso cresciam.

Trata-se da chamada “dupla carga”, completou Rafael Azeredo, fome e má alimentação de um lado; excesso de peso e doenças crônicas, como diabetes e hipertensão, de outro.

A Organização Mundial de Saúde (OMS), citou o presidente do Conselho, recomenda “ações de duplo benefício” no ambiente escolar, medidas que previnam tanto a desnutrição quanto a obesidade.

O Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino dos Estado de Alagoas (Sinepe) não respondeu à reportagem. A Secretaria de Estado da Educação afirmou que se manifestará apenas após a sanção do projeto.

A Secretaria Municipal de Educação explicou que alimentos e bebidas desse tipo já não constam na merenda escolar ofertada na rede pública municipal de ensino. E que não há comercialização de alimentos nas unidades escolares da rede. A merenda é fornecida pelo município.

Alimentação saudável é realidade em cantina de escola

“Não vendemos frituras, nem biscoitos, nem snacks, nem refrigerantes, tudo é produzido pela cantina diariamente. O lanche saudável é uma construção, não funciona como imposição, já vivemos a experiência que tudo integral os meninos não aceitam, então hoje nós temos as duas opções e estamos sempre investindo em novas receitas com produtos sem glúten, sem lactose e cada ano diminuindo o consumo de açúcares”, afirmou Thalita Rafaela Correia de Carvalho Silvério, da cantina de um colégio de Maceió.

Cantina de escola da capital alagoana já oferece opções de alimentação saudável para os estudantes (Foto: Sandro Lima)

Ela destacou que o suco é feito com redução de açúcar, no começo, os alunos estranharam, mas hoje já se adaptaram, o que nos mostra que aos poucos estamos conseguindo modificar o paladar deles e isso acaba fazendo com que eles aceitem os itens com mais naturalidade.

Obesidade

A obesidade é uma doença crônica que afeta um em cada quatro brasileiros. Para frear seu avanço, médicos propõem intervenções cirúrgicas e farmacológicas mais cedo, aliadas a mudanças no estilo de vida.

O Atlas Mundial da Obesidade estima que, se nada mudar, quase metade da população adulta brasileira (48%) será obesa e outros 27% terão sobrepeso até 2044. O documento, editado pela Federação Mundial da Obesidade, foi lançado este ano.

Uma pessoa é considerada obesa quando tem IMC (Índice de Massa Corporal) – peso dividido pelo quadrado da altura – acima de 30; acima de 25, fala-se em sobrepeso.