Cidades

Acordo sobre indenizações completa dois anos

Braskem tem até o fim do ano para finalizar compensações; moradores falam em empobrecimento da população atingida

Por Texto: Evellyn Pimentel com Tribuna Independente 08/01/2022 09h01
Acordo sobre indenizações completa dois anos
Reprodução - Foto: Assessoria
O acordo que “inaugurou” o processo de indenizações aos moradores atingidos pelo afundamento de solo em cinco bairros da capital completou dois anos no último dia 3. Cercado por polêmicas e controvérsias, a Tribuna Independente ouviu os envolvidos para formular um balanço dos resultados até agora. Segundo informações do Ministério Público Federal (MPF), o Segundo Aditivo ao Termo de Acordo de Indenização, de 30 de dezembro de 2020, previu a inclusão de todas as unidades habitacionais e comerciais abrangidas pelo Mapa de Risco da Defesa Civil, no Programa de Realocação e Compensação Financeira (PCF), independentemente do nível de criticidade. De acordo com a Braskem, dos 14.419 imóveis identificados no mapa de desocupação e monitoramento definido pela Defesa Civil, 14.014, ou seja, 97% já foram desocupados. “Até agora, 11.875 propostas foram apresentadas, das quais 10.287 foram aceitas e 9.084 pagas – a diferença entre os números se deve aos prazos que as famílias, comerciantes e empresários têm para aceitar os valores ou solicitar sua reanálise. A média de apresentação de novas propostas tem se mantido superior a 700 por mês, e o índice de aceitação é de 99,6%, com apenas 47 recusadas até o momento. O valor pago em indenizações, auxílios financeiros e honorários de advogados já supera R$ 1,9 bilhão. Esses e outros dados são apresentados regularmente às autoridades signatárias do acordo, e divulgados no site braskem.com.br/alagoas, ficando à disposição do público”, afirma a empresa. Desde 2018, quando houve o tremor que deu notoriedade à problemática, diversos movimentos surgiram na representatividade dos moradores, entre eles, o Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB) se consolidou como o que permaneceu no debate das consequências do acordo para a população afetada. Na avaliação do procurador, ex-morador do Pinheiro e integrante do MUVB, Cássio Araújo, na prática o acordo restringiu a possibilidade de benefícios aos moradores. “Uma máxima e amplamente divulgada tese de um filósofo grego diz que os iguais têm que ser tratados iguais e os desiguais de forma desigual, isto é diferente. Em toda disputa trabalhista o trabalhador é considerado de menor poder em relação à empresa, mesma regra se aplica ao direito do consumidor, para isso foram criados os Procons. Já neste caso, as pessoas foram conduzidas a negociar com o maior interessado em pagar menos, que é a Braskem, é óbvio que a Braskem não está interessada em despender grandes valores, quanto mais economizar melhor. A figura do advogado entrou como um adorno e o morador acaba sendo vencido pela necessidade da moradia”, pontua. Termos preveem que Braskem indenize todos moradores até o final deste ano [caption id="attachment_487366" align="aligncenter" width="533"] De acordo com a Braskem, 97% dos imóveis identificados no mapa de risco já foram desocupados (Foto: Edilson Omena)[/caption] Conforme explica o Ministério Público Federal (MPF), responsável pela Força Tarefa do Caso Pinheiro e adjacências, os termos do acordo preveem que a Braskem indenize todos os moradores até o fim deste ano. “O fluxo de indenização segue em curso, cuja previsão de encerramento é dezembro de 2022. Para as situações em que o acordo individual entre atingido e Braskem, por qualquer motivo, não se concretizar, a discordância poderá ser levada ao Judiciário, não precisando esperar o prazo de 31 de dezembro de 2022. Os moradores e empresários não são obrigados a aceitar o valor da indenização ofertado pela Braskem, ainda que estejam inseridos no Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (PCF). O termo de acordo garante ao cidadão que ingressou no PCF, discordando do valor de indenização ofertado pela Braskem, busque a justiça. No âmbito do PCF, o atingido tem direito a pedir a reanálise da proposta. Não havendo modificação no valor ofertado ou não satisfeito o atingido com o valor proposto, o advogado ou defensor constituído pode peticionar ao juiz para que nomeie um perito para avaliação do imóvel, conforme cláusulas 5ª e 13ª do Termo de Acordo, procedimento este que será mais célere por se limitar ao valor em discussão. Nesses casos, não será discutida a responsabilidade da Braskem, mas apenas a questão pontual, uma vez que o termo de acordo garantiu a superação dessa fase”, detalha o órgão. Para o ex-morador do Pinheiro Cássio Araújo, apesar da possibilidade da ação judicial, todos os processos envolvendo as indenizações estão parados na Justiça e só terão sequência após o fim do prazo do acordo. Isto é, apenas no ano que vem os processos começarão a andar. “Na prática isso vence o morador pelo cansaço. Porque se vê inseguro quanto à incerteza de uma decisão judicial que pode durar muito tempo e acaba aceitando a proposta. Numa negociação em São Paulo que indenizou moradores para a construção de um viaduto, a Justiça lá elaborou normas e parâmetros para o cálculo dos valores. Aqui, a Braskem diz que a casa vale R$ 100 mil, o morador tem uma avaliação que diz que vale R$ 300 mil, mas a Braskem diz que vale R$ 100 mil e a pessoa fica à mercê de aceitar qualquer valor ou iniciar uma disputa. Imagine você de uma hora para a outra virar um sem-teto?”, diz Araújo. “Resultado será empobrecimento e adoecimento das famílias atingidas” Cássio Araújo avalia ainda que o cenário a longo prazo para as famílias atingidas é de empobrecimento e perda do poder de compra. “A Braskem informou que já aplicou R$ 1,6 bilhão nas indenizações a cerca de 10 mil moradores. Se fizermos um cálculo rápido isso dá uma média de R$ 160 mil por pessoa, considerando os R$ 40 mil de danos morais, a média de indenização de cada imóvel é de R$ 120 mil. O resultado desse acordo vai ser o empobrecimento e o adoecimento ainda maior dessas famílias que vão precisar morar em lugares aquém do que moravam, em realidades muito diferentes, precisando destinar recursos que talvez não estariam disponíveis em algo que é essencial que é a moradia, que em muitos casos foi o investimento de uma vida toda”, enfatiza. AVALIAÇÃO POSITIVA Tanto MPF quanto Braskem classificam o acordo de forma positiva. Dada a complexidade do problema até então jamais vivenciado no estado, o órgão ministerial afirma que o acordo trouxe soluções de efeitos práticos. “A avaliação que as procuradoras da República do MPF em Alagoas que acompanham o Caso Pinheiro/Braskem é de que a amplitude dos efeitos práticos alcançados com os Termos de Acordo firmados com a empresa é inestimável para uma solução rápida e efetiva da questão que envolve danos individuais, mas também socioambientais. Registre-se que uma série de medidas estão sendo adotadas com base no Acordo Socioambiental, tais como: instalação de equipamentos e realização de estudos para monitoramento da região; realização de estudos dos danos ambientais e sociais; realização de procedimentos para estabilização das cavidades; providências para proteção do patrimônio histórico, etc. Mais recentemente, iniciou-se o plano de estabilização da encosta, com a demolição de imóveis. Também está em discussão a implantação de medidas para a melhoria da mobilidade urbana. Os acordos firmados são dinâmicos e preveem a possibilidade de ajustes e atualizações diante da dinamicidade do próprio evento que atinge diretamente parte de cinco bairros de Maceió e indiretamente o entorno e toda a cidade. Absolutamente nada impede que novos acordos ou aditivos sejam firmados e nem uma eventual nova ação, seja cível ou criminal”, explica a Força Tarefa. Já segundo a Braskem a prioridade tem sido a segurança das pessoas, além disso a empresa afirma que vem “propondo e executando ações nesse sentido”. “A avaliação é que as ações decorrentes do acordo avançaram de forma positiva, tanto no que diz respeito à segurança das pessoas, com a realocação preventiva das famílias, comerciantes e empresários das áreas de risco e monitoramento identificadas pela Defesa Civil, quanto em relação ao andamento do fluxo de compensação financeira, com elevado índice de aceitação de propostas e aumento nos números de acordos firmados e pagamento de indenizações. Aperfeiçoamentos contínuos feitos a partir do diálogo com as autoridades e de escutas à comunidade têm trazido cada vez mais agilidade ao Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação”, diz a petroquímica.