Saúde

Óleo extraído da maconha é esperança para doentes em Alagoas

Com Lei que assegura o uso medicinal de produtos à base de canabidiol, Alagoas entra no rol da melhora na qualidade de vida de pacientes portadores de doenças degenerativas

Por Wellington Santos / Tribuna Independente 28/01/2023 08h00 - Atualizado em 28/01/2023 09h24
Óleo extraído da maconha é esperança para doentes em Alagoas
Nutricionista Cybele Castro, com recipiente do canabidiol, é prescritora do óleo extraído da maconha a pacientes com doenças degenerativas junto com médico do Hospital Sírio Libanês - Foto: Adailson Calheiros

A Assembleia Legislativa de Alagoas (ALE) promulgou no fim do ano passado a lei de número 8.754, que versa sobre o acesso ao tratamento de saúde com produtos de cannabis e seus derivados — a popular e ainda estigmatizada maconha. Sendo assim, o Estado passa a fomentar a pesquisa sobre o uso medicinal e industrial de medicamentos com o canabidiol (conhecido popularmente como CBD), substância extraída da planta Cannabis sativa, que atua no sistema nervoso central. Esta apresenta potencial terapêutico para o tratamento de doenças psiquiátricas ou neurodegenerativas, como esclerose múltipla, epilepsia, esquizofrenia, mal de Parkinson, epilepsia, fibromialgia entre outras.

Com a Lei que assegura o uso medicinal de produtos à base de cannabis, Alagoas entra no rol da melhora na qualidade de vida de pacientes portadores de várias doenças degenerativas, desde que com prescrição de profissional habilitado, observadas as disposições da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A promulgação da lei em Alagoas vai a reboque da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em 2021, já havia colocado uma pá de cal e definitivamente sepultou no ordenamento jurídico vigente todas as alegações contrárias ao dever do Estado de fornecer o medicamento canabidiol a pacientes que batem às portas da Justiça lutando pelo direito à vida.

Na decisão, o Supremo decidiu que cabe ao Estado fornecer o medicamento que, embora não possua registro na Anvisa, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, desde que comprovada a imprescindibilidade clínica do tratamento e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos.

A saúde é direito de todos e dever do Estado. Agora, sem nenhuma dúvida, o canabidiol é direito de todos que necessitem e, nessas condições, sempre dever do Estado de fornecê-lo.

Com base neste avanço travado nas barras dos tribunais deste assunto polêmico ao longo da história, mas com eficácia reconhecida pela Assembleia Legislativa de Alagoas e pelo Supremo Tribunal Federal, a nutricionista clínica Cybele Castro, pós-graduada em Cannabis Medicinal, disse, em entrevista à Tribuna, que está em Alagoas o melhor óleo à base do canabidiol do planeta. “Aqui em nosso Estado, temos o melhor óleo do mundo e se chama Alandiol”, garante a nutricionista.

Cybele atua em Alagoas como representante do médico Romeu Fadul Jr., do Hospital Sírio Libanês, prescritor e membro da academia inglesa de cannabis medicinal e diretor científico da Biocasebrasil, um dos mais conceituados laboratórios sobre o assunto no país.

Médico Romeu Fadul Jr., do Hospital Sírio Libanês, prescritor do canabidiol (Foto: Divulgação)

“O óleo é extraído da flor da maconha e ele retarda os efeitos das doenças degenerativas. Mas atenção: não é qualquer planta que vai amenizar os problemas”, alerta Cybele.

“Se a plantação não for orgânica e vegana e se o solo tiver contaminantes químicos e pesados de plantações anteriores, o extrato do óleo também vai estar contaminado. Logo, não fará os efeitos desejados”, completa a nutricionista ao revelar que o óleo pelo qual fornece aos pacientes em Alagoas é egresso do Canadá, certificado pela Anvisa.

“É comum a gente ouvir de pessoas coisas do tipo: ‘Eu vou tomar canabidiol e está tudo bem. Não é assim! Acontece que não é qualquer planta que vai dar essa qualidade de vida ao paciente”, explica.

De acordo com a nutricionista, para quem quiser se certificar de que está em Alagoas vindo diretamente do Canadá o canabidiol pode se informar melhor pela lista dos melhores óleos do mundo por meio do site: listaverde.com.br.

“O melhor óleo do mundo é de uma fazenda orgânica egressa do Canadá. As plantas fêmeas têm as melhores cepas e são justamente essas que chegaram a Alagoas”, informa Cybele.

Cybele Castro afirma ainda que os medicamentos tradicionais para os portadores de doenças degenerativas podem ser diminuídos em até 60%. “O paciente não vai deixar de fazer uso dos remédios tradicionais para tratar sua patologia, mas pode reduzir em até sessenta por cento com uso do óleo do canabidiol, mas todo esse processo sob supervisão do médico prescritor”, afirma.

Uso indiscriminado, restrições: polêmicas com conselho de medicina

Em 2020, a polêmica em torno do uso do canabidiol se potencializou depois que o Conselho Federal de Medicina publicou uma resolução que restringia a prescrição do óleo apenas a pacientes de dois tipos de epilepsia.

Mas um ano depois, o Conselho sentiu a pressão pública e revogou a resolução 2.324/2022 que restringia a indicação do uso medicinal do canabidiol (CBD). O CFM havia editado a norma e enfrentou fortes críticas de especialistas e parentes de pacientes que dependem do CBD.

Segundo a resolução revogada, o canabidiol só seria recomendado para tratar crianças e adolescentes que sofrem de epilepsia na Síndrome de Dravet, Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa, caracterizadas por intensas e numerosas crises diárias. Estava vedado aos médicos prescreverem a substância em outras situações, além de darem palestras e cursos sobre o canabidiol fora do ambiente científico.

(Foto: Reprodução)

Também ouvido pela Tribuna, o médico Romeu Fadul Jr., do Hospital Sírio Libanês, prescritor do canabidiol e que trabalha com a nutricionista Cybele Castro, minimiza a reação do Conselho Federal de Medicina. “É normal a resistência ao que é o novo, a novos conceitos, mas é preciso se abrir ao que as pesquisas estão trazendo através das evidências. Esse preconceito acontece por falta de informação ou por um certo conservadorismo e por falta de acesso à informação”, disse Romeu.

O Departamento de Fisiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) considera que há estudos científicos que comprovam o benefício do derivado da maconha para outras doenças além das epilepsias. No entanto, avalia que, desde 2019, quando a Anvisa aprovou a comercialização de produtos de cannabis no país, há um uso indiscriminado da substância.

A Universidade considera que se popularizou excessivamente esse uso. De acordo com a entidade, se tem conhecimento de indicações do canabidiol para os mais variados tipos de doenças, isso sem qualquer comprovação científica. Por isso a Universidade acredita que isso motivou o Conselho Federal de Medicina a restringir o canabidiol.

Polêmicas à parte, o fato é que, em dezembro de 2020, até a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu as propriedades terapêuticas da cannabis e a retirou da lista de substâncias perigosas como o crack, por exemplo.

Em Alagoas, a Lei é de autoria do deputado Lobão (MDB). A Tribuna tentou falar com o deputado, mas não conseguiu contato. A época da aprovação da Lei, no entanto, em entrevistas, ele justificou seu projeto. “Na realidade brasileira atual, pacientes para obter os benefícios incontestes do tratamento com o uso da cannabis medicinal precisam superar óbices quase instransponíveis, especialmente para as famílias de baixa renda, que necessitam comprar os medicamentos em farmácias, chegando a custar, em média, R$ 3 mil reais a caixa ou tem que recorrer à importação da medicação, mediante autorização da Anvisa, processo que envolve considerável tempo de espera e um custo igualmente elevado”, disse.

Além de tratar pessoas mais simples com um preço mais acessível, Lobão lembrou das possibilidades da criação de empregos com a fabricação desse medicamento em território alagoano. “Ao invés de importar do Canadá, EUA ou Israel, nós poderíamos fabricar, não só para nossa população, como também exportar para outros países”, afirmou.

“Canabidiol pode curar dependentes”

Pode parecer contraditório, mas uma pessoa dependente química não vai permanecer dependente e, muito pelo contrário, ela provavelmente vai se curar, se fizer uso do óleo. Pelo menos essa é a afirmação é da nutricionista ao se referir ao estigma que o assunto ainda causa em muitas pessoas.

"Se a plantação não for orgânica e vegana e se o solo tiver contaminantes químicos e pesados de plantações anteriores, o extrato do óleo da cannabis também vai estar contaminado", diz Cybele (Foto: Adailson Calheiros)

“Existe a possibilidade de o dependente tomar o canabidiol, sim, porque é diferente da maconha fumada na rua. O paciente de qualquer patologia degenerativa não vai apresentar efeitos psicoativos, a molécula é totalmente diferente da maconha fumada. A cannabis medicinal não vicia e não haverá vício de nenhuma natureza”, completa Cybele.

*** O canabidiol (CBD) é uma substância da planta cannabis, também conhecida como cânhamo indiano ou maconha, e representa cerca de 40% do extrato da planta. Apesar de conhecida há séculos, ganhou notoriedade nas últimas décadas por seu uso medicinal.


*** A saber, estudos clínicos com canabidiol (CBD) foram feitos relacionados à ansiedade, cognição, distúrbio do movimento e dores, pois atua no sistema nervoso central e tem um grande potencial terapêutico também para o tratamento de doenças psiquiátricas ou neurodegenerativas, como esclerose múltipla, esquizofrenia, mal de Parkinson e Alzheimer, epilepsia, etc.


*** Algumas doenças que podem ser tratadas com canabidiol:

Epilepsia, Ansiedade

Alzheimer, Enxaqueca

Hipertensão, Fibromialgia

Transtorno do espectro autista

Esquizofrenia, Mal de Parkinson


Enquanto escrevíamos esta reportagem, chegava uma nova informação publicada no dia 26 deste mês no Jornal O Globo de que um novo estudo que investigou a relação entre o consumo de cannabis e o desempenho sexual mostrou que os usuários relatam uma maior intensidade dos orgasmos sob o efeito da substância, além de libido aumentada e mais prazer durante a masturbação. O potencial pode facilitar a experiência de orgasmos múltiplos, uma vez que a ocorrência é “correlacionada com maior satisfação sexual”, escrevem os pesquisadores.

Conduzido por cientistas americanos, o trabalho, publicado na revista científica Journal of Cannabis Research, coletou dados de 811 participantes, entre 18 e 85 anos, utilizaram a substância ao menos uma vez. Não houve um padrão entre os participantes, explicam os responsáveis, com uma diversidade etária e de perfis.