Saúde
Pesquisadores estudam se há associação de larvicida com casos de microcefalia
Estudo da Ufal constata que larvicida causa impacto nos organismos aquáticos
No último ano foram vários casos de microcefalia registrados no país em crianças nascidas de mulheres acometidas pelo zika vírus, transmitido pelo mosquito aedes aegypti. Essa realidade chamou a atenção de pesquisadores do Laboratório de Aquicultura, do Centro de Ciências Agrárias (Ceca) e do Laboratório de Biotecnologia e Enzimologia, do Instituto de Química e Biotecnologia (IQB) da Universidade Federal de Alagoas. Eles começaram a desenvolver, em 2016, estudos para constatar o potencial toxicológico de larvicidas utilizados por órgãos sanitaristas contra o mosquito transmissor, verificando os seus impactos nos organismos aquáticos, consequentemente, à saúde humana.
A literatura médica diz que a microcefalia é uma condição neurológica rara em que a cabeça e o cérebro da criança são significativamente menores do que os de outras da mesma idade e sexo. A anomalia é normalmente diagnosticada no início da vida e é resultado do cérebro não crescer o suficiente durante a gestação ou após o nascimento.
Segundo um dos coordenadores da pesquisa, Emerson Soares, com o aumento de casos da doença, houve também uma intensificação do uso de larvicidas, principalmente o piriproxifeno, em ações do Ministério da Saúde (MS), normalmente colocados em cisternas para consumo humano e ambientes dotados de água parada, visando o controle e o combate às larvas. O professor explica que o larvicida é um análogo a um hormônio juvenil que atua na inibição da metamorfose e embriogênese do mosquito.
Equipe de pesquisadores (Foto: Ascom / Ufal)
Emerson enfatiza que se desconfiou, desde os primeiros casos de deformidades ocorridas em bebês, que os larvicidas poderiam causar deformidades ou bioacumular nos organismos e chegar ao homem via alimentação. “A partir dessa desconfiança foi iniciado o projeto Avaliação do potencial toxicológico de larvicidas utilizados contra o mosquito transmissor da dengue, zika vírus e chicungunya e seus impactos nos organismos aquáticos. O projeto tem como objetivo determinar a concentração letal do piriproxifeno; e avaliar a estrutura hepática e o comportamento de peixes submetidos a vários níveis do citado larvicida na água”, destaca o pesquisador, que é referência em estudos na área de aquicultura.
Ele aproveita para explicar de que forma o larvicida pode chegar aos ambientes com água represada, que é o utilizado para cultivos intensivos de peixes. “Os ecossistemas aquáticos sofrem diversos impactos principalmente pela ação antrópica (feita pelo homem). Larvicidas e herbicidas são carreados por meio do escoamento superficial e/ou uso direto dos biocidas na água (lavoura, por exemplo), e podem bioacumular no sistema hídrico e na biota aquática, ficando retido no corpo do animal e, portanto, chegando ao ser humano, quando se alimenta do peixe”, frisou.
Danos à saúde animal
Os resultados constatados nos estudos realizados com o peixe tilápia, espécie bastante comercializada e produzida no Brasil, apontam que é real a probabilidade do piriproxifeno causar danos à órgãos e tecidos. Nos estudos foi possível constatar que as doses usadas no combate às larvas do mosquito aedes aegypti, estão mais altas do recomendado para os peixes, provocando alta mortalidade. “Os peixes não resistem a certas concentrações que podem levar a diminuição de ingestão de alimento e a altos níveis de estresse no animal. Isso interfere em sua locomoção no ambiente, causando letargia”, afirma o pesquisador Emerson Soares.
Ele destaca que nas análises histopatológicas (tecido do fígado), a partir da concentração usual do larvicida, contatou-se que causam vários danos ao tecido hepático, hemorragias e processos inflamatórios no órgão. A enzima aceticolinesterase no cérebro dos organismos expostos ao piriproxifeno durante 96 horas mostrou alterações no tecido cerebral do peixe. E adianta:
“O piriproxeno para a tilápia é danoso e com o avanço das pesquisas realizadas pela equipe, pretende-se ver o quanto o larvicida pode ser prejudicial ou não ao desenvolvimento embrionário de organismos aquáticos. Ou seja, se causa alguns tipos de deformidade ou malformação (deformidade ou anomalia geralmente congênita)”, diz.
O estudo tem conclusão prevista para este ano e Emerson acrescenta que ao final dará respostas às várias hipóteses levantadas. “Se o mesmo dano constatado no peixe, devido ao uso do larvicida, pode comprometer à saúde humana, provocando alteração na fisiologia e deformidades no desenvolvimento embrionário, foco da pesquisa”, reforçou.
A pesquisa é financiada pelo Ministério da Saúde e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal), envolve os professores Elton Santos, do curso de Zootecnia e a professora Sônia Machado, do Instituto de Química e Biotecnologia, entre outros pesquisadores, e foi tema de dissertação de mestrado de Fábio Francisco da Silva, defendida no dia 26 de abril.
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