Roteiro cultural
Juiz alagoano Kleiton Ferreira lança livro nesta quinta (25)
Com mais de 1,4 M de seguidores na rede social, o juiz federal alagoano Kleiton Ferreira tem “chamado a atenção” pela forma menos burocrática e carinhosa que utiliza em suas audiências e nesta quinta-feira (25), celebrando o Dia Nacional do Escritor, ele lança o livro “A Espada da Justiça, com uma noite de autógrafos, a partir de 19h, no Maceió Shopping.
O alagoano Kleiton Ferreira conhece a Justiça no Brasil. Além de escritor, ele também é juiz federale já atuou como advogado por uma década. “Espada da Justiça” (160 pág.), seu primeiro romancepublicado pela Editora Labrador, começou a ser escrito há quase 10 anos, quando o autor era juizem Macaé. Natural de Arapiraca (AL), Kleiton já morou no Rio de Janeiro, Paraíba e Sergipe. Hojereside entre territórios: migrando entre sua terra natal e Propriá (SE), separadas por 70 km.
Ao apresentar um experiente juiz em crise de meia idade, afetado por problemas familiares — ahistória envolve o sofrimento de um pai ao ver a filha em um relacionamento abusivo — erelações acerca dos demais servidores, além de claro, as trivialidades do ofício, Kleiton discorre, demaneira sucinta e eficiente, sobre as pessoas que integram o sistema judiciário e as históriastestemunhadas nesse ambiente.Recorrer à justiça é um direito de todo e qualquer cidadão brasileiro, e como o livro aborda,medicamentos de alto custo são solicitados por via judicial quando as esferas administrativas nãosão capazes de atender. Um dos casos que inspiraram Kleiton foi o do “remédio mais caro domundo”, o Zolgensma, que hoje custa R$6 milhões, mas já chegou a custar R$12 milhões. Tambémestão presentes apelos à previdência social por pensões e aposentadorias.
História gira em torno do remorso e culpa de um pai perante uma relação abusiva da filhaO protagonista do livro é Abraão, que tem 25 anos de magistratura como juiz federal e é bemquisto pelos servidores no trabalho, além de reconhecido como um profissional justo ecompreensivo. Mesmo com a vida estável, esse homem começa a questionar sua condição de pai,marido e profissional quando Samanta, a filha adulta volta para casa tentando fugir do
comportamento violento do marido. A paternidade de Abraão é um dos temas centrais nessaficção jurídica. Com remorso pelas falhas e ausência ao longo da vida da filha, Abraão se culpapelos maus tratos que ela sofreu.
Em busca de entendimento e/ou qualquer desafogo, o personagem procura um psiquiatra, mas asconsultas parecem um beco sem saída. Uma reviravolta só acontece quando Fafá – Maria deFátima – uma amiga da época de escola da sua filha, se apresenta ao tribunal para fazer orequerimento de uma pensão. Maria de Fátima tem uma história marcada por injustiças etragédias que sensibiliza o juiz, passando a zelar pela mulher com um olhar paterno.
A leitura de “Espada da Justiça” conduz o leitor sob a locução da deusa Dice, filha Zeus e Têmis,personificação da justiça e responsável pela punição aos maus juízes. Kleiton desenha entrealgumas linhas os termos, hierarquias e ordens desenrolando o ‘juridiquês’. Faz isso sem apelarpara qualquer tom professoral que comprometa a narrativa. “O livro passou por modificaçõesseveras no que diz respeito ao estilo de escrita. Antes era algo mais carregado de jargões, apesarda tentativa de evitá-los. Depois percebi que o tema jurídico poderia ser abordado de forma maisacessível. Mudei tudo, e como venho sempre aprimorando a escrita para torná-la mais leve e fácil,assim fiz. Hoje minha preocupação hoje é simplicidade”, conta.
Kleiton sentiu a necessidade de tratar casos como o que Maria de Fátima leva até Abraão, queapesar de comuns no dia a dia de um magistrado, carregam certa complexidade e exigemdiferentes perspectivas para que sejam sentenciados da melhor forma. “Atualmente o INSS é umdos maiores ‘réus’ da Justiça Brasileira. A quantidade de ações que envolvem benefíciosprevidenciários é enorme. Se parte delas é julgada procedente, então há algo de errado”, aponta.Outras pessoas e situações são apresentadas ao longo dos atos que dividem “Espada da Justiça”,tratando de doenças e necessidades, fazendo com que o leitor reflita sobre a burocracia judicial eo papel do Estado em amparar e/ou avaliar esses casos. Kleiton também batiza o antagonista daobra com seu nome. Também juiz, este homônimo se mostra inflexível e severo. Uma intensacontrapartida ao pai de enorme coração, disposto a sempre escutar e acolher que é Abraão.Por mais que o entrecho jurídico seja o condutor do romance, o escritor nos convida a olharmosmais atentamente para a humanidade de seu protagonista. Para as dores que sente e como,mesmo em uma vida confortável, acabou por perder o controle, atormentado pela culpa daspermissões que custaram a integridade da filha.
Atualmente, Kleiton trabalha de forma paralela em outros projetos, e também atua comonarrador de audiolivros.
Leia um trecho de “Espada da Justiça”:
‘‘Durante anos e anos, o juiz ouviu centenas e centenas de mulheres chorarem a sua frente. Mães eesposas que perderam filhos e maridos, e ali, na sala da audiência, sob o frio de uma ar-condicionado a 18 graus celsius, sentadas de mãos cruzadas sobre a bolsa no regaço, elaschoravam. Choravam enquanto contavam sobre suas vidas, suas dificuldades e vivências com osmaridos mortos, os últimos momentos, ou as notícias da fatalidade. O pior sucedia com as mães defalecidos filhos, que se derramavam em prantos, encharcando rosto e corpo e mesa de audiência,tal qual a senhora mãe de Glauber. Elas falavam das ajudas em vida que recebiam dos filhos, queeram tudo para elas, Marias cujas crias vinham e iam antes da hora, para no fim tudo o que lhes restassem se resumir a saudade, solidão e dificuldades financeiras.
Naquele dia, Abraão chorou também. Dona Maria, mais uma mulher a pedir pensão, molhava acara escura e enrugada enquanto respondia às perguntas do procurador do INSS, um rapaz jovem
e bem-intencionado na sua missão, mas sem sensibilidade alguma’’
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