Política
Ato marca 50 anos sem Jayme Miranda
Família do advogado e jornalista desaparecido na ditadura militar continua unida e cobra desfecho da situação que causa sofrimento

Há 50 anos, a família de Jayme Miranda busca notícias. Desaparecido após ser preso pela ditadura militar em 1975, o advogado e jornalista alagoano é até hoje uma memória que traz dor e sofrimento, mas também motivação para luta, resistência cobrança do Estado. Na noite desta terça-feira (4), a família de Jayme e o Comitê Memória, Verdade e Justiça realiza na sede da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Alagoas (OAB/AL), um ato público em memória à data.
Para a família, é preciso um desfecho. A jornalista Olga Miranda, filha de Jayme, relata que mesmo com o passar do tempo, a esperança diminui e o sofrimento permanece.
“Para nós familiares, essa é uma dor muito profunda, é um sofrimento que a gente não consegue externar e que eu não desejo para ninguém. É você ter um ente querido que você não tem notícia do que aconteceu com ele, então você fica sempre naquela expectativa de um dia poder saber ou reencontrar a pessoa ou sem memória ou com um problema de ordem motora que não pode ser movida ou que está em um país com medo de voltar. A gente sempre fica conjecturando situações. Evidentemente, com 50 anos e diante das revelações do livro ‘Cachorros’, a gente não tem mais dúvida de que ele foi assassinado sob tortura nos porões do DOPS. Não temos mais dúvida disso, e a gente fica muito triste porque o Estado brasileiro não assume isso. Ele indeniza, nós recebemos indenização financeira, mas ele não assume abertamente, não nos proporciona acesso ao arquivo do DOPS”, recorda Olga Miranda, em contato com a reportagem da Tribuna Independente.
O caminho escolhido foi de não deixar esquecer. “A cada decênio a gente faz um ato, porque é um ato político, e para chamamento da atenção da sociedade do governo para o problema dos desaparecidos políticos. Para que a gente possa ter reveladas as circunstâncias e a autoria desses crimes, que são crimes bárbaros”.
Olga esclarece, também, que a família entende que essa é uma questão maior, coletiva, e reconhece o papel do filme “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles.
“A gente luta também pela questão de não existência mais de tortura. Mas, a gente sabe que o Brasil instituiu tortura sistematizado e até é, exportou para outros países. Então, diante do filme Ainda Estou Aqui, a repercussão em relação à ditadura militar ganhou uma amplitude internacional. É muito importante para nós, familiares de mortos e desaparecidos políticos, essa repercussão, porque o nosso país, ele não tem a cultura de revelar a história. Ele faz de conta que nunca teve ditadura, que nós somos o melhor país do mundo. Então, a gente vê a oportunidade de descortinar a realidade e o sofrimento por qual todos nós passamos”, ressalta.
A família se identificou com o roteiro apresentado. “São 50 anos de busca por notícias oficiais do Jayme Miranda e demais companheiros dele. E a gente vê retratada a situação do Rubens Paiva, que foi bem semelhante a dele, porque ele morava também no Rio de Janeiro, ele foi um desaparecido político e, também foi negado a hipótese que ele tinha sido preso. E a família até hoje, apesar de toda a repercussão do filme, também não tem notícias sobre o paradeiro e o que aconteceu com o Rubens Paiva. Precisou que jornalistas investigativos, como Marcelo Godoy, conseguissem revelações de ex-torturadores para que a gente pudesse ter uma ideia do que teria acontecido com os presos políticos. Então, a gente tem, a gente sabe, mas não é uma situação oficial”.
Família busca esclarecimento e vai pedir retificação do atestado de óbito
Em dezembro de 2024, foi aprovada uma resolução no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinando que as certidões de óbito das pessoas mortas e desaparecidas durante a repressão política registrem como causa da morte: “morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964.” A família de Jayme ainda não solicitou a alteração.
“A gente ainda não fez a mudança porque nós estamos aguardando a realização de um ato político voltado para essa questão. Então, a gente vai fazer a retificação do atestado de óbito, nós temos um atestado de óbito, mas a gente vai adequar ao que foi é conseguido”, explica Olga Miranda à Tribuna Independente.
Para a filha de Jayme Miranda, essa é uma grande conquista. “As famílias buscam pela verdade, que é um direito humano, é internacional essa busca da verdade. Então a certidão expõe abertamente que a causa mortis, que antes a causa morte era, ele botava o número da lei, só. Agora não, agora a Certidão vem dizendo o que foi que aconteceu. Então, é o um reconhecimento efetivo do Estado de que o meu pai morreu nessa situação de tortura nas mãos dos governantes. É importante, a gente lutou muito por isso.
É uma reparação, e a gente continua querendo mais reparação, que não haja mais tortura em relação a todas as pessoas, que não haja desaparecimento, que sejam construídos memoriais contando a história real, que seja contabilizado outras pessoas que morreram nessa mesma situação que ainda não foram catalogadas na Comissão da Verdade Nacional”.
Comitê da Verdade atua para preservar memória de desaparecidos
O historiador Geraldo Majella, membro do Comitê Memória, Verdade e Justiça, ressalta que o ato é mais uma cobrança.
“O ato tem um caráter político e diz que há 50 anos a família cobra do Estado brasileiro, o aparecimento do corpo do jornalista”. Terá apoio e participação de muitas autoridades. “Tanto OAB quanto Sindicato dos Jornalistas estão apoiando. E já tem confirmadas as representações parlamentares do deputado Ronaldo Medeiros (PT) e da vereadora Teca Nelma (PT). Também confirmaram o presidente da OAB, Vagner Paes, e o presidente do Sindjornal, Alexandre Lino”.
O Comitê planeja uma programação mensal até o dia do aniversário do golpe militar, que ocorreu em 1964.
“Temos trabalhado para preservar a memória dos desaparecidos, e pelo fortalecimento da democracia brasileira, e agora, além do ato de 50 anos do desaparecimento do Jayme, vamos ter em fevereiro e março outras atividades rememorando fatos importantes e se preparando para o 1º de abril, que é o dia que vamos ter manifestações rememorando o dia do golpe. Que nunca mais se esqueça para que nunca mais se repita”, reforçou Majella.
Com a grande repercussão mundial do filme brasileiro “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, sobre o desaparecimento de Rubens Paiva na ditadura militar, Majella avalia que a luta se fortaleceu.
“Nesse momento de impacto da sociedade brasileira, que sobretudo ganhou uma dimensão muito grande com o filme, todos os desaparecidos políticos brasileiros e, se você levar isso até mundialmente, estão representados nesse filme na memória do Rubens Paiva. Cada uma das pessoas pode ser chamada de Rubens Paiva, de Jayme Miranda, de Luiz Almeida Araújo, todos esses foram vítimas da ditadura e estão desaparecidos. Então tem esse caráter político e de celebrar a memória desse brasileiro que é o Jayme Miranda”.
Além de Jayme, há outros dois alagoanos desaparecidos por conta de ditaduras, de acordo com a pesquisa do historiador. Um deles é Luiz Almeida Araújo, nascido em Anadia e preso pela ditadura militar, e Tulio Quintiliano Cardoso, engenheiro de Maceió, mas esse último foi preso no Chile, durante o golpe contra Salvador Allende, e despareceu no estádio nacional de Santiago.
Além de muitos mortos que já tiveram seus corpos identificados e devolvidos para as famílias, como foi o caso de Manoel Lisboa que teve os restos mortais exumados em 1991, quando da exumação dos restos mortais de Emmanuel Bezerra dos Santos, sendo trasladados para Maceió em 6 maio de 2003, após intervenção da Comissão de Familiares e Mortos e Desaparecidos Políticos e ato público celebrado na Prefeitura de São Paulo.
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