Política

Presidente da CPI da Braskem, Omar Aziz promete buscar Justiça para as vítimas de Maceió

'Iremos a fundo nessa investigação, pois somos todos sensíveis a essa causa. Essa situação não foi fruto de uma ação natural', afirmou o senador nesta terça-feira

Por Aline Guedes / Agência Senado 09/04/2024 18h04 - Atualizado em 10/04/2024 00h54
Presidente da CPI da Braskem, Omar Aziz promete buscar Justiça para as vítimas de Maceió
O senador Omar Aziz é presidente da CPI da Braskem - Foto: Edilson Rodrigues / Agência Senado

Representantes de associações de vítimas do desastre ambiental que provocou o afundamento do solo em 15 bairros de Maceió pediram nesta terça-feira (9) que o mapeamento dos danos seja feito pelas autoridades constituídas. Aos senadores da CPI da Braskem, o presidente da Associação dos Empreendedores e Vítimas da Mineração em Maceió, Alexandre Sampaio, e o coordenador-geral do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem, Cássio de Araújo Silva, afirmaram que o diagnóstico ambiental foi feito pelas empresas Tetra Tech e Diagonal, ligadas à mineradora.

A CPI investiga os efeitos da responsabilidade jurídica socioambiental da empresa Braskem S.A. Um dos principais objetivos é assegurar a justa reparação aos afetados pelos danos ambientais iniciados em 2018, causados pela exploração do mineral sal-gema pela petroquímica. A comissão tem como presidente o senador Omar Aziz (PSD-AM), que conduziu os trabalhos desta terça-feira, e como relator o senador Rogério Carvalho (PT-SE). 

— Iremos a fundo nessa investigação, pois somos todos sensíveis a essa causa. Essa situação não foi fruto de uma ação natural. Está comprovado tecnicamente que houve, sim, influência na prospecção das minas, no momento da extração das gemas. É algo que abala muito toda a sociedade, e a gente vai fazer o máximo para obter justiça — declarou Aziz.

Autorregulação

Rogério Carvalho criticou a autorregulação do setor da mineração no Brasil. A autorregulação é um conjunto de procedimentos e normas aprovadas e aplicadas pelas próprias empresas e funciona de forma complementar à regulação tradicional. Para o senador, a Braskem atuou para "domesticar" a sociedade por meio da maquiagem de dados.

— Estou muito indignado neste momento. Este é um setor que se autorregula; é o retrato da autorregulação de uma área econômica. Ou seja, é quando uma empresa manda dados forjados, ou pela metade, para institutos de renome que, obviamente, vão produzir relatório seletivo, parcial, onde a verdade não será demonstrada. Estamos saindo do campo administrativo para o campo criminal. De quem é a responsabilidade? Quem patrocinou? É grave, é gravíssimo — protestou o relator da CPI.

Carvalho quis saber o número de pessoas atingidas pelo crime ambiental causado pela Braskem. E se todas as associações de bairros da cidade teriam se tornado uma organização unificada em favor das vítimas. O relator perguntou também se os moradores eram conscientes do funcionamento da mineradora antes do afundamento do solo e se havia campanhas promovidas pela Braskem sobre ameaças resultantes da atuação da empresa.

— Teremos oportunidade de estar com a Braskem amanhã [na CPI], e vamos deixar alguns questionamentos para ela. Mas em que momento os moradores, os donos de imóveis foram informados de que teriam de abandonar o lugar? E por quem? A CPI não tem poder judicial, mas tem de investigação inicial e nós vamos dar luz a tudo isso.

O senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL) elogiou a atuação de Rogério Carvalho. Ele pontuou que a CPI acertou ao ouvir nesta terça-feira os representantes dos moradores de Maceió, “que têm conhecimento de causa para falar por terem sido diretamente atingidos pelo problema”.

— Estamos de fato nos sentindo numa boa condução dos trabalhos por esta CPI. Trata-se de uma atuação séria, e função nossa: de fiscalização para encontrarmos respostas para muitas perguntas — disse o parlamentar.

Conhecimento

Cássio de Araújo Silva declarou que a maioria dos habitantes tinha ciência da petroquímica, mas não sabia dos eventuais efeitos adversos. E que a Braskem nunca alertou a população sobre a possibilidade de incidentes. O depoente afirmou que antes do afundamento da região cada bairro de Maceió tinha sua associação de moradores. Mas disse que essas entidades não conseguiram apresentar esses dados, “o que tem dificultado muito a vida dos atingidos pelo afundamento da mina”.

Ex-morador do bairro afetado pela mineração da Braskem, onde também tinha negócios empresariais, Alexandre Sampaio disse que, inicialmente, a população tinha tomado conhecimento dos fatos por meio de uma entrevista concedida pelo senador Rodrigo Cunha a uma emissora de rádio local. O depoente ressaltou, no entanto, que logo em seguida o Ministério Público Federal (MPF) decretou segredo de justiça para o caso, que durou de março de 2018 a meados de dezembro daquele ano. Alexandre lembrou que após um vazamento dessa informação, um movimento foi iniciado em meados de fevereiro de 2019 pela própria Braskem “para desacreditar o serviço geológico”.

— Só em maio de 2019, houve a apresentação de um relatório da CPRM [Serviço Geológico do Brasil] de que havia uma relação clara das rachaduras [dos imóveis] com a atividade da mineradora.

Prejuízos

Cássio apontou uma omissão do poder público em relação aos afetados pelo afundamento do solo em Maceió, desde a necessidade de informar sobre os riscos da mineração no lugar ao acompanhamento, à assistência e ao cumprimento dos acordos de indenização junto às vítimas. O depoente questionou a transferência de propriedade do território afundado para a Braskem. Ele também contestou a limitação da responsabilização da Braskem ao problema geológico, pelo poder público, sem se considerar outros efeitos do afundamento do território. O debatedor lembrou que foram perdidos, entre outros, açougues, escolas e postos de saúde, num prejuízo sem precedentes à população. 

— As questões não param por aqui. A prefeitura, por exemplo, fez um acordo com a Braskem que não teve a transparência necessária sobre valores estabelecidos, tendo em vista os enormes prejuízos às pessoas do ponto de vista da educação, da saúde e da mobilidade. Vejam o tamanho da questão que enfrentamos, até hoje sem a devida discussão e não da forma adequada [...] Não podemos permitir que essa agressão continue. Aceitar é decretar a falência moral, política e jurídica deste país. Se nos contentarmos com algo assim, que nação iremos ter para nossos netos, bisnetos, para o nosso futuro?

Ao classificar como importante o funcionamento da CPI da Braskem, Cássio disse esperar pelos resultados do colegiado com “apreensão, angústia, opressão e sentimento de retirada violenta de mínimos direitos”. 

— Que esta comissão consiga apontar os responsáveis não só pelo afundamento do solo, mas também pelo afundamento das vidas das pessoas atingidas. São duas questões relacionadas, mas diferentes. Um é um problema físico, geológico; outro é um problema social, humano, que atinge não só os diretamente afetados, mas todo a o tecido social da cidade de Maceió e do Estado de Alagoas. A realidade é muito mais eloquente do que nossas palavras podem traduzir. 

Alexandre Sampaio pediu que os acordos já efetivados com a Braskem com base em relatórios feitos pela Tetra Tech e a Diagonal sejam anulados, “por eles não considerarem sequer metade do número de vítimas afetadas”. 

— É a raposa cuidando do galinheiro. Não é aceitável que essas empresas investiguem e façam o diagnóstico de um problema que a própria Braskem causou. É como se os ministérios públicos permitissem que o diagnóstico da doença provocada pelo crime da Braskem fosse feito sem nenhum exame ou pelo “médico que cometeu ou pelo assassino que feriu a vítima”. Todos esses acordos precisam ser revistos à luz da Constituição, à luz do direito das vítimas. Que o dano moral e que o dano material obedeçam a critérios justos. Que o Estado pague alguém que não esteja ligado à Braskem para mapear os verdadeiros danos, porque até hoje houve uma maquiagem deles — ponderou. 

Procuradoria-Geral

A CPI também ouviu o ex-procurador-geral de Alagoas Francisco Malaquias de Almeida Júnior, que ocupou o cargo entre 2015 e 2022. Rogério Carvalho argumentou que a oitiva teve como foco buscar informações sobre eventual pagamento de indenização pela Braskem junto ao governo daquele estado e eventual compensação de perda de patrimônio causada pela atuação da petroquímica.

Participante da CPI na condição de convidado, Francisco Malaquias disse que a procuradoria atuou no caso da Braskem em 2019, mas observou que o órgão não tem autonomia de atuação. Francisco frisou que em agosto de 2019 chegou a criar uma comissão da procuradoria para acompanhar as ações judiciais envolvendo a Braskem. Segundo o depoente, um levantamento dos danos realizado pelo Estado confirmou a necessidade de pedido de indenização junto à mineradora. O resultado dessa ação, conforme os ex-procurador-geral, somente saiu no final de 2023, depois que ele já estava fora da função.

Rogério Carvalho quis saber por que somente em 2023 houve desdobramentos da ação judicial e ponderou se não se tratou de uma possível omissão do governo de Alagoas. O relator considerou curioso o fato de os estudos conclusivos sobre as perdas de arrecadação por aquele estado em virtude da atuação da mineradora terem surgido num tempo aproximado da instalação da CPI da Braskem pelo Senado.

— É preciso que a gente avalie as condições e as formas como foram feitos esses pagamentos, a natureza deles, e a “marotice advocatícia” para se  encontrar o jeito de fazer sem abrir espaço para a imputação de responsabilidades sobre os danos ambientais, sociais, econômicos e de saúde sobre a população de Maceió — disse o relator.

Ao declarar que essas questões não foram levantadas antes de 2023, o ex-procurador-geral de Alagoas justificou que todo o processo se deu a passos lentos, onde “o estado não tinha muito o que fazer”.

— São objetos de ações do Ministério Público Federal. Posteriormente, associações devem ter ido se rebelando contra essas decisões [judiciais] e deve ter sido isso que levou a um desdobramento somente em 2023, mas não tenho os elementos necessários para me aprofundar no assunto — argumentou Francisco Malaquias.

Requerimentos

Nesta terça-feira, a CPI da Braskem aprovou requerimentos de informação, ambos propostos pelo senador Omar Aziz. O parlamentar pede que o prefeito de Maceió, Henrique Caldas, e o governador de Alagoas, Paulo Dantas, prestem esclarecimentos sobre royalties e outras receitas provenientes da exploração do sal-gema desde 1976, quando a Braskem iniciou a exploração do minério na região. 

Em áudio, vítimas da Braskem questionam papel do poder público nos acordos, escute:

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