Política

Preocupação com IA ganha força na eleição municipal

Recurso é alvo de resoluções do Tribunal Superior Eleitoral, porém é necessária a sua regulação via Congresso Nacional

Por Emanuelle Vanderlei - colaboradora / Tribuna Independente 16/02/2024 10h41
Preocupação com IA ganha força na eleição municipal
Advogado Gustavo Ferreira explica sobre a necessidade de o Congresso Nacional tratar sobre o tema - Foto: Adailson Calheiros / Arquivo

Desde o ano passado, tem sido declarada a intenção de alguns setores do Congresso Nacional em regular o uso da inteligência artificial (IA), de preferência a tempo de isso ser implantado nas eleições deste ano. Em janeiro deste ano, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), fez algumas declarações e mencionou um projeto de própria autoria que pretende aprovar até abril de 2024 para regular e impor limites ao uso da tecnologia. “Não só para as eleições, que se avizinham, municipais e as outras eleições, mas para nossa convivência entre homens e mulheres, e instituições”.

Essa parece ser uma possibilidade muito remota. Para o advogado eleitoral Gustavo Ferreira, não há tempo para cumprir os prazos previstos na lei.

“Qualquer alteração na legislação eleitoral que afete diretamente o processo eleitoral, ela só vale após um ano. Então, aí o que vai se discutir é isso. Eu acho que tudo interfere no processo eleitoral, mas pode ser que, por exemplo, uma mudança na propaganda possa se aplicar na eleição deste ano. Mas se não se conseguiu aprovar as mudanças legislativas o ano passado para esse ano, imagina você fazer uma alteração muito grande na questão de propaganda de espaço no próprio ano eleitoral”, argumenta Ferreira ao ser entrevistado pela reportagem da Tribuna Independente.

Para Gustavo, essa pauta precisa ser levada à sociedade e discutida antes de sua aprovação. “A discussão sobre o uso da internet foi muito mal conduzida, com todo respeito, no primeiro semestre do ano passado. E aí eu vejo que ele [projeto de lei] vai ficar travado, e esse ano ele não passa. Claro, se o Congresso sentar, as lideranças falarem ‘a gente quer passar’ se resolve. A questão que eu acho é que não se quer nesse momento, porque não se tem uma linha mínima de consenso de entendimento”.

Utilizando exemplos de eleições recentes em outros países que ganharam repercussão mundial, ele mostra como isso já é uma realidade que tende a influenciar os eleitores.

“A gente já teve na eleição da Argentina do ano passado o uso de deep fake bastante pesadas. O candidato que perdeu, Roberto Fernandes, aparecendo consumindo drogas, e não era ele. E o que ganhou, o [Javier] Milei, aparecendo comemorando com a Margareth Thatcher a derrota da Argentina na guerra das Malvinas. E o Milei nunca encontrou com a Margareth Thatcher. É uma loucura. Você teve uma agora nos Estados Unidos da primária do Partido Democrata, o [Joe, presidente] Biden pedindo para as pessoas não irem votar nas primárias”.

O avanço da tecnologia faz com que cada vez mais fique difícil para o eleitor identificar quando se trata de realidade ou manipulação. “A deep web não chegou ainda pelo menos a ter uma grande influência, mas influência teve. Essas mensagens, mais duras e evidentemente fraudulentas, elas acabam repercutindo naqueles grupos que acreditam em qualquer coisa. Só que, por exemplo, essa do Biden, ela é muito sutil. Ela é um pedido para não comparecer nas primárias. A finalidade, já que lá voto nenhum nas eleições é obrigatório, foi mostrar um baixo interesse, e aí mostraria uma baixa influência política. Foi identificado, foi alertado e conseguiu-se combater, mas é perigoso”.

Legislação é defasada e precisa de atualizações

Apesar de não ter sido feita ainda a reforma eleitoral que regulariza isso, Gustavo Ferreira explica que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vem se preocupando com isso há alguns pleitos. Há resoluções que regulam alguns pontos não previstos na lei.

“Na verdade, a legislação está defasada, mas como o TSE tem autonomia para regular as eleições, as resoluções para as eleições desse ano, que ainda vão sofrer alterações, já começam a tratar dessa questão. Inclusive o TSE já botou como meta principal combater a desinformação, seja pela deep web seja pelo uso de dados de aplicativo, seja pela retirada de mensagem. É ponto de honra do TSE, já tem sido desde 2020 e a cada ano que passa vem se aprofundando, tentando ao máximo combater esses comportamentos”.

Mas até para alterar as resoluções, há um limite de prazo. “Na própria legislação, elas podem sofrer alteração até o dia 5 de março do ano eleitoral”. Esse ano ele percebe grandes avanços na questão do uso do ChatGPT e da deep web e melhorar o relacionamento, que isso assim melhorou de fato nos últimos anos, com as grandes empresas, as grandes plataformas. Essa é uma novidade prática, porque muitas vezes você conseguia ter uma decisão favorável, mas não conseguiu que ela fosse efetivada”.

Em 2022, houve um embate entre a Supremo Tribunal Federal (STF) e a plataforma Telegram, que se recusou a cumprir uma decisão judicial. Na época, o aplicativo foi suspenso no país. Isso esse ano não deve ser problema como lembra Gustavo Ferreira, “a atual representação do Telegram disse que vai cumprir todas as determinações. Inclusive as plataformas participaram das audiências públicas fazendo propostas”.

A reportagem da Tribuna Independente também tentou repercutir o debate sobre a inteligência artificial nas eleições com desembargadores do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE/AL), mas não houve êxito até o fechamento desta edição.