Política

Lei de Leonardo Dias que dificulta acesso ao aborto legal é considerada inconstitucional

Por decisão do desembargador Fábio Ferrario, foi determinada a suspensão da lei municipal

Por Thayanne Magalhães / Tribuna Independente com Assessorias 20/01/2024 08h05 - Atualizado em 20/01/2024 10h54
Lei de Leonardo Dias que dificulta acesso ao aborto legal é considerada inconstitucional
Vereador Leonardo Dias propôs a lei, que foi aprovada pela Câmara, posteriormente promulgada - Foto: Assessoria

A Justiça de Alagoas determinou a imediata suspensão dos efeitos da Lei Municipal nº 7.492, de 19 de dezembro de 2023, de Maceió. A Ação Direta de Inconstitucionalidade Estadual, com pedido liminar, foi ajuizada pela Defensoria Pública de Alagoas, sob a alegação de vício formal e material.

Proposto pelo vereador Leonardo Dias (PL), o texto foi promulgado pela Câmara Municipal de Maceió. A lei determinava que, ao realizar aborto legal na rede pública do município, as mulheres teriam que assistir a vídeos e visualizar imagens com fetos. Segundo o texto, durante os encontros com as gestantes e familiares, uma equipe multidisciplinar deverá apresentar os possíveis efeitos colaterais físicos e psíquicos decorrentes do procedimento, como “pesadelos”, “depressão” e “remorso” relacionados à decisão.

Ainda de acordo com a lei proposta por Leonardo Dias, as equipes de saúde poderiam abordar, nas conversas com as mulheres, a opção de levarem adiante a gravidez e deixarem as crianças para a adoção.

A decisão da suspensão da lei é do desembargador Fábio Ferrario, relator do processo, que destaca a demonstração da probabilidade do direito, ante a inconstitucionalidade formal e material da referida norma.

O relator determinou ainda que a decisão seja apreciada pelo Pleno do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL), na próxima pauta do órgão colegiado.

A suspensão da lei foi solicitada pelo defensor público-geral, Carlos Eduardo de Paula Monteiro, por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), protocolada na última semana. Na petição, a Defensoria Pública demonstrou que a referida legislação possuía vícios legais formais e materiais.

Conforme a petição, a lei violou a Constituição Estadual, que estabelece que o município deve se organizar atendendo aos princípios da Constituição Federal. Além disso, a lei municipal tentava legislar sobre matérias que não são de interesse exclusivamente local, conforme determina a Constituição Estadual, mas sim de efeito geral, ultrapassando, dessa forma, os limites de sua competência.

Para o defensor público-geral, a inconstitucionalidade material da lei também pode ser constatada pelo desrespeito aos princípios constitucionais federais e estaduais relacionados ao bem-estar social, ao direito à saúde e à dignidade das mulheres, que, em situação de extrema vulnerabilidade psicológica, serão revitimizadas nos casos em que foram estupradas ou, ainda, em que se encontram em risco de vida.

A LEI

A lei dispõe que “os estabelecimentos da rede municipal de saúde ficam obrigados a orientar e esclarecer às gestantes sobre os riscos e as consequências do abortamento nos casos permitidos pela lei, quando estas optarem pelo procedimento na rede pública”.

Nos autos do processo, o desembargador relator destaca que a referida legislação desconsidera o estado de vulnerabilidade da mulher que tem direito ao aborto legal.

“A Lei Municipal nº 7.492/2023 desconsidera completamente a situação de fragilidade e vulnerabilidade em que se encontra uma mulher que está prestes a realizar um aborto. A decisão por realizar este ato, sem sombra de dúvidas, não é fácil, assim como é extremamente delicada a conjuntura vivenciada pela mulher que a permitem abortar de forma legal.”

O relator destaca ainda a necessidade de aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero lançado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “No referido protocolo, são apresentados conceitos e orientações para que o Poder Judiciário não seja mais uma instituição a reforçar desigualdades estruturais e históricas contra a mulher.”

O desembargador enfatiza ainda que a lei desrespeita o princípio da dignidade da pessoa humana e do direito à saúde. “Ao invés de serem acolhidas, por imperativo do princípio da dignidade da pessoa humana e do direito à saúde, por melhor que tenha sido a intenção legislativa, termino que, em verdade, ressuscita uma culpabilização perpetrada contra essas mulheres que optaram por interromper a vida intrauterina, em decorrência de uma dolorosa e inesperada circunstância.”

A decisão determina que a Câmara de Vereadores da Capital e o Município de Maceió prestem informações acerca da lei impugnada, no prazo de 30 dias.