Política

Exclusivo: mandato de Luciano Barbosa na mira da CPI do Lixo

Prefeito é suspeito de irregularidades nos contratos com empresas de coleta de lixo, que recebem, por ano, cerca de R$ 14 milhões da Prefeitura de Arapiraca

Por Ricardo Rodrigues / Especial para a Tribuna Independente 07/01/2023 08h00
Exclusivo: mandato de Luciano Barbosa na mira da CPI do Lixo
Instaurada pela Câmara de Vereadores de Arapiraca, CPI do Lixo investiga irregularidades no serviço - Foto: Edilson Omena

Quanto mais mexe, mais fede. Assim ocorre com a CPI do Lixo de Arapiraca. Quanto mais os vereadores da oposição aprofundam as investigações, por meio da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), mais encontram indícios de irregularidades e corrupção, na dispensa de licitação dos contratos de prestação de serviço para o recolhimento do lixo da cidade de Arapiraca, que custa aos cofres públicos, por ano, cerca de R$ 14 milhões.

“Não acredito que o prefeito Luciano Barbosa esteja envolvido nesse esquema, até porque já encontramos erros infantis que dificilmente seriam cometidos por ele, mas como a denúncia foi feita com muita substância, com argumentos muito bem fundamentados, não tinha como deixar de investigar”, afirmou o presidente da CPI do Lixo, vereador José Carlos Barbosa Júnior, mais conhecido por Zé Carlinhos (PSC).

Segundo ele, as irregularidades nos processos licitatórios para a contratação do serviço de coleta de lixo e tratamento de resíduos sólidos, nesta e nas outras gestões do prefeito Luciano Barbosa (MDB), já eram objeto de investigação pelo Ministério Público Estadual. “Só decidimos propor a CPI, que foi aprovada pela maioria dos vereadores, já tínhamos conhecimento dessas irregularidades e a prefeitura vinha se negando a prestar os esclarecimentos necessários sobre a dispensa de licitação”, justificou.

Vereador Zé Carlinhos: “não tinha como deixar de investigar” (Foto: Edilson Omena)


Além de Zé Carlinhos, fazem parte da CPI do Lixo quatro vereadores: Fábio Rogério Pereira Chaves (relator), Marcus Fabiano Matos Barbosa, Sérgio Fábio Nunes e Túlio Sampaio Freire. A Comissão tem até o dia 14 de março para elaboração do relatório final a ser apresentado no plenário da Câmara. Caso o relatório seja aprovado, o prefeito Luciano Barbosa pode ser afastado para responder por crime de improbidade administrativa. Em seguida, o caso segue para o Ministério Público, que pode oferecer ou não denúncia contra o gestor.

Questionado se a CPI tem poderes par cassar o mandato do prefeito, Zé Carlinhos disse que vai depender das investigações. “Se as denúncias forem comprovadas e o envolvimento dele estiver configurado, no mínimo, ele é afastado do cargo, até para se defender. Caso a defesa não seja convincente, o Ministério Público pode pedir o indiciamento dele, com implicações que vão desde o pagamento de multa, ressarcimento dos valores supostamente desviados, até a cassação do mandato e a perda dos direitos políticos, por conta da ficha suja”, explicou o presidente da CPI.

Zé Carlinhos disse ainda que fazia parte da base do governo Luciano na Câmara, mas passou para a oposição porque começaram a pipocar denúncias contra o prefeito e ele não dava as explicações necessárias. “Não tinha como eu fechar os olhos diante de tantas reclamações e descasos”, lamentou o vereador. Segundo ele, com relação ao esquema do lixo, as denúncias mais fundamentadas foram feitas pelo advogado José Fábio Barbosa (JFB), com apoio da Rádio Coração do Agreste, tendo à frente o radialista Genildo ‘Chave Codificada’.

METRALHADORA GIRATÓRIA

“Onde você investigar, você encontra irregularidade na gestão desse prefeito”, afirmou Genildo Joaquim dos Santos, que recebeu a nossa equipe de reportagem nos estúdios da rádio, instalada no porão da sua loja de produção de chaves codificadas, localizada no Centro de Arapiraca. Quando começou a falar, sobre “os esquemas de corrupção” nas gestões do prefeito Luciano Barbosa, o radialista pernambucano, nascido em Belo Jardim, parecia uma metralhadora giratória.

“Se você pega o pagamento dos precatórios da Educação, tem esquema; se for investigar os gastos com obras de saneamento da cidade, tem desvio de dinheiro; se for apurar como seu deu a licitação do lixo, tem irregularidade; se for verificar as doações de terrenos público, tem corrupção; tem corrupção até na liberação de R$ 300 mil de uma ONG fantasma, cujo endereço era de uma padaria, instalada em outro município, vizinho a Arapiraca”, dispara Genildo.

“Onde você investigar, você encontra irregularidade na gestão desse prefeito”, afirmou Genildo (Foto: Edilson Omena)


“Arapiraca já fez muitos gestores ficarem ricos às custas do patrimônio público, mas como este ditador que comanda com mão de ferro a prefeitura de Arapiraca, eu duvido”, acrescenta o radialista. “Como um prefeito, formado em Engenharia, doa um terreno público, de 30 mil metros quadrados, para fazer a sede de uma faculdade (a Uneal) – tanta burocracia; e dois anos depois, vendem o terreno com a maior facilidade, ao arrepio da lei?”, questiona Genildo, que comanda um grupo “A força do povo”, nas mídias sociais.

Ele diz que a venda desse terreno é um escândalo. “Um patrimônio público perdido para encher os cofres de algumas pessoas, os responsáveis que receberam o terreno, será que foram usados como laranja?”, pergunta. E acrescenta: “Como a Prefeitura de Arapiraca ou seus funcionários aceitaram a transferência da área para particulares com tanta facilidade, quando tomo mundo sabe que é a maior dificuldade transferir qualquer imóvel de nome em Arapiraca?”.

Ficou a pergunta no ar. O prefeito Luciano Barbosa foi procurado para se defender ou se explicar, mas desdenhou das denúncias e não atendeu aos nossos pedidos de entrevista, por meio da sua assessoria. Aliás, ao ser contatada e tomar conhecimento do assunto em pauta, a assessora do prefeito saiu-se com essa: “Não estamos com nenhuma informação oficial acerca da CPI. Não chegou nada”. Mentira. A Procuradoria Geral do Município já havia tomado conhecimento da CPI e respondido aos ofícios da Comissão, sobre os secretários municipais acusados de participação no esquema.

OITIVA DE TESTENHUMAS

Instalada no dia 20 de dezembro de 2022 pela Câmara Municipal de Arapiraca e composta por cinco vereadores, a CPI do Lixo começa a ouvir as primeiras testemunhas, a partir da próxima terça-feira. Entre os convocados está a vice-prefeita do município, Rutineide Pereira. Segundo o presidente da CPI, vereador José Carlinhos, o depoimento da vice-prefeita foi colocado em pauta porque ela assumiu uma secretaria municipal, durante uma das gestões de Luciano, que teve participação no processo de escolha das empresas implicadas.

O presidente da CPI disse ainda que serão ouvidos também Roany Izidoro Soares Alves, secretário municipal de Infraestutura; Maria Ariluce de Cerqueira, secretária municipal de Gestão Pública; Maria Caroline Souza Valeriano, secretária municipal de Serviços Públicos; e Lourinaldo José dos Santos, secretário municipal de Finanças. A notificação deles foi confirmada pelo procurador-geral do município, Victor Fernandes dos Anjos Carvalho, em ofício encaminhado à presidência da CPI do Lixo.

O presidente da Câmara Municipal de Arapiraca, vereador Thiago ML (PSDB), espera que a CPI do Lixo investigue com isenção e firmeza as denúncias recebidas pelo legislativo municipal, envolvendo a contratação de pelo menos três empresas coletora de resíduos sólidos sob suspeita: Eleva, Limpel e Ciano. “Isso sem falar nos pagamentos feitos por indenização, por parte da Prefeitura de Arapiraca, como vem acontecendo na atual gestão”, acrescentou o presidente.

Presidente da Câmara de Arapiraca, vereador Thiago ML (Foto: Edilson Omena)


PLANO DE TRABALHO

No plano de trabalho da Comissão, que a reportagem da Tribuna Independente teve acesso com exclusividade, consta – além das oitivas das testemunhas – a solicitação de informações e documentos que a prefeitura vem se negado a prestar e a disponibilizar no Portal da Transparência. Uma vez recolhidas essas informações, será possível encaminhá-las ao Ministério Público e demais órgãos fiscalizadores, para que procedam no sentido de responsabilizar os infratores na esfera civil e criminal.

“Assim, pretendemos levar a efeito a realização de um trabalho técnico, eficiente e capaz de garantir a lisura na investigação dos fatos, apontados na denúncia que recebemos”, acrescentou o presidente da CPI, lembrando ainda que todos os acusados terão amplo direito à defesa e ao contraditório. “Nosso objetivo é restabelecer a verdade, para que erros não continuem acontecendo, colocando em risco o patrimônio público e correta utilização dos recursos municipais”, concluiu o vereador.

Para Zé Carlinhos, todos são inocentes até prova em contrário. Mas, uma coisa é certa, por trás da contratação dos serviços de coletiva de lixo e tratamento de resíduos sólidos, há muita celeuma, principalmente porque as empresas escolhidas pela prefeitura são todas do mesmo grupo familiar. Os empresários se revezam à frente das empresas contratadas, participando de certames viciados, sem licitação e de “cartas marcadas”. Por isso, prestam um péssimo serviço à coletividade e não dão satisfação a ninguém.

REQUERIMENTOS

O Plano de Trabalho da CPI do Lixo foi aprovado, na sessão do último dia 20 de dezembro de 2022, pela maioria dos vereadores da Câmara de Vereadores de Arapiraca. Com base nele, foram convocados secretários e servidores do município, bem como representantes das empresas contratadas, para prestarem esclarecimento. Essas pessoas serão ouvidas como testemunhas e não podem se recusar a depor. Caso contrário, poderão ser levadas ao local das oitivas de forma coercitivas.

Essas pessoas serão questionadas sobre a prestação de serviços de coleta de lixo e os pagamentos feitos pela Prefeitura às empresas responsáveis pelos serviços. Atualmente, o serviço de recolhimento de lixo da cidade é feito por uma empresa do grupo sob suspeita. Nas oitivas, os integrantes da CPI vão querer saber porque a Prefeitura de Arapiraca não utiliza o convênio feito pelo Consórcio Intermunicipal do Agreste Alagoano – Conagreste.

Para o vereador Fábio Rogério, relator da CPI do Lixo, o importante é checar as informações das denúncias e responsabilizar os responsáveis pelas irregularidades. Ele também reafirmou a importância do acompanhamento, pela população, dos trabalhos realizados pelos vereadores, nas sessões plenárias da Câmara, realizadas sempre às terças-feiras.

Na última sessão da CPI do Lixo, foram aprovados vários requerimentos dos vereadores integrantes da Comissão, para a oitiva de testemunhas e solicitação de informações junto o poder executivo municipal. A seguir, destacamos as convocações e os vereadores autores de tais requerimentos.

– Secretário Municipal de Serviços Públicos, Roany Izidoro Soares Alves, interveniente no Contrato nº 3789/2021, para ser inquirido no dia 10 de janeiro de 2023, às 11 horas; Autoria, vereador Túlio Freire.

– Gestora do Contrato nº 3789/2021, Maria Caroline Souza Valeriano, para ser inquirida no dia 10 de janeiro de 2023, às 12 horas: Autoria do vereador Fabiano Leão.

– Gestor do Contrato nº 046/2015, por ocasião da celebração do 3º e do 4º termo aditivos, Lucas Tojal Pires, para ser inquirido no dia 17 de janeiro de 2023, às 11 horas. Autoria, vereador Sérgio do Sindicato.

– Secretário Municipal de Serviços Públicos à época da celebração do 3º e do 4º termo aditivos, Elio Cavalcante da Silva, para ser inquirido no dia 17 de janeiro de 2023, às 12 horas. Proposta do vereador Sérgio do Sindicato.

– Membros da Equipe de Transição 2021/2024: Rutineide Pereira Melo de Lira, Maria Ariluce de Cerqueira Silva e Lourinaldo José dos Santos, para serem ouvidos na qualidade de testemunhas, no dia 24 de janeiro de 2023, às 11 horas. Autoria, vereador Fabiano Leão.

– Membros da Equipe de Transição 2017/2020: Marzio Duarte Delmoni, Antônio Fernando Costa Lobo e Dalton Medeiros Buarque, para serem ouvidos na qualidade de testemunhas, no dia 24 de janeiro de 2023, às 12 horas. Indicação vereador Túlio Freire.

– Procurador da Eleva Ambiental Ltda, Niraldo Nunes Pereira, para ser inquirido no dia 31 de janeiro de 2023, às 11 horas. Autoria da convocação, vereador Sérgio do Sindicato.

– Procurador da Ciano Soluções Ambientais Ltda, Reginna Celly Araújo Ferreira, para ser inquirida no dia 31 de janeiro de 2023, às 12 horas. Autoria, vereador Fabiano Leão.

– Requerimento ao Tribunal de Contas de Alagoas para que informe e encaminhe cópia digital dos processos que analisaram a conformidade e a execução do Contrato nº 046/2015, de 10 de março de 2015, e seus quatro termos aditivos, bem como os referentes ao Contrato nº 3789/2021, de 12 de março de 2021. Autoria da proposta, vereador Pablo Fênix.

– Requerimento à Prefeitura de Arapiraca para que informe sobre a existência de processo licitatório para contratação de empresa especializada nos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos no Município de Arapiraca. Autoria, vereador Allysson Bispo.

– Requerimento ao Conagreste para que informe sobre os serviços prestados pelo consórcio aos municípios da região e esclareça se o Município de Arapiraca faz parte do consórcio e a estimativa de custo para prestação do serviço de coleta de lixo ao município. Autoria, vereador Márcio Marques.