Política

Os demitidos e esquecidos da Gazeta

Quase um ano após serem chutados por Fernando Collor, dezenas de jornalistas ainda não viram nenhum tostão que têm direito

Por Tribuna Independente 05/10/2019 09h48
Os demitidos e esquecidos da Gazeta
Reprodução - Foto: Assessoria
Antes mesmo da greve dos jornalistas da Organização Arnon de Melo (OAM), Pajuçara Sistema de Comunicação e Grupo Opinião em junho deste ano, ainda em novembro de 2018, 30 jornalistas foram demitidos do jornal Gazeta de Alagoas e do portal Gazetaweb, de propriedade do senador Fernando Collor. Até hoje, eles ainda não receberam nenhum centavo das indenizações que têm direito, quase um ano após terem suas vidas arruinadas pela má gestão empresarial do ex-presidente da República. Muitos deles lutam diariamente pela sobrevivência e pela saúde física e mental. Por medo de retaliações, todos os ouvidos pela reportagem optaram pelo anonimato. “Você sabe que o Collor ainda tem poder no estado”, disse um deles. Da redação do jornal Gazeta e do Gazetaweb foram demitidos 30 jornalistas, além dos oito da gráfica da OAM. A empresa não depositava o FGTS dos funcionários. Uma das situações mais delicadas é a de José (nome fictício). Desempregado após mais de 10 anos na OAM, ele acumulou dívidas e precisou devolver o imóvel que alugava e vender tudo o que tinha para sobreviver. “Ficar sem emprego e sem as verbas de direito é uma situação complicada. Hoje moro de favor com um amigo, e isso é péssimo. Seria por um tempo, mas agora não sei o quanto vai se estender”, relata. Ele conta que entrou para o jornal Gazeta cheio de sonhos, mas agora vive o pesadelo do desrespeito. “Todo mundo queria trabalhar lá porque era o topo. Lá eu perdi muitas madrugadas e feriados”, lembra. José ainda ressalta o estrago emocional causado pelas demissões. “Eu mesmo preciso de terapia, mas não tenho como pagar porque dependo de amigos. Entre os demitidos tem gente em desespero, com doença grave e que já perdeu as esperanças de refazer a vida”, diz. MPT A reportagem procurou o Ministério Público do Trabalho (MPT) para saber como a instituição acompanha a situação dos demitidos de novembro de 2018. Em nota, o MPT adianta que abriu um inquérito civil. “A denúncia que chegou oficialmente foi o não pagamento do FGTS e a ausência de prazo para pagamento das rescisões. O MPT avalia o plano de recuperação judicial da OAM, que inclui o pagamento das verbas trabalhistas atrasadas”. Vida dos demitidos tem angústia, insônia e incertezas Maria, nome fictício também está desempregada e descreveu sua situação como muito preocupante, devido às crises de ansiedade e insônia, muita angústia e incertezas sobre o futuro. “Tomo medicamentos para a ansiedade e faço terapia. Jamais pensei que uma empresa daquele porte agiria de forma tão desumana”, comenta Maria. “Foi decepcionante a forma como fomos demitidos. Sem nenhuma consideração com nosso futuro ou sustento. Não nos deram nem a possibilidade de nos planejarmos financeiramente. Não recebi as verbas rescisórias, apenas o seguro-desemprego que acabou faz tempo e ainda não consegui emprego”, completa Maria. Ela diz ter conseguido alguns bicos como freelancer. “Estou me virando como freelancer e, como se diz, pegando o que aparecer. A prioridade é pagar contas atrasadas e me sustentar. Todo trabalhador tem direito a receber aviso prévio. Nem isso tivemos”. SEM ESPERANÇA Há casos de profissionais que precisaram sair do estado para sobreviver às custas da família, pois não conseguiam emprego em Alagoas. Já outros estão sem esperança de receber algo da empresa. É o caso de João (nome fictício). “Quando a empresa demitiu e não pagou as rescisões, foi para a Justiça e não cumpriu os acordos, trouxe uma série de problemas para nós. A vida de muitos colegas parou”, comenta. “E como não há muito que fazer, nos resta esperar e tentar confiar minimamente para que a justiça seja feita. Estamos prestes a completar um ano e não recebemos nem os 14 dias trabalhados em novembro de 2018. A sensação é de impotência”, completa João. OUTRO LADO A assessoria do senador Fernando Collor foi procurada, mas disse que este assunto deveria deve ser tratado por Luiz Amorim, diretor-executivo da OAM que, até o fechamento desta edição não respondeu aos questionamentos. SINDJORNAL Segundo Izaías Barbosa, presidente do Sindicato dos Jornalistas de Alagoas, a dívida com os demitidos aumentou. Porém, a situação de recuperação judicial emperra o trâmite judicial, apesar de os trabalhadores terem a preferência nos pagamentos. “Os juros estão correndo porque a partir da segunda parcela não paga, se entra com pedido de quitação total da dívida. Ou seja, não tem mais acordo e a Justiça pode mandar sequestrar os bens. Mas com a recuperação judicial, tudo passa a constar nesse processo, mas tudo fica mais lento porque se precisa levantar todos os bens da empresa”. Na média, a dívida da Gazeta com os demitidos é de R$ 300 mil. “Isso é na média. A alguns se deve R$ 70 mil, a outros, centenas de milhares de reais”, explica Izaías Barbosa.