Política

'Momento é de defender a universidade'

Candidata à reeleição para a Reitoria da Universidade Federal de Alagoas, Valéria Correia fala sobre os cenários e perspectivas

Por Carlos Amaral com Tribuna Independente 20/07/2019 07h42
'Momento é de defender a universidade'
Reprodução - Foto: Assessoria
A Universidade Federal de Alagoas (Ufal) passa por processo de consulta à comunidade acadêmica sobre quem será o próximo titular de sua Reitoria. A Tribuna Independente passa a publicar entrevistas com os candidatos, sendo duas por edição de fim de semana. Nesta, a atual reitora Valéria Correia aponta os motivos que a fazem querer seguir na função e das dificuldades já enfrentadas e as expectativas das que estão por vir. “Estou na hora certa, no lugar certo”. A reportagem passou a semana tentando marcar com Josealdo Tonholo, mas até o fechamento desta edição sua assessoria não deu resposta. Tribuna Independente – A senhora está terminando seu primeiro mandato à frente da Ufal, cujo período o país teve três governos – Dilma Rousseff (PT), Michel Temer (MDB) e agora Jair Bolsonaro (PSL) –, o que afetou as universidades federais. Por que a senhora quer seguir como reitora? Valéria Correia – Penso que estou na hora certa, no lugar certo. Mesmo com essas mudanças de governo, em que o cenário cada vez mais para as universidades – e para o país em geral – ficou bastante pior porque tivemos não só contingenciamento, mas agora um bloqueio de recursos que nos coloca numa situação bastante difícil. Isso em todas as universidades federais, tanto do ponto de vista da autonomia e do ponto de vista financeiro, inclusive para a consolidação do processo de expansão iniciado nos governos anteriores. Então, por que estamos no lugar certo? Por que somos uma gestão que defende o caráter público da universidade, sua gratuidade, e que ela seja socialmente referenciada. Inclusive garantindo a permanência dos estudantes. Eu sou a primeira reitoria assistente social do país nas universidades federais, eleita em período democrático. Isso me coloca num patamar diferente porque temos uma tradição de vida e de defesa dos direitos sociais, humanos e do caráter público do servidor público. Então, nesses momentos difíceis em que a universidade brasileira atravessa, de forma mais intensa agora por haver uma ação articulada para desqualificar a universidade e, ao mesmo tempo, sua importância à qual a sociedade tem abraçado e percebido que somos patrimônio do povo brasileiro. Tivemos a capacidade, junto com os demais reitores do país, de defender a universidade junto com a Andifes [Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior]. No momento em que se aprofunda a crise financeira e de autonomia universitária, eu penso que tem de ter um perfil de gestores como o meu. Por isso, eu me coloquei mais uma vez para disputar a Reitoria. Fizemos um edital para as pós-graduações para pôr a obrigatoriedade aos professores visitantes que aceitassem uma cota de servidores nossos. A gente tem de formar nosso quadro, além da racial, para negros, e para deficientes. Hoje temos 283% a menos de recursos para investimentos que 2015. Mas a gente conseguiu terminar 26 obras, inclusive um complexo esportivo com 48 mil metros quadrados, o prédio de Comunicação Social, o de Libras, de Anatomia, o eixo saúde em Arapiraca. Mesmo com parcos recursos. Mas tem coisas que não precisam de recursos, como a garantia de substitutos para professores que saem para se qualificar. Também implantamos edital público para professores do EAD [Ensino à Distância], o que abriu a oportunidade a pessoas que nunca participaram. Isso também é mais transparência na gestão, implantamos editais para tudo no que for possível, fazemos edital. Tribuna Independente – A senhora falou em articulação para desqualificar a universidade e o Ministério da Educação (MEC) nesse momento tem passado por certa confusão com troca de ministros e adota posturas que vão à contramão da construção das últimas décadas do que vem a ser o papel das universidades. Caso eleita, como a senhora prevê a relação com esse MEC do governo Bolsonaro? Valéria Correia – Minha postura é a mesma dos demais reitores do país, de altivez, de debate claro, de se colocar em defesa da universidade, dos princípios democráticos, da autonomia universitária. Todos os documentos que têm saído da Andifes, já neste governo, são nesse sentido, o de reafirmar princípios históricos que vêm sendo construídos pela Andifes, inclusive em sua relação com o MEC. Então, a gente tem que dialogar – penso que com todos os governos eleitos, a gente tem de dialogar –, mas temos também de ter posições. Por exemplo, defender a Constituição brasileira no que diz respeito aos seus capítulos 206 e 207 que falam tanto sobre o princípio da gratuidade na educação pública, seja a básica ou a superior, como o princípio da autonomia da universidade, desde a gestão, passando pela financeira e a liberdade de cátedra. Sobre isso – e por isso mencionei que era a pessoa certa, na hora certa –, eu propus ao Conselho Universitário uma resolução afinada com a Constituição sobre a liberdade pedagógica e de cátedra da Universidade, cerceando qualquer medida de tolher a liberdade de expressão, desde que se respeite os direitos humanos. A proposta foi aprovada por unanimidade. Tivemos alguns professores filmados em sala de aula, o que os constrangeram. Foi a partir disso que encaminhamos essa proposta ao Conselho Universitário. Agora, os estudantes, de qualquer maneira, sabem dos limites. Que são constitucionais. Tribuna Independente – Boa parte do eco do discurso de desqualificar as universidades vem da falta de conhecimento do papel que elas têm nos locais onde estão inseridas, mesmo muitos estudantes não têm a real dimensão disso. Qual a importância da Ufal para Alagoas? Valéria Correia – A Ufal expandiu-se e houve a interiorização de seus campi, de seus cursos. Temos hoje 100 graduações, a centésima é um do Pronera, de Agroecologia. Nos 58 anos de Universidade, de formação de gerações e quadros, inclusive políticos. Os grandes quadros, em todas as áreas do conhecimento, são fruto da formação da Ufal. Da profissional. Mas há também o aspecto da formação para a cidadania. Além disso, nossas pesquisas têm impactos imensuráveis para Alagoas. Por exemplo, temos o LCCV [Laboratório de Computação Científica e Visualização] – um conjunto de professores que realizam pesquisa financia pela Petrobras – que teve influência na descoberta do pré-sal. Há uma rede nacional de pesquisadores e temos um centro aqui na Ufal. Também temos o PMGCA [Programa de Melhoramento Genético da Cana-de-açúcar], no Ceca [Centro de Ciências Agrárias], onde somos referência numa rede de 12 universidades, com peso na produção brasileira de cana. Esses são exemplos de pesquisa de ponta, mas são muitas. Outro exemplo é o LaCCAN, de inteligência artificial. Recentemente, conseguimos, por meio do LaCCAN, criar um aplicativo que rastreou R$ 70 milhões de impostos que não estavam sendo pagos a Alagoas. Nós contribuímos para o desenvolvimento econômico – e em milhões – de Alagoas. Se menciona que a Ufal custa caro, mas o que ela desenvolve e retorna à sociedade em pesquisas não têm preço.