Economia

Acirramento político tende a afetar economia do país

Independentemente de quem vença a eleição neste segundo turno, sociedade mostra-se dividida sobre a política econômica

Por Texto: Carlos Amaral com Tribuna Independente 27/10/2018 11h52
Acirramento político tende a afetar economia do país
Reprodução - Foto: Assessoria
O acirramento político desta eleição entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), vai afetar a economia brasileira no próximo período, resta saber como e por quanto tempo. Diante do cenário futuro de incertezas, a Tribuna Independente entrevista Cid Olival, professor do curso de Economia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Para ele, o momento atual é danoso porque a economia vive de expectativas e se elas são ruins, acabam por gerar impactos “desastrosos” na economia. Cid Olival também critica o mercado: “A economia de um país não pode ficar refém do que o mercado acredita porque ele defende interesses que não são os da sociedade”.   Tribuna Independente – Com esse cenário acirrado que o país vive, até que ponto a economia será afetada, já que a política interfere em seu desempenho? Cid Olival – O cenário acirrado é ruim em todos os aspectos. Então, se a gente pensa o quadro de hoje, independente de quem vencer a eleição, teremos situação social e política bastante complexa. Temos uma divisão muito grande na sociedade e isso vai gerar reflexos no avanço das medidas de política econômica e da aprovação de projetos na Câmara e no Senado, o que pode dificultar muito a condução da política econômica do país a partir do próximo ano. Isso dos dois lados. Acho que vivemos agora um momento de expectativa, que também é danoso. Há de um lado um antipetismo e do outro um projeto de governo completamente contrário a qualquer possibilidade de liberdade democrática. A gente tem, de fato, uma convulsão social que terá reflexos fortes na política econômica até mesmo porque a atividade econômica funciona, em certa medida, à base de expectativas. E se elas são ruins, você tem um círculo vicioso que tem impactos desastrosos para o funcionamento da economia. E se a gente pensa sobre os dois candidatos, o que a gente tem no horizonte... Se a gente pega o programa do Jair Bolsonaro, que não é muito claro, há muito sobre liberdade econômica, mas não há muita definição sobre o que é isso e traz pautas, claramente, favoráveis à situação que temos hoje: intensificação de reformas pró-mercado, como a da previdência; manutenção da reforma trabalhista; sob o ponto de vista fiscal, controle dos gastos públicos; e você tem um programa confuso – e preocupante – em relação a questões fundamentais como educação e saúde. Se você tem um candidato vai defender educação à distância ou privatização do serviço público de educação, como o ensino superior, você retira qualquer possibilidade de ascensão social das camadas mais baixas e compromete, em alguma medida, a qualidade do ensino, terá um país que vai entrar em retrocesso porque esse setor é fundamental para o processo de crescimento e desenvolvimento econômico. Tribuna Independente – O que lê do noticiário econômico é que o mercado tem preferência – ou parte dele – pelo candidato Jair Bolsonaro, até que ponto esse tipo de político que o senhor descreve favorece o mercado e atinge o restante do país? Cid Olival – Se a gente pensa o mercado enquanto agente, entidade, que é uma coisa bem abstrata, a gente precisa entender que ele está preocupado com os ganhos imediatos, com o curto prazo. O mercado tem apostado, por exemplo, em ganhos de setores que, apesar da crise dos últimos anos, têm tido taxas de rendimento e lucro extremamente elevadas, mesmo com uma das maiores taxas de desemprego. Então, o mercado está preocupado com o imediato e com os lucros que alguns setores e algumas empresas terão. Notadamente o setor financeiro que é quem tem dominado, em alguma medida, o período contemporâneo. Se a gente pensa numa política econômica voltada à sociedade como um todo, o mercado tem algum tipo de restrição. O mercado não está preocupado com o desenvolvimento econômico, e sim com os ganhos que ele pode ter agora. Isso é extremamente volátil porque você tem uma oscilação muito grande quando se pensa o mercado. A economia de um país não pode ficar refém do que o mercado acredita porque ele defende interesses que não são os da sociedade. Tribuna Independente – E no caso de vitória do Fernando Haddad, é só o clima de acirramento ideológico que vai afetar a economia ou o mercado pode operar para boicotar a economia em seu governo? Cid Olival – No caso do Fernando Haddad, a gente tem um projeto de governo que pensa políticas econômicas em prol do conjunto da sociedade, contemplando os setores mais vulneráveis. Se a gente pensa setores fundamentais para iniciar um processo de desenvolvimento econômico, e partir daí se ter algo mais sustentado, como educação, saúde, emprego e previdência, por exemplo. Isso está contemplado no programa de governo do Fernando Haddad de forma efetiva, mostrando que a ação do Estado é fundamental para induzir um processo de crescimento e desenvolvimento econômico. Ele não deixa apenas que o mercado atue sozinho. Se a gente pega as experiências históricas brasileiras, quando o mercado atua sozinho o que se vê é crescimento da desigualdade, distribuição de renda pouco efetiva onde poucos setores da população ganham muito e o conjunto da população perde muito. Um governo seu precisa conciliar, e não é uma tarefa simples porque existe esse clima de acirramento nesse momento na sociedade brasileira. Ele vai precisar de muitas alianças. O que é um sinal positivo é que muitas lideranças têm sinalizado apoio ao Fernando Haddad pelo fato de a gente ter elementos que, de fato, ameaçam à democracia vindos do candidato Jair Bolsonaro. Há uma possibilidade de construção com diversos segmentos sociais e políticos num governo Fernando Haddad, o que não está posto em caso de um governo do outro candidato. Tribuna Independente – É possível dizer por quanto tempo a economia brasileira ficará sob o efeito da eleição deste ano, independente de quem vença a eleição? Cid Olival – O primeiro ano de governo é sempre o mais difícil ou o mais fácil, dependendo do movimento que se tenha após as eleições. Me parece que nesse caso específico, o primeiro ano de governo será muito mais difícil porque a gente ter essas disputas entre o vencedor e o derrotado que, provavelmente, vai questionar o resultado das urnas. Mas a gente não pode esquecer o Congresso. A gente tem agora uma recomposição do parlamento e, apesar do partido do candidato Jair Bolsonaro ter aumentado significativamente sua bancada, o PT ainda tem um número forte de parlamentares. É ilusório a gente imaginar que o presidente da República fará tudo sozinho. Se a gente pega o período recente, se vê que o governo Dilma Rousseff [PT] sofreu muito pela inabilidade e do baixo apoio que tinha no Congresso. Mas acredito que o primeiro ano será a prova de fogo.