Política

Cultura da transparência é pequena

Superintendente da CGU em Alagoas fala sobre a dificuldade de as gestões se adequarem à Lei de Acesso à Informação

Por Carlos Amaral com Tribuna Independente 12/05/2018 09h49
Cultura da transparência é pequena
Reprodução - Foto: Assessoria
A transparência na utilização de recursos públicos tem sido cada vez mais cobrada no Brasil. Desde a criação da Lei de Acesso à Informação em 2011, governos e prefeituras tem implantado portais com dados sobre a gestão, mas isso ainda ocorre de forma aquém do que deveria. Em Alagoas, por exemplo, só dois municípios possuem nota entre 8 e dez no ranking “Brasil Transparente” da Controladoria Geral da União (CGU): Passo de Camaragibe, com nota 8,47 e Maceió, com 10. No Sertão, a maioria das cidades tem nota zero. Para falar sobre esse tema, a Tribuna Independente entrevistou Moacir Rodrigues, superintendente da CGU em Alagoas. Para ele, a cultura da transparência ainda não foi absorvida no Brasil. Tribuna Independente – No ranking da CGU, “Brasil Transparente”, somente duas cidades em Alagoas possuem nota entre 8 e 10. No Sertão, uma boa parte dos municípios possui nota zero. Por que é tão difícil ter transparência na gestão pública? Moacir Rodrigues – A gente entende que Lei 12.527/2011, a de acesso à informação, mudou uma cultura e mudança de cultura é um processo. A CGU já realizou três avaliações do Brasil Transparente e percebeu um crescimento, mas mesmo após da última avaliação a média de transparência é muito baixa no Brasil. A gente percebe que dentro de nossa cultura, ainda não se absorveu a transparência, de perceber que a informação sobre recurso público não é da administração e deve estar disponível para o cidadão. A gente entende também que a sociedade ainda não está acostumada a utilizar essa informação, para conhecer a administração pública. Outro caso em relação às prefeituras menores é a falta de estrutura mesmo, de pessoal. Em que pese a CGU iniciar esse processo – somos Ouvidoria Geral da União e responsáveis pela instância recursal da Lei 12.527 no Poder Executivo Federal –, nós desenvolvemos programas, inclusive, para prefeituras e sem custo algum. Temos a rede de ouvidoria, utilizando o próprio sistema da CGU. O Brasil é muito compartimentado. Nosso federalismo, em que temos União, estados e municípios que são esferas diferentes, acaba por gerar uma não integração. A CGU busca essa integração, por isso disponibilizou para estados e municípios esses programas. Tribuna Independente – O senhor avalia que essa dificuldade em transparência não é só em Alagoas, mas no Brasil inteiro? Moacir Rodrigues – No Brasil inteiro. Eu já trabalhei no Acre, na Paraíba, no Rio Grande do Norte e antes de vir para Alagoas, passei cinco anos em Curitiba. Imagine um gestor instalado em São Paulo e Curitiba a facilidade que ele tem em questão de fornecedores e um no interior do Acre. São realidades diferentes. O Brasil é muito diferente, com vários brasis. Tribuna Independente – Os gestores não são ilhas isoladas da população, ao contrário, fazem parte dela, e o senhor falou em cultura da transparência. Como a CGU pode influenciar mais nesse quesito, para além do caráter mais punitivo? Moacir Rodrigues – Eu entendo o seguinte: devemos enxergar além da lama. Vivemos um clima que a cada dia nos deparamos com situações de irregularidades. Hoje mesmo [sexta-feira, 11], nós tivemos a Operação Catabiu. Tem um Decreto 9.203/2016, que trata de governança, gestão de risco e controles internos, onde se destaca muito planejamento estratégico. No Brasil, ainda, a administração pública não absorveu totalmente os instrumentos de planejamento. A gente fala muito em custo da corrupção, mas o custo da ineficiência da administração pública é um absurdo. Quantas obras paradas nós temos? Quantos medicamentos nós descartamos por ano no Brasil, por ineficiência, compra sem planejamento, por comprar perto do prazo de vencimento? Em merenda escolar, quanto perdemos no dia a dia? Enfim, isso é uma cultura que tem de ser trazido para a discussão. Você me perguntou como a CGU tem feito isso. A CGU, hoje, trabalha em quatro grandes vertentes: somos Secretaria Federal de Controle, então somos o controle interno do Poder Executivo Federal e nessa Secretaria que fazemos auditoria e fiscalização, e até as operações especiais; a outra vertente é a Ouvidoria Geral da União, e nós temos várias ações para trazer o controle social e qualificar o cidadão, prestar informação e oferecer instrumento ao cidadão se manifestar e obter informação. Agora, estamos junto com a Secretaria de Estado da Educação discutindo a implantação do programa ‘Monitorando a Merenda’. Escolheremos 10 ou 15 escolas da rede pública, que tiverem os piores índices na área de educação e faremos uma campanha nessas escolas para sensibilizar os alunos sobre cidadania e participação social. Aqueles que assim entenderem, a CGU vai instalar um programa em seus aparelhos de celular para que eles monitorem a merenda em suas escolas e encaminharem à CGU suas avaliações. Tribuna Independente – Esse papel da população apresentar demanda à CGU é importante, e como está essa procura, chega muita demanda? Moacir Rodrigues – É imprescindível. Nenhum órgão de controle vai conseguir estar em todos os lugares avaliando o que acontece. A sociedade, que usa a política pública na ponta, é que pode dizer se funciona. Se o médico está presente, se o medicamento existe, se a escola e o transporte escolar funcionam. É imprescindível a participação da sociedade, mais até que o próprio controle. O primeiro controle é o social e ele é um controle político também, na medida em que ele julga o gestor a cada dia. Enfim, nós temos no portal da CGU um espaço para denúncias, parte dessa rede de Ouvidoria que acabei de citar. Se pode pedir informação ou fazer uma denúncia. Temos uma grande quantidade de acessos, mas ainda aquém para um país como o Brasil. Tribuna Independente – Esse programa que o senhor citou, o da merenda, já está implantado? Moacir Rodrigues – Ele já foi executado no Pará e aqui será a partir do segundo semestre deste ano. Na segunda-feira [7], tive uma reunião com Maria Clara, controladora-geral do Estado, e na semana que vem teremos uma reunião com a secretária de Educação para discutir como se dará sua implantação.