Política
Foro privilegiado afeta credibilidade da Justiça, diz Praxedes
STF aguarda decisão sobre o fim do privilégio para diversos políticos
Em meio ao debate sobre moralidade, Lava Jato e combate à corrupção, o fim do foro privilegiado não passa ileso. Houve alguns avanços na discussão no Congresso Nacional, e o tema está sendo tratado no Supremo Tribunal Federal (STF).
No último dia 24, ministro do STF, Gilmar Mendes, disse que o Supremo deve restringir o alcance do foro privilegiado. Mendes citou, por exemplo, que em relação aos casos funcionalmente relevantes, aqueles crimes praticados no exercício do mandato, os processos ficarão no STF.
Com base nesse contexto, a reportagem da Tribuna Independente entrevistou autoridades políticas e jurídicas do estado para ampliar ainda mais o tema sobre o fim do foro e suas consequências.
O presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Otávio Praxedes, avalia que é preciso restringir as hipóteses de sua incidência. Ele diz que no Brasil o rol de pessoas beneficiadas é extensíssimo, não havendo paralelo no direito de outras democracias contemporâneas.
“Essa generosa difusão do foro por prerrogativa de função provoca, em certa medida, a perda da eficácia da prestação jurisdicional e afeta negativamente a credibilidade da Justiça, pois contribui para a morosidade dos julgamentos e para o congestionamento dos tribunais superiores, que, a rigor, não foram pensados para apreciarem fatos e provas, mas para tratarem de teses jurídicas”, argumenta Praxedes.
Sobre o debate no STF, Praxedes ressalta que a “arena mais adequada para deliberação sobre o sentido e o alcance do foro por prerrogativa de função deveria, realmente, ser o Congresso Nacional. Contudo, diante da crise de funcionalidade e de representatividade pela qual passa o Poder Legislativo Federal, percebe-se que o STF, não sem alguma razão, tem tentado preencher os espaços que o Parlamento deixa vazios”.
A PROPOSTA
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para o fim do foro privilegiado aprovada no ano passado por unanimidade no Senado. Pelo texto aprovado, deixam de ter o foro por prerrogativa de função deputados, senadores, ministros de Estado, governadores, ministros de tribunais superiores, desembargadores, embaixadores, comandantes militares, integrantes de tribunais regionais federais, juízes federais, membros do Ministério Público, procurador-geral da República e membros dos conselhos de Justiça e do Ministério Público.
Senador Renan Calheiros e deputados são favoráveisUm levantamento feito pelo jornal Folha de S. Paulo mostra que a legislação brasileira garante a prerrogativa a pelo menos 58.660 pessoas, enquanto o STF discute a restrição do foro especial aos deputados federais e senadores.
Os ministros devem terminar de analisar a ação que limita o alcance da prerrogativa para deputados federais e senadores no dia 2 de maio. Oito dos 11 magistrados que compõem a Corte já votaram favoravelmente à restrição. Faltam apenas três votos de Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. Para a maioria do Supremo, o foro especial deve valer apenas para crimes cometidos durante o mandato e que tenham relação direta com ele.
Defensor do fim do foro privilegiado, o senador Renan Calheiros (MDB), informou à Tribuna Independente que é muito importante que o Supremo leve em consideração a manifestação do Senado e a impossibilidade de votação na “Casa dos Deputados Federais” por conta da intervenção no Rio no Janeiro e resolver de uma vez por todas de uma maneira mais abrangente.
“Eu defendo que caia [foro privilegiado]. Eu agilizei a tramitação. O Senado acaba com o foro e todos responderão em primeira instância sem exceção. Todos os 58 mil foros”, declara o senador.
FAVORÁVEIS
Deputados federais e estaduais também tratam do tema. Os consultados pela reportagem da Tribuna Independente concordam com o fim da prerrogativa.
“São mais de 45 mil detentores do foro hoje, tendo um tratamento diferente dos outros 200 milhões de brasileiros. Sem contar o ‘efeito colateral’ de sobrecarregar os tribunais superiores com ações penais, em especial o STF”, justifica Pedro Vilela (PSDB).
Já Paulão (PT), disse concordar com o fim da prerrogativa de função, somente se for para todas as autoridades, inclusive para os ministros do STF.
“Essa discussão que está no Supremo Tribunal Federal só atinge o Congresso Nacional. Portanto, sou contra ao debate no STF”, declara o petista.
No âmbito estadual, se manifestaram sobre os assuntos os deputados Rodrigo Cunha (PSDB) e Bruno Toledo (Pros). Para o tucano é necessário deixar claro que a decisão do STF é um avanço, mas não significa necessariamente o fim do foro privilegiado.
“Na verdade, ele limita a interpretação do dispositivo constitucional, somente admitindo a aplicação do foro privilegiado àqueles casos em que os parlamentares estejam em mandato e o crime tenha relação ao cargo que exerça. O que é inadmissível é que processos fiquem parados, que se crie a sensação de impunidade, tornando a política em um ambiente favorável para criminosos que busquem proteção judicial”, diz Rodrigo Cunha.
Para Toledo, o foro fomenta “muito a impunidade”, tornando a “famigerada” imunidade parlamentar uma verdadeira via de proteção ao crime. “Imunidade só das palavras, isso que defendo. Os demais precisam ser tratados como cidadão comum que, perante a lei, todos devem ser”.
TESES CONFUSAS
O advogado especialista em Direito Eleitoral, Marcelo Brabo, ressaltou que a discussão no âmbito do Supremo Tribunal Federal é um pouco mais abrangente, se comparada à fala do ministro Gilmar Mendes.
“A tendência natural hoje não é apenas e tão somente você modificar o foro privilegiado. É dar uma natureza híbrida a ele. Um deputado federal, por exemplo, cometendo algum crime no exercício do mandato vai ser julgado pelo STF, mas aquelas situações anteriores ou posteriores ao exercício serão resolvidas no juízo de primeiro grau, o que vai trazer certa confusão. Por quê? Porque eu posso ter um parlamentar federal, por exemplo, que vai ter demandas criminais no primeiro grau e vai ter demandas criminais no Supremo. Isso é uma crítica que a gente faz, até porque no meu sentir, nada mais natural do que você uniformizar. Acho sim que o foro merece um aperfeiçoamento, mas não acabar. E mais ainda ter essa possibilidade de você ter uma autoridade julgada por juízes diferentes de instâncias diferentes o que pode trazer uma grande confusão e grandes reflexos”, diz Marcelo Brabo.
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