Política

“Privatização da Eletrobras vai encarecer a tarifa”, diz presidente dos Urbanitários

Nestor Powell trata dos riscos que a população pode pagar com a venda da Eletrobras

Por Carlos Amaral com Tribuna Independente 23/12/2017 09h43
“Privatização da Eletrobras vai encarecer a tarifa”, diz presidente dos Urbanitários
Reprodução - Foto: Assessoria
O Conselho Administrativo da Eletrobras emitiu recentemente relatório que aponta a possibilidade de liquidação da empresa caso ela não seja leiloada até o próximo mês de junho. O valor inicial para cada um das seis distribuidoras, entre elas a de Alagoas, é de somente R$ 50 mil, o preço de um carro popular zero km. Além disso, colocar nas mãos privadas a tarefa de garantir a distribuição de energia elétrica num país desigual como o Brasil pode manter na escuridão muita gente ainda sem acesso à eletricidade. Em Alagoas, um dos estados mais pobres do Brasil, essa realidade é bastante plausível. Para falar sobre isso, a Tribuna Independente entrevistou Nestor Powell, presidente do Sindicato dos Urbanitários de Alagoas. Para ele, a privatização da empresa vai gerar tarifas mais caras, piorar a qualidade no serviço prestado e programas como o “Luz para Todos” não serão mais executados. Tribuna Independente – A Eletrobras corre risco de liquidação se ela não for leiloada até o próximo mês de junho, segundo relatório do Plano de Negócios e Gestão do Conselho Administrativo da empresa. Qual a sua avaliação sobre a privatização e a atual situação da empresa? Nestor Powell – A nossa luta tem sido bastante intensa e para nós não interessa nem privatização nem liquidação. Mas essa ameaça é real, ela existe. Nós entendemos que qualquer liquidação que a empresa queria fazer em relação às distribuidoras – atualmente são seis – existe uma legislação específica. Porém, até agora o que há são decretos autorizando essa movimentação. Contudo, decreto não é lei para permitir a extinção da empresa. A Eletrobras vem colocando isso insistentemente, inclusive, querendo misturar a questão de seu passivo, elevado, oriundo do Plano Bresser [sucedeu o Plano Cruzado II]. Ela mesma vem colocando que se isso não for resolvido, há o risco de ela fazer licitação somente na concessão. Tribuna Independente – O Governo Federal estipulou preço de R$ 50 mil para cada uma das distribuidoras... Nestor Powell – Pois é. Essa é nossa luta e estamos fazendo esse debate com a sociedade, através de audiências no Brasil todo. Aqui em Alagoas já foram cerca de oito, em vários locais, nas câmaras municipais. Ou seja, estamos tentando trazer a sociedade para esse debate, pois acho que cabe à sociedade fazer seu juízo de valor, e nada mais próximo do cidadão do que as câmaras de vereadores. A gente sabe o que uma privatização traz. Precariza os serviços. E não falo nem a questão do corporativismo, porque prejudica nossos empregos também. A gente está colocando para a população quais são os prejuízos da privatização. São tarifas mais elevadas porque privatizou. Não tem como não ocorrer. Onde foi privatizado, aconteceu. Temos o exemplo recente da Celg, de Goiás, que foi a última a ser privativa [novembro de 2016] e já teve aumento de tarifa. Tribuna Independente – A situação da telefonia – especialmente a móvel, que é campeã de reclamações – é um exemplo a ser destacado, principalmente diante desse discurso de que o que é público e estatal é caro e ruim? Nestor Powell – Geralmente, as pessoas fazem essa comparação: ‘olha, não viu a telefonia? Hoje todo mundo tem celular’. Ora, é preciso entender que hoje todo mundo tem celular por causa da mudança tecnológica que houve no sistema. E o bum do celular se deu no mundo inteiro. Além do mais, estamos atrasados em relação a muitos países, com déficit de tecnologia em torno de 20%. Fora isso, vários locais não tem atendimento de celular. Por quê? Porque não tem lucratividade para empresa. Mas você pode viver sem o celular, mas e sem energia ou água? Privatizando, como fica? O cara vai ter interesse de fazer como o ‘Luz para Todos’? Esse programa só foi possível porque foi um programa do Governo Federal. Alagoas, por exemplo, foi o estado que primeiro atingiu a meta no país. Há exemplo de construção de 13 km de rede para atender somente quatro casas. A iniciativa privada faria um investimento desses? Com certeza não. E aí depois de todo esse sistema montado, tem garantir manutenção. O que se paga de energia não compensa um investimento assim. Só quem faz uma coisa dessas é a iniciativa pública. Tribuna Independente – As pessoas têm entendido esse argumento, porque o discurso hegemônico é o de que o estatal é ruim e o privado é bom e barato? Nestor Powell – Elas começam a absorver lentamente. Precisamos entender que a gente briga com a grande mídia. E enquanto ela diz que o serviço público não presta, é ineficiente, nós dialogamos com a população numa escala menor. Mas aos poucos as pessoas começam a entender. Nesta semana, na audiência pública em União dos Palmares, várias pessoas elogiaram a forma como a Ceal [Eletrobras Alagoas] presta seus serviços. A qualidade deles. Recentemente, a Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica] a premiou como sendo a distribuidora que mais evoluiu no índice de satisfação do cliente. Esse índice demonstra o quanto o consumidor está satisfeito com o serviço prestado. Há um tempo limite que o consumidor pode ficar sem energia. Aqui se baixou de 24 minutos por ano para 19, 20. Mas a privatização pode aumentar isso... Tribuna Independente – E as tarifas sociais, a privatização pode acabar com elas, não? Nestor Powell – Pode mudar tudo. Uma das coisas já colocadas, caso a privatização realmente ocorra, é flexibilizar esse índice. Em vez de 24 minutos sem energia, e aqui já fazemos 20, vai ser 30. Ora, para você diminuir esse índice, melhorar o serviço, precisa de investimento. Mas a empresa vai dizer: ‘já estou abaixo do que se pede, porque vou fazer esforço para melhorar o sistema?’. Não tem sentido. A gente está mostrando à população que a empresa não é deficitária. Tem acusado prejuízo, tem. Mas quando você coloca os empréstimos que a empresa fez para cobrir tarifa... Tribuna Independente – Voltando à questão dos trabalhadores, há também um Plano de Incentivo de Desligamento (PID) em vias de ser instituído. Recentemente o Governo Federal instituiu um Programa de Demissão Voluntária (PDV), mas a adesão foi irrisória. O senhor acredita que nas distribuidoras da Eletrobras, esse PID terá procura significativa? Nestor Powell – Sempre tem procura, mas acreditamos que serão pessoas já aposentadas, principalmente da área operacional. Eles estão afastados em função de aposentadoria especial, com 25 anos de contribuição. Esse pessoal talvez seja o maior contingente que procure adesão ao PID. Agora, o PID para as distribuidoras é diferente do que virá para a geração e transmissão. É muito inferior. Agora, a empresa faz pressão sobre os trabalhadores e a gente alerta: ‘Se você permanecer na empresa mais um ano, já compensou o PID’.