Política

Com dúvidas, partidos aprovam Fundo da Democracia

Das legendas consultadas, todas concordam com financiamento público eleitoral, mas possuem algumas considerações

Por Tribuna Independente 16/08/2017 09h25
Com dúvidas, partidos aprovam Fundo da Democracia
Reprodução - Foto: Assessoria

Foi aprovada no último dia 10 pela comissão da reforma política na Câmara dos Deputados a criação do Fundo Especial de Financiamento da Democracia, cujo objetivo é garantir recursos públicos para as campanhas eleitorais. O valor aprovado pelos parlamentares é de R$ 3,6 bilhões, já para 2018. Dos partidos ouvidos pela Tribuna, todos aprovam a medida, entretanto, com dúvidas sobre sua implantação.

Segundo Ricardo Barbosa, presidente estadual do PT, o financiamento público de campanhas eleitorais sempre foi uma bandeira do partido, mas a iminente aprovação na Câmara do modelo eleitoral chamado de “distritão” pode distorcer o benefício que o Fundo traz para as eleições.

“Se o ‘distritão’ for aprovado, na prática, esse recurso vai para o candidato. O PT sempre defendeu o financiamento público porque diminui a influência privada da eleição”, diz o petista.

Ronaldo Lessa, presidente estadual do PDT, também defendeu a criação do fundo eleitoral, mas ponderou que formatação ele terá após sair do Congresso.

“Alguém tem de financiar a eleição, uma vez que o Supremo proibiu as doações privadas. É melhor que o financiamento seja público, com controle rigoroso, do que privado e do jeito que estava”, comenta Ronaldo Lessa.

Para José Thomaz Nonô, presidente do DEM em Alagoas, a medida é reflexo da proibição das doações privadas. Entretanto, ela não garante, por si só, o fim de práticas de corrupção.

“Dentro das circunstâncias que foram construídas lá trás, é bom. Mas a dúvida é se esse fundo vai acabar com o caixa 2. Na Alemanha também tem fundo público e o ex-chanceler Helmut Kohl caiu porque recorreu ao caixa 2”, afirma Nonô.

O fundo eleitoral será mantido com recursos públicos previsto no orçamento, num percentual de 0,5% da receita corrente líquida em 12 meses, encerrados em junho. Nos valores atuais, R$ 3,6 bilhões.

Metade dos recursos deve bancar corrida presidencial

O Fundo Especial de Financiamento da Democracia ainda vai precisar ser regulamentado, mas a maior probabilidade é que metade dele seja destinada às campanhas majoritárias: presidente, governador e senador. A outra metade deve ser dividida com 30% para as disputas à Câmara dos Deputados e 20% às assembleias legislativas.

Para já vigorar na eleição de 2018, é preciso que todas as mudanças na regra eleitoral sejam aprovadas até a primeira semana de outubro deste ano.

A ideia do relator da reforma política na Câmara, Vicente Cândido (PT-SP) é que o montante do fundo eleitoral seja reduzido com o tempo. Pela metade já em 2020.

O parlamentar defende que o modelo eleitoral seja alterado e, assim, a necessidade de recursos diminua. A maioria da comissão da reforma política aprovou que o modelo de votação para 2018 seja o ‘distritão’, que elimina a proporcionalidade nos parlamentos e dá caráter majoritário à disputa para deputados e vereadores.

Vicente Cândido defendia o sistema distrital misto, que ainda pode vigorar a partir da eleição de 2022. Nesse modelo, o eleitor votaria duas vezes: uma no candidato e outra no partido. Em cada distrito eleitoral, os mais votados seriam eleitos e preencheriam metade das vagas disponíveis.

A outra metade seria preenchida com as vagas obtidas pelos partidos políticos a partir de suas votações.

Para que essas alterações passem a valer é preciso que 2/3 da Câmara as aprovem em duas votações. Depois o tema segue para o Senado.

Para cientista político, Divisão de recursos merece maior atenção

Para o cientista político Ranulfo Paranhos, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), o fundo eleitoral é necessário – principalmente pela proibição do financiamento empresarial das campanhas eleitorais – e seu montante, R$ 3,6 bilhões, está dentro do razoável. O problema, segundo ele, é como se dará a divisão desse dinheiro e o modelo de eleição.

“Esse valor, R$ 3,6 bilhões, é muito se compararmos a alguns programas ou a alguns orçamentos de cidades ou estados. Mas como é que se faz campanha num país do tamanho do Brasil? A meu ver, o problema é em como esse recurso será dividido. Será que os diretórios de cidades pequenas do interior verão a cor desse dinheiro?”, questiona.

Além disso, ele ressalta que o financiamento público tem mais a ver com os votos em lista partidária e não em pessoas. O “distritão” torna as disputas, até então proporcionais, em majoritárias.

“De antemão acho que qualquer modelo que priorize o personalismo em detrimento da vinculação partidária é ruim. Os partidos já são instituições fragilizadas no país e o modelo ‘distritão’ tem essa característica. Essa discussão, para mim, é mais importante do que o fundo eleitoral”, comenta o cientista político.

QUATRO PAÍSES

O modelo “distritão” só é utilizado em quatro países: Afeganistão, Emirados Árabes Unidos, Kuait e Vanuatu.

Segundo a proposta aprovada pela comissão da reforma política, esse modelo será transitório e, em 2022, o modelo será o distrital misto. Nele, o eleitor vota duas vezes: uma no candidato e outra no partido.

Também fica possibilitado que um mesmo candidato dispute dois cargos numa mesma eleição, se um deles for para o Poder Executivo. Ele poderia ser candidato ao governo e constar na lista partidária para o parlamento. Se eleito para o governador, sai da lista.