Interior

Sítios arqueológicos e função social de assentamento rural em Delmiro Gouveia

Trabalhadores camponeses desenvolvem agricultura familiar de base agroecológica, enquanto protegem sítios arqueológicos capacitando jovens assentados

Por Ascom da FPI/AL 22/11/2022 11h35
Sítios arqueológicos e função social de assentamento rural em Delmiro Gouveia
A arqueóloga do Iphan em Alagoas, Rute Barbosa, destacou que a região que compreende a tríplice fronteira – Alagoas, Sergipe e Bahia – reúne um agrupamento (mais de 600 sítios) - Foto: FPI DO SÃO FRANCISCO/ASCOM

O Assentamento Lameirão, no município de Delmiro Gouveia, recebeu a visita da FPI do Rio São Francisco nesta 11ª etapa da fiscalização preventiva que ocorre no sertão alagoano. Os assentados mostraram-se importantes atores na missão de preservação do meio ambiente e dos 18 sítios arqueológicos identificados na região, além de serem um destacado exemplo de assentamento rural proveniente do Movimento Sem Terra (MST) em Alagoas que vem promovendo desenvolvimento, emprego e renda em meio ao pedregoso solo sertanejo.

Acompanhados de técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a equipe 10 – Comunidades Tradicionais e Patrimônio Histórico vistoriou e registrou importantes pinturas rupestres no sítio arqueológico chamado “Delmiro 17”, numa região que reúne descobertas arqueológicas que podem datar de mais de 3.600 anos.

A arqueóloga do Iphan em Alagoas, Rute Barbosa, destacou que a região que compreende a tríplice fronteira – Alagoas, Sergipe e Bahia – reúne um agrupamento (mais de 600 sítios) de achados rupestres importantes para entender o povoamento das américas. “Não há preservação de sítio arqueológico sem meio ambiente protegido e preservado. Vários estudos já estão em andamento sobre os achados desta região e nos próximos 10 anos haverá muitas descobertas sobre essa área”, explicou a arqueóloga.

A comunidade de trabalhadores rurais criou o projeto Veredas da Caatinga que capacita 16 jovens do assentamento para que atuem como guias turísticos e especialistas nos sítios, na caatinga e na geografia local, buscando atualização sobre as mais recentes descobertas científicas. Os jovens guiam turistas, estudantes e pesquisadores por uma trilha de até 5km, visitando alguns dos 18 sítios já descobertos na área, além de lindas formações rochosas e fauna e flora particulares do bioma da caatinga – único exclusivamente brasileiro.

Em reunião com a comunidade, os coordenadores da FPI – procuradores da República Juliana Câmara e Érico Gomes, e promotora de Justiça Lavínia Frangoso – conheceram as particularidades do assentamento, que tem desenvolvido diferentes cultivos por meio da agricultura familiar de base agroecológica, com produção de mel, doces, raízes, além da caprinocultura e outros animais de pequeno porte. Atualmente são 30 famílias vivendo do assentamento e manifestando orgulho pelo cumprimento da função social do assentamento.

No entanto, foram iniciadas discussões sobre possibilidades de fomento a políticas públicas para incremento do desenvolvimento experimentado pela comunidade de assentados. Ficando claro que haverá desdobramentos por parte da fiscalização.

Movimento Sem Terra em Alagoas* – O assentamento Lameirão resultou de intensa luta política dos trabalhadores rurais, no início de 1989, quando a área foi, então, ocupada. Na época, o Movimento Sem Terra (MST) se estabelecia no Estado e começava a organizar os trabalhadores para a conquista da terra. Todavia, os trabalhadores estavam organizados enquanto Sindicatos de Trabalhadores Rurais e nas Pastorais da Igreja Católica. Mesmo sob o comando de forças políticas conservadoras, o Governo do Estado, após intensa pressão popular, resolveu adquirir as terras no final daquele ano.

A partir da ação de ocupação foram assentadas 26 (vinte e seis) famílias, em uma área total de 1.643,00 hectares, situada em plena caatinga. O assentamento localiza-se na mesorregião do Sertão Alagoano, microrregião Alagoana do Sertão do São Francisco, município de Delmiro Gouveia. A partir de então, passaram a ocorrer investimentos de infraestrutura do imóvel e os assentados organizaram a Associação de Cooperação Agrícola do Assentamento Lameirão, entidade representativa e administradora da comunidade.

História – Sem imaginar a importância do local que escolheu como abrigo quando ingressou no sítio Lameirão, em 1989, Girlene dos Santos, de 65 anos, integrante do MST, escolheu “Delmiro 17” como teto até que casas começassem a ser erguidas pelo movimento. No local teve dois filhos, onde também criou outros cinco que chegaram com ela ao acampamento improvisado pela formação rochosa.

Viveram por um período embaixo da pedra com pinturas rupestres, sobrevivendo da agricultura e de doações, até terem sua casa no assentamento. Sua filha, Geine Cizino Costa, de 40 anos, lembra da infância dormindo embaixo da pedra. "Eu era muito feliz. Tinha comida, tinha tudo que a gente precisava, e é só disso que criança precisa", relatou.

*Com informações do Projeto Vozes do Sertão