Interior

Agricultores de Alagoas ganham autonomia financeira após execução de projeto

Atualmente 2.101 famílias são atendidas pelo Projeto Dom Helder Câmara em 43 municípios, beneficiando 9.700 pessoas

Por Ana Paula Omena com Tribuna Hoje 05/05/2020 11h50
Agricultores de Alagoas ganham autonomia financeira após execução de projeto
Reprodução - Foto: Assessoria
Já pensou em sobreviver com apenas uma média de R$ 89 por mês? Pois é, essa era a realidade de famílias em comunidades rurais do Alto Sertão de Alagoas antes da chegada do Projeto Dom Helder Câmara (PDHC), que atua no estado com o público voltado à vulnerabilidade social, que vive abaixo da linha da pobreza e com insegurança alimentar. A meta de atendimento do projeto no estado é de 3.768 famílias em 47 municípios. Atualmente são 2.101 famílias atendidas em 43 municípios, beneficiando diretamente 9.700 pessoas, com acesso a recursos de R$ 2.400, utilizados na implantação de projetos produtivos construídos em conjunto com os técnicos da Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater). Com pouco menos de dois anos em Alagoas, a segunda fase do Projeto Dom Helder Câmara vem gerando frutos de sucesso, tendo como referência famílias que hoje sobrevivem da agricultura e recebem até grupos para expressar experiências exitosas na localidade. [caption id="attachment_372964" align="aligncenter" width="500"] Avicultura de Postura no Alto Sertão de Alagoas (Foto: Cortesia)[/caption] Um dos exemplos da evolução do projeto em Alagoas vem da família do jovem rural, Valdemir Santos, de 23 anos, que com orgulho diz que a renda da casa saltou para mais de 131% com a chegada do programa. Para ele, superação é a palavra de ordem, na pequena propriedade no município de Água Branca, no Alto Sertão, onde vive com seus pais e uma irmã. O rapaz contou que hoje, eles já produzem e comercializam ovos, através da Avicultura de Postura (criação de aves para produção de alimentos) e com a renda vinda da agricultura, Valdemir consegue pagar até a sua faculdade à distância no curso de ciências biológicas. A propriedade dele é uma unidade de referência, sendo exemplo de visitação para todos os públicos. [caption id="attachment_372991" align="aligncenter" width="700"] Produção de ovos de caipira fez crescer renda de famílias no sertão (Foto: Cortesia)[/caption] Valdemir também relatou ainda que antes do projeto havia muitas dificuldades, mas a mudança aconteceu com a chegada dos programas e assistências técnicas. “Com a ajuda do projeto e da Emater conseguimos ingressar no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e venda avulsa dos ovos caipira. A renda da minha família aumentou muito mesmo, antes a gente vivia com R$ 342”, contou. “Aprendi a administrar a produção, fazer planilhas de produção todos os meses graças aos programas”, contou orgulhoso. Na propriedade há também plantações de hortaliças que servem de alimento para a família e para as aves, como: pimentão, alface, pimenta de cheiro, coentro, pepino e maxixe. PANDEMIA Mas como nem tudo são flores, em vídeo, o jovem agricultor ressalta que a família precisou se reinventar durante a crise pandêmica do novo coronavírus (Covid-19) e frisou que conta com a ajuda da solidariedade para vender os produtos produzidos no campo. Assista vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=COj_ax2sm7g&feature=youtu.be Conforme o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), essa recessão afetará desproporcionalmente os mais vulneráveis e os pobres, refletindo numa dramática reversão no cenário de conquistas na redução da pobreza. Para evitar o grande sofrimento na região, o FIDA defende que governos, sociedade civil e organizações internacionais unam-se para enfrentar a crise. A boa notícia para a família de Valdemir e milhares que sobrevivem da agricultura familiar é que, no início do mês passado (abril), ministros e secretários de Agricultura, Alimentação e Desenvolvimento Rural de 26 países da região da América Latina e do Caribe divulgaram uma declaração sobre a Covid-19 e os riscos para as cadeias de suprimento de alimentos. O FIDA está comprometido a ajudar os países da região a diminuir esse impacto, principalmente nas áreas rurais em que a instituição trabalha como parceira há mais de 40 anos. O Fundo começou a realizar consultas remotas rápidas com os governos com quem trabalha, comprometendo-se a manter contato contínuo. Através dessas consultas, o FIDA já identificou maneiras para contribuir com os esforços para lidar com a crise, principalmente ajustando e reorientando projetos em andamento, sempre que possível. US$ 34,9 MILHÕES Já foram identificados US$ 34,9 milhões em fundos de resposta rápida para os governos alocarem de acordo com a necessidade de seu país. Em vários casos, esses fundos permitem que os governos estendam a vida útil dos projetos em andamento, de maneira que possam utilizar a experiência e conhecimento das equipes do FIDA para continuar apoiando agricultores familiares em perigo. Os projetos que estão atualmente sendo implementados já estão apoiando iniciativas que ajudarão os agricultores familiares a manter seus empregos e empresas, enquanto apoiam suas comunidades fornecendo alimento. ATUAÇÃO DO PDHC [caption id="attachment_372975" align="alignleft" width="500"] Assinatura do termo de execução do Projeto Dom Hélder Câmara, em 2017 (Foto: Ascom/Seagri)[/caption] O Projeto Dom Helder Câmara (PDHC), criado em 2001, atua em 913 municípios em 11 estados da federação: Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe, com a expectativa de prestar serviços de assistência técnica e extensão rural por cerca de três anos a aproximadamente 60 mil famílias. Suas ações beneficiam diretamente em torno de 126 mil pessoas. Conforme Fabiana Viterbo, coordenadora do Programa Semear Internacional, ao longo de sua atuação, o projeto se consolidou por desenvolver uma proposta de assessoria técnica permanente, multidimensional, diferenciada, concebida como uma ação contínua e sistêmica, focada nas demandas, objetivos e áreas de resultado de interesse das famílias beneficiárias e referendadas em posicionamento técnico e avaliações participativas que garantem a viabilidade das proposições apresentadas. O PDHC é desenvolvido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em conjunto com a Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater) e várias instituições que prestam serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater), por meio de um acordo de empréstimo firmado entre o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) e o governo brasileiro. A segunda fase do programa foi iniciada em 2017, após renegociação com o FIDA. Nesta fase, o projeto tem como objetivo atender 74 mil famílias nos 913 municípios que integram 11 estados brasileiros: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe (Nordeste), Minas Gerais e Espírito Santo (Sudeste). Em Alagoas, projeto concentra ações no sertão alagoano A lista de municípios alagoanos atendidos pelo Projeto Dom Helder Câmara é vasta e importante de ser citada; entre as 43 cidades estão: Água Branca; Quebrangulo; Arapiraca; Santana do Ipanema; Batalha; São Brás; Belo Monte; São Jose da Tapera; Cacimbinhas; São Sebastião; Canapi; Senador Rui Palmeira; Carneiros; Taquarana; Coite do Noia; Traipu; Craíbas; Delmiro Gouveia; Dois Riachos; Estrela de Alagoas; Feira Grande; Girau do Ponciano; Igaci; Inhapi; Jacaré dos Homens; Jaramataia; Lagoa da Canoa; Major Isidoro; Maravilha; Mata Grande; Minador do Negrão; Monteirópolis; Olho D’água das Flores; Olho D’água do Casado; Olivença; Ouro Branco; Palestina; Palmeira dos Índios; Pão de Açúcar; Pariconha; Piranhas; Poço das Trincheiras; e Porto Real do Colégio. O principal objetivo do projeto é garantir o sustento das famílias, de acordo com a aptidão de cada agricultor. A técnica de campo da ATER (Assistência Técnica e Extensão rural) no Alto Sertão, Tanihely Costa, destaca que os agricultores participam de políticas públicas, como exemplo, para garantir a safra e são beneficiários do PAA – Programa de Aquisição de Alimentos. “Apesar de o projeto ser de curto prazo está dando muito certo, gerando retorno da economia financeira e autonomia das famílias de não ter despesas fora da propriedade, eles vendem apenas o excesso dos produtos, a sobra, o resto é para consumo próprio”, frisou. “O projeto está melhorando a qualidade de vida das famílias agricultoras tendo um retorno financeiro que antes não tinha, elas até já comercializam na feira da cidade, na própria casa com encomendas e de porta em porta”, revelou em tom de felicidade a técnica em entrevista ao Tribuna Hoje. Ainda de acordo com Tanihely Costa, há famílias que além de estarem comercializando seus próprios produtos por meio da terra, buscam a implementação da infraestrutura através do Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), bem como a instalação de equipamentos, aprisco para animais, entre outros.  Ela diz ainda que a situação do campo é acompanhada individualmente com toda a assistência técnica necessária. Fogão agroecológico de mãos dadas com o agricultor   Três agricultoras alagoanas em Água Branca, no sertão do estado, estão trabalhando na plantação da mandioca, sendo ensinadas no que diz respeito ao plantio até a colheita. E mais, elas também receberam todas as orientações necessárias para a construção do fogão agroecológico, isso mesmo, a tecnologia social no semiárido, está ajudando na fabricação de bolos artesanais, farinha e bolos, quando antes era usado fogão a lenha, não adequado para a realidade. [caption id="attachment_372965" align="aligncenter" width="500"] No dia da construção do fogão agroecológico (Foto: Cortesia)[/caption] “As execuções e atendimentos são em cima da sustentabilidade por meio da agroecologia, aproveitando de todos os recursos que os agricultores dispõem na própria natureza dentro da propriedade”, salientou a técnica de campo. Segundo Tanihely Costa, o fogão agroecológico foi construído com a orientação de um técnico que trouxe uma série de benefícios para as famílias agricultoras, sobretudo o não desmatamento da natureza pela extração da madeira ilegal, como também a fumaça inalada que causa problemas respiratórios, alergias, entre outros agravantes para a saúde. [caption id="attachment_372966" align="aligncenter" width="700"] Agricultoras vendem tapioca, bolo e farinha, tudo da mandioca, na feira livre de Água Branca (Foto: Cortesia)[/caption] Giselma Lima disse que antes do projeto passava por dificuldade financeira, mas após o projeto sua autoestima foi elevada. “Hoje tenho meus clientes certos e tenho participado de seminários que os técnicos da Emater me convidam”, mencionou. “Antes eu fazia uma média de 20, pé de moleque (bolo na palha da banana), hoje faço quase 300 por semana, graças aos projetos, Além de outros tipos de bolos”, destacou. Na pequena propriedade onde mora com o esposo e três filhos, Giselma não esconde a alegria em poder desenvolver os produtos e comercializá-los. As agricultoras percorrem oito quilômetros até a feira do município a bordo de transporte alternativo todas as segundas-feiras e voltam para casa com o retorno da sua força de trabalho. https://www.youtube.com/watch?v=UcvOHmWKPkc TERRITÓRIO DA CIDADANIA Oito municípios alagoanos participam de reuniões pelo Território da Cidadania na cidade de Delmiro Gouveia e envolvem comunidades, cooperativas, lideranças, sócios, instituições, secretários de agricultura, onde são divulgados os projetos que são bem-vindos. A técnica de campo da ATER (Assistência Técnica e Extensão rural) no Alto Sertão, Tanihely Costa, explica que inicialmente foram feitas visitas, e através delas, identificadas as famílias de agricultores que tinham potencial e que se enquadravam nos critérios: abaixo da linha da pobreza, renda per capita de R$ 89, cadastro no CAD único, e com Declaração de Aptidão do Pronafe. “A partir de então foram dados acompanhamentos e assistências técnicas conseguindo alcançar o sucesso atual”. “É gratificante ver que hoje o agricultor tem uma autonomia financeira e está acessando as políticas públicas que é de direito deles”, salientou. O PAPEL DA ATER NO PROJETO A Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) é o eixo central do Projeto Dom Helder Câmara, com foco em qualificar os sistemas produtivos locais, contribuindo com o repasse de conhecimento aos produtores, com a difusão de tecnologias sociais (boas práticas) e otimizando as políticas públicas e programas públicos voltados para a produção sustentável. O atendimento às famílias de Alagoas é feito por duas empresas: a Associação de Orientação às Cooperativas do Nordeste (Assocene), que atende 1.287 Unidades Familiares de Produção Agrícola (UFPAs), e pelo Instituto de Inovação para o Desenvolvimento Rural Sustentável (Emater-AL), que atende 815 unidades. As empresas realizam atividades coletivas de formação e apoiam na formulação de projeto para melhoria produtiva do agricultor familiar. Entre as atividades previstas nos contratos das empresas de Ater, feitos sempre via Anater, para realização junto aos agricultores estão: mobilização e seleção de beneficiários; cadastro e diagnóstico de UFPA; diagnóstico comunitário; planejamento de Projeto Produtivo para UFPA; identificação de Unidade de Referência; curso e projeto de Comercialização Institucional; oficinas (temáticas: políticas públicas, etnodesenvolvimento, divisão de gênero no trabalho, gênero e auto-organização e juventude); visitas técnicas às famílias; atendimento individual de Ater ao produtor; atendimento coletivo (associações/grupos); e promoção de intercâmbios nas unidades de referência. PROJETO DOM HELDER CÂMARA O Projeto Dom Helder Câmara, iniciado em 2001, tem como objetivo desenvolver ações referenciais de combate à pobreza e apoio ao desenvolvimento rural sustentável no semiárido do Nordeste. Embasado no conceito de integração ecossistêmica, o projeto, que atualmente se encontra na sua segunda fase, articula as dimensões sociais, políticas, ambientais, culturais e econômicas do território, utilizando-se de processos participativos de planejamento, do uso de tecnologias sociais compatíveis e da aplicação de uma gestão integrada. Pela amplitude territorial de atuação do projeto, suas ações contam com a participação de diversos agentes e instituições, cada uma delas colaborando de forma extremamente relevante para consolidação dos seus objetivos.