Esportes

O sonho de ser jogador profissional de futebol

Pais investem e incentivam filhos em busca de carreira promissora nos gramados

Por Texto: Daniele Soares - Colaboradora com Tribuna Independente 01/09/2018 11h45
O sonho de ser jogador profissional de futebol
Reprodução - Foto: Assessoria
Qual menino um dia não sonhou em ser jogador de futebol? Esse é o desejo de milhões de crianças, e em Alagoas não é diferente. Ronaldinho, Mateus, Carlinhos e Luiz são quatro craques mirins que estão literalmente correndo em busca desse sonho. Atualmente eles estão em times fora do estado. E os pais investem e dão o maior incentivo para concretizar o desejo de um dia eles serem jogadores de futebol. Ronaldo Cardoso, conhecido como Ronaldinho Alagoano, tem apenas 12 anos e já é um grande destaque dentro dos campos. Os pais viram que ele gostava de futebol quando na festa de um ano, com o Tema Vasco da Gama, a bola de isopor que estava decorando o local, chamou a atenção do pequeno. De acordo com a mãe do craque, foi a partir daí que a vida de jogador de Ronaldinho começou. “Ele não queria saber de mais nada. Nenhum brinquedo chamava mais atenção que as bolas. Então aos quatro anos ele iniciou em uma escolinha de futebol de um projeto social do bairro. Aos cinco anos ele participou do seu primeiro campeonato pelo CSA. Lá ele ficou por dois anos. Em seguida, uma escolinha franqueada pelo time dos Santos deu uma bolsa pra ele, foi quando ele ficou mais visto e participou de mais campeonatos”. Com Mateus Souza não foi diferente. Muito cedo ele demonstrou interesse por futebol e ao ver que o filho tinha jeito para jogar, os pais começaram a investir no garoto. Vladimir Souza, pai de Mateus, conta como foi o início da jornada. “Mateus começou com seis anos na escolinha do Vasco, uma franquia em Maceió, onde está até hoje. Ele já participou de campeonatos no Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e em Alagoas, e desde os três anos que ele demonstrou gosto pela bola” diz o pai do craque mirim. De “peneira em peneira”, garoto chega a grandes clubes Para tornar esse desejo possível, muitas dificuldades tiveram de ser enfrentadas pelas famílias dos pequenos jogadores. Distância e dinheiro são fatores que sempre falam mais alto, mas nunca foram motivos maiores para eles pensarem em desistir. Segundo Manuela Cardoso, mãe do Ronaldinho Alagoano, o início foi bem complicado. “Às vezes nem passagem nós tínhamos pra ele ir ao treino. Aos nove anos ele participou da primeira peneira e depois fez diversas avaliações em times de grande porte como São Paulo, Flamengo, Santos e Vasco. Em todas Ronaldinho passou, porém, devido a nossa situação financeira, não tivemos como permitir que ele continuasse nos times e ele sempre voltada pra Alagoas“, afirma. A mãe também explica como a situação mudou. “As viagens estadias e alimentação sempre foram por nossa conta, com muito aperto. As coisas só começaram a melhorar quando montamos nosso próprio negócio. A partir daí investimos mais em nosso filho. Contratamos um nutricionista esportivo e um personal para acompanhar o Ronaldinho. Atualmente ele está no Sub12 do Grêmio, de Porto Alegre, e fica numa pensão com outras crianças sendo cuidado por uma mãe de aluguel. Meu marido e eu estamos vendendo o carro e a loja e vamos nos mudar pra ficar perto dele e acompanhá-lo em todas as etapas” informa Manuela. Vladimir Souza pai de Mateus, afirma que com eles também não é diferente. “Eu e minha esposa vamos revezando nas viagens de três em três meses pra sempre um de nós ficar acompanhando ele. Queremos presenciar todas as etapas. Quanto aos gastos, os pais de Mateus também arcam com tudo sozinhos. “Somos comerciantes, e todos os gastos tanto com  viagens  e demais despesas são investimento próprio. É muito dispendioso, não é fácil, mas estamos acreditando no sonho dele porque ele tem capacidade” afirma o pai. Ronaldinho Alagoano desde 9 anos participa de 'peneiras' em times de grande porte do País (Foto: Arquivo pessoal) São poucos os meninos que conseguem se tornar profissionais do futebol. E um grande problema que atormenta pais e profissionais é de como a criança lida com a reação negativa. Para os familiares dos pequenos jogadores, tratar esse assunto é algo primordial para a saúde de ambos. A mãe de Ronaldinho diz que desde o início conversa com o filho. “Só daqui a quatro anos que ele será revelado como profissional. Agora está tudo bem, mas a gente não sabe como vai ser lá na frente. Muita coisa pode acontecer e nós temos muito medo dele não ter o mesmo rendimento que está tendo hoje. É uma mistura de sentimentos, sabemos que essa área tem muita coisa. A gente vem preparando ele, o mantendo na igreja, pra quando ele realizar o sonho ter os pés no chão. Muitos jogadores têm carreira brilhante, mas acabam ficando sem nada porque deram mais atenção às mulheres, festas e bens materiais. Não queremos isso pra nosso filho. O sonho dele é ser jogador e nós como pais devemos apoiar, mas caso não aconteça, também estaremos com ele”, enfatiza. A Manuela ainda externa como é ser mãe de um jogador com o futuro tão promissor. “É muito gratificante. Por escolha dele, ele renunciou muita coisa que deveria viver na infância. Então a gente pensa em sempre ajudar pra ele realizar esse desejo que também é nosso. Até fã clube já fizemos. E sempre depois das partidas comemoramos com churrasco pra ele realmente se sentir um jogador profissional. Tenho certeza que é um dom e que será realizado muito brevemente,” finaliza a mãe. Para Vladimir a maior preocupação é tornar Matheus um bom cidadão, tanto no futebol como na vida. “É o sonho dele e vamos correr atrás até onde der. Nós preparamos a cabeça dele para as decepções, para os nãos como também para os sins, tanto no futebol como nos projetos pessoais da vida dele. Ver a possibilidade dele se tornar um atleta profissional será um prazer imensurável, porque vemos que ele tem capacidade de chegar. Como pais, só nos resta investir, acreditar principalmente e dar os meios possíveis pra ele alcançar esse sonho dele” explica. Futebol está no sangue Carlos Hermano, de 12 anos, e Luiz Miguel, de 9 anos, são irmãos e já estão bem encaminhados no futebol profissional. Eles estão atualmente sendo monitorados pelo time do Corinthians e, se tudo der certo, brevemente serão contratados para a base do time paulista. Para chegar onde estão, passaram por peneiras onde um avaliador do time gostou do futebol de ambos e os convidou para participar de um campeonato são paulino. De acordo com Fabiana Maria, mãe dos jogadores, o futebol de seus filhos se deve à genética. “O histórico da minha família é de ex-jogadores que vários clubes nacionais, estaduais e internacionais. Acredito que seja genético e já esteja no sangue dos meus filhos. O avô paterno deles já foi jogador de futebol, o pai dele também já jogou pelo Corinthians. Aí também tem a minha família que também tem vários jogadores. Meu primo estava a pouco tempo no São Paulo, meu tio já foi do CRB e eu acredito que isso colabora muito sim. O futebol também é hereditário”, afirma a mãe dos pequenos craques. Luiz Miguel, de 9 anos, (na foto acima com a bola) (Foto: Arquivo pessoal) Ainda conforme a mãe dos garotos, nem ela nem a família forçou os filhos a irem por esse caminho. Foi um interesse que surgiu de forma natural. “Meus dois filhos desde pequenos gostam de futebol. Quando vimos, colocamos eles numa escolinha de futsal. Em 2014 o mais velho participou de uma peneira e começou a ser monitorado pelo clube do Corinthians, onde está até então. Este ano, os dois foram novamente convidados pelo clube para participarem do campeonato estadual. Estamos aguardando, mas está quase certo deles irem morar em São Paulo” esclarece. Fabiana e o marido, assim como as demais famílias, também precisaram abrir mão da vida que levavam em Maceió para colaborar com o sonho dos dois filhos. “Minha rotina mudou um pouco. Antes eu trabalhava, hoje devido as viagens eu precisei ficar disponível pra eles e caso sejam selecionados eu e meu marido iremos embora pra São Paulo morar com eles, lá. Carlos Hermano, de 12 anos, e Luiz Miguel são irmãos e já estão bem encaminhados no futebol profissional (Foto: Arquivo pessoal) O futuro incerto também é algo que faz os pais de Carlos e Luiz refletirem. Porém, a vontade de vê-los como profissionais é uma motivação a mais. “Meu esposo e eu, além da minha família, estamos sempre falando com eles, deixando claro os prós e contras dessa trajetória. Incentivamos e torcemos muito, mas estamos com eles pra escolha que tomarem ou o que acontecer no futuro. Vejo que jogar pra eles não é uma obrigação e sim um divertimento. Então continuamos a apoiar os dois e o futuro a Deus pertence,” finaliza. Exigência é muito alta e decepção sempre acontece A negação na hora da seleção não é uma situação compartilhada apenas com os pais. As escolinhas de futebol também participam desse momento. De acordo com o empresário Alex Barros, proprietário da escolinha de futebol Futuro da Colina Maceió, franquia do time do Vasco-RJ, em Maceió, não existe matemática exata na hora de seleção dos jovens. “Temos peneira oficiais nas quais os meninos passam por uma avaliação. Para serem chamados eles realmente precisam ter uma boa desenvoltura, porque o nível dessas seleções é muito alto. Neste momento estou com oito garotos no Rio de Janeiro. Entre eles têm meninos que vieram ano passado, como também tem outros que no ano passado não estavam tão preparados como hoje, mas dessa vez vieram. É assim. Depende da desenvoltura do momento”, esclareceu. Para o empresário de futebol Alex Barros, não existe matemática exata na hora de seleção dos jovens (Foto: Arquivo pessoal) O empresário ainda informa como a equipe técnica lida com a situação negativa. “Na escolinha a gente ensina as crianças a jogar futebol, mas, além disso, nosso foco principal é formar cidadãos. Nossa equipe técnica trabalha o desempenho físico dentro do campo, mas também trabalha com o motivacional e emocional. Ela é orientada a sempre conversar e mostrar a realidade aos garotos. É duro, mas eles precisam entender que existe a possibilidade de não ficarem. Quanto aos pais, a gente tenta da melhor forma passar um feedback construtivo em relação ao desempenho dos filhos. A intenção é que os meninos melhorarem na desenvoltura, mas caso não aconteça, também somos francos” disse o empresário Alex. Como lidar com a negação? Confiança é ponto-chave da situação Conforme a psicóloga infantil, Larisse Farias, o momento da frustração pode ser uma grande oportunidade para que a criança desenvolva confiança, competência e domínio. “A formação da autoconfiança é de extrema importância para o desenvolvimento cognitivo da criança e é ela que, desde cedo, propõe ajudar no relacionamento socioafetivo, a enfrentar desafios e encará-los com coragem”, explica Clarisse, que também aborda quais são os passos que irão favorecer a criança na formação da sua autoconfiança e que os pais não só podem, como devem segui-los para ajudar seus filhos:   -> Validar seus avanços e conquistas é um dos passos primordiais. Sempre busco isso no consultório com objetivo de alcançar um bom desenvolvimento infantil. Saber validar, elogiar, demonstrar reconhecimento sobre os avanços positivos, ajuda a motivar e criar a confiança. Procurar reforçar aquilo que foi bom é saber que irá se repetir mais facilmente e a criança se orgulhará de si.  Também devem encorajá-la a enfrentar as dificuldades. Através de palavras, gestos e olhares, como: “Muito bem”; “Parabéns”; dentre outros.   -> Trabalhar com a resiliência desde cedo é importante para trabalhar o desenvolvimento socioemocional da criança. Fazendo com que ela possa ter a capacidade de lidar com seus próprios problemas, autocontrole e administração da ansiedade. Dessa forma ela vai lidar com tudo de uma forma bem mais leve, conseguindo vencer obstáculos e não ceder à pressão seja qual for a situação.   -> Os avanços, sucessos e metas alcançadas, precisam ser comemorados junto com a criança. Os pais devem demonstrar que reconhecem o crescimento da criança, ela estará evoluindo e assim sempre ganhará confiança nela mesma. Se falhar, incentivar a não desistir e tentar outra vez: “você tentou, muito bem! Mas não deu certo dessa vez. Tente novamente”. Costumo dizer para os pais pensarem neles como espelhos, ser sempre um modelo positivo “Qual reflexo vocês querem para seus filhos?”, é nesse espelho onde o filho irá enxergar e tomar como modelo para construir sua formação de personalidade. Ele sempre estará observando os pais em cada gesto, comportamento, bem como fortalecendo suas emoções. A criança aprenderá junto com eles.   -> É necessário estabelecer uma rotina desde cedo, pois assim a criança consegue se sentir mais segura, protegida, confiante e no controle de seu mundo. Ela sabe que terá a hora de tomar banho, de fazer a tarefa, de brincar e dormir. Isso faz com que ela se prepare previamente para o que possa acontecer. Se esses eventos diários ocorrem de forma aleatória, podem gerar ansiedade pelo fato de a criança não saber o que irá ocorrer. Quando já sabe o que esperar, sente-se leve e livre pra brincar, crescer e aprender.   -> Na hora da brincadeira a criança tem a capacidade de aprender sobre si e sobre os outros, bem como a solucionar problemas e desenvolver confiança, dar asas à imaginação e elaborar papéis, ter bastante criatividade, fazer novas amizades e demonstrar sentimentos.   -> Deixar que elas aprendam a resolver problemas é também fundamental para que obtenha a capacidade de buscar soluções. Os pais não devem solucioná-los para que, assim, possam fornecer uma possibilidade de os filhos sentirem-se bem sucedidos. Fornecer dicas e sugestões é sempre válido, mas jamais fazer pela criança. O objetivo é guiá-la e apoiá-la nos esforços para solução de problemas, mas não fazer por ela o que a própria tem capacidade de conquistar por si.   -> É preciso tornar a criança responsável. Para cada idade existem Atividades de Vida Diária (AVD) disponíveis para estabelecer essa responsabilidade e fazer com que ela se sinta útil, importante e confiante.  Pontua a psicóloga infantil Larisse Farias.