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Atores e atrizes alagoanos falam da potência do filme 'Ainda Estou Aqu'

Eles creem que o longa-metragem brasileiro pode conquistar pelo menos um Oscar neste domingo

Por João Dionísio Soares - Editor de D&A / Tribuna Independente 01/03/2025 08h20 - Atualizado em 01/03/2025 08h34
Atores e atrizes alagoanos falam da potência do filme 'Ainda Estou Aqu'
Chico de Assis: 'é um filme maduro, grande, magnífico e bem cuidado' - Foto: Edilson Omena

Não há dúvidas de que o filme "Ainda Estou Aqui" é um marco na trajetória do cinema brasileiro. Desde o movimento do Cinema Novo, que revolucionou a cinematografia nacional nas décadas de 1960 e 1970, passando pela chamada Retomada do Cinema Nacional com o longa Carlota Joaquina (1995) até os potentes Central do Brasil (1998) e Cidade de Deus (2002), ambos com indicações ao Oscar, nenhum longa-metragem totalmente falado em português fez uma trajetória internacional tão impactante como o longa que traz a talentosíssima Fernanda Torres vivendo a história de Eunice Paiva, que lutou contra as sequelas deixadas pelo regime militar que devastou centenas de famílias no Brasil.

Neste domingo (2), "Ainda Estou Aqui", indicado ao Oscar nas categorias de Melhor Filme, Melhor Atriz e Melhor Filme Internacional, dá mais um passo nesse caminho marcado por sucessos, prêmios e aplausos dos mais diversos setores da indústria cinematográfica internacional. O longa já abocanhou o Green Drop Award, Melhor Diretor para Walter Salles, Globo de Ouro de Melhor Atriz em Filme Dramático, Satellite Award de Melhor Atriz em Filme de Drama, Festival de Veneza: Melhor Roteiro, e Prêmio Goya de Melhor Filme Ibero-Americano. E, como se isso não bastasse, ninguém menos que Martin Scorsese escreveu um e-mail para Walter Salles parabenizando pela obra.

O D&A entrevistou atores, atrizes e diretores alagoanos que possuem a árdua tarefa de fazer cinema e arte em Alagoas. Para eles, a potência do filme, com a temática tão delicada para a história do país e o talento da interpretação contida e necessária do filme, fez o sucesso do longa. Eles acreditam que o filme pode trazer uma estatueta do prêmio cinematográfico mais popular do cinema internacional.

Para a atriz, diretora, produtora e fundadora do Theatro Homerinho, Ivana Isa, esta é “Uma obra poderosa, que se destaca por abordar a complexidade emocional trazida pela ditadura militar para os brasileiros. O filme vai além da história de uma mulher tentando reconstruir sua vida em meio ao caos e ao desalento. Ele serve como alerta para o que a opressão política pode causar e ressalta a luta pela liberdade. Olhe como o filme, com um recorte da história, faz conexão com temas atuais como a luta contínua por direitos de cada cidadão. O filme retoca feridas ainda abertas e, ao mesmo tempo, alerta que outras, de outras maneiras, ainda podem ser abertas”, disse a alagoana que acaba de fundar um teatro em Maceió e hoje pode ser a realizadora cultural mais importante de Alagoas.

Para o multifacetado ator Chico de Assis, que tem no currículo peças teatrais, participações em novelas e filmes, o longa tem maturidade e magnitude que mostram os motivos dos importantes saltos dados pelo cinema brasileiro além das fronteiras do país. “Esse filme traz um olhar para o cinema brasileiro que vem se construindo gradualmente, e agora, Ainda Estou Aqui chega ao ápice desse caminho, e os prêmios são uma mostra desse reconhecimento. É um filme maduro, magnífico e bem cuidado em todos os detalhes."

Para o premiado cineasta alagoano, Alex Walker, Ainda Estou Aqui é um filme urgente e forte, e assisti-lo foi uma experiência arrebatadora. Ele ainda ressaltou que a interpretação contida de Fernanda Torres deu contornos à potência do filme. “Essa história não poderia ser mais urgente. Vivemos tempos em que o fantasma da ditadura voltou a assombrar o Brasil. Sofremos um ataque direto à democracia, vimos discursos autoritários ganharem força e acompanhamos de perto a tentativa de um golpe de Estado. O Brasil quase reviveu seu pior pesadelo. E é por isso que Ainda Estou Aqui é mais do que um filme: é um lembrete necessário, uma ferida aberta que nos obriga a olhar para trás para que não repitamos os erros do passado”, disse.

Ele ainda ressaltou a importância de Fernanda Torres para o filme. “A interpretação de Fernanda Torres ressoou em mim e percebi que segurou o choro com um pilar de força gigantesco, e essa contenção foi tão poderosa que atravessou a tela, me atravessou ali, na poltrona, e fez com que eu segurasse o meu também. Foi um silêncio cheio de dor, mas também de resistência. Isso me lembrou Antígona, a tragédia grega. Como a personagem que desafia o poder para honrar a memória de um irmão morto, Ainda Estou Aqui nos joga diante da brutalidade de um tempo que tentou apagar vidas e histórias. Mas, assim como Antígona, Eunice Paiva, vivida por Fernanda Torres, não se curva. Sua força está na recusa em ceder, no luto transformado em luta, na dor contida que se impõe como testemunho”, afirmou Alex.

Ele ainda completou que “a interpretação de Fernanda Torres é um espetáculo à parte. Enquanto muitas atrizes concorrentes ao Oscar entregam atuações grandiosas, explosivas, repletas de gritos e lágrimas, ela faz o oposto: constrói um drama sem se render ao melodrama. A contenção é sua maior força. O ápice de sua atuação está exatamente no não dito, no olhar que carrega um peso impossível de medir, na dor que se impõe sem precisar de desespero. É um trabalho de precisão cirúrgica, um domínio absoluto da emoção. E a consagração desse filme no circuito internacional reforça o que já deveríamos saber há muito tempo: o cinema brasileiro tem um lugar de direito no mundo. As indicações ao Oscar, a aclamação em festivais, tudo isso só confirma que contamos histórias como ninguém. E essas histórias precisam ser ouvidas. Ainda Estou Aqui não é apenas um dos melhores filmes do ano. É um filme necessário. E, mais do que nunca, o Brasil precisa ouvi-lo.”