Educação
Por conta de cortes, Universidade Federal de Alagoas pode parar até final deste ano
Reitora explica atual condição orçamentária da universidade devido aos cortes do governo federal
Com 32.679 estudantes nos cursos de graduação e pós-graduação, 1.515 professores e 1.682 técnicos-administrativos, a Universidade Federal de Alagoas (Ufal) sofreu um corte de recursos de R$ 23,4 milhões neste ano e o previsto para 2018 é alarmante: R$ 515 mil. Assim como as demais instituições de ensino superior federais, ela pode parar de funcionar. Diante desse quadro, a Tribuna Independente entrevistou, na última terça-feira (5), a reitora da Ufal Valéria Correia. Para a professora, é hora de a sociedade “abraçar as universidades públicas brasileiras”.
Tribuna Independente – Com esse corte de R$ 23,4 milhões no orçamento, há o risco de a Ufal parar?
Valéria Correia – Primeiro quero dizer que esses cortes não foram só para a Ufal e sim para todas as universidades. Para a Ufal foram 23 milhões e 400 mil em custeio e capital. Custeio é o que mantém a universidade funcionando, efetivando seus pagamentos diversos. Mas o corte mais forte foi em capital, que se destina aos investimentos, desde obras até compra de equipamentos. Esses recursos também são para a consolidação da expansão das universidades. No Sertão estamos sem equipamentos suficientes para os laboratórios de graduação do curso de Engenharia. Temos revisado os contratos de serviços, fazendo uma conta que é quase inexplicável: como diminuir os pagamentos sem implicar na diminuição de serviços. Temos conseguido, mas Ufal funciona até setembro com os recursos de custeio liberados até o momento, em torno de 70% do previsto. O Governo Federal prometeu liberar mais 15% em setembro, aí chegaremos a 85%.
Tribuna Independente – Esses 15% dariam para a Ufal funcionar até quando?
Valéria Correia – Daria para até o final deste ano. De forma precária e apertada, mas daria.
Tribuna Independente – Mas se o governo não cumprir a palavra...
Valéria Correia – Não só a Ufal, mas as outras universidades federais param de funcionar em setembro.
Tribuna Independente – Para tudo mesmo, aulas também?
Valéria Correia – É. Porque tem serviços essenciais como limpeza e segurança e aos poucos a gente vai parando. É parecido com o que aconteceu com a Uerj [Universidade Estadual do Rio de Janeiro], o caso mais emblemático, e as demais estaduais do Rio que estão praticamente fechadas. Não por greve, mas por não terem tem como funcionar. Eu não diria que é uma coisa imediata, mas aos poucos as federais podem parar. Existe uma possibilidade posta. Nossa preocupação maior com 2018. Na PLOA [Projeto de Lei Orçamentária Anual] só consta R$ 515 mil. Para ter uma ideia, em 2017 tivemos R$ 16 milhões. Se essa situação se confirmar, as obras em andamento terão de ser interrompidas. Como a do curso de Medicina em Arapiraca e a de Santana do Ipanema.
Tribuna Independente – Se confirmando somente esses R$ 515 mil, é uma volta à década de 1990 para a Universidade?
Valéria Correia – É. O retrocesso é muito grande porque o MEC [Ministério da Educação] vai fazer uma recentralização dos recursos para investimento. Com essa possibilidade, a gente teme que volte ao tempo do ‘balcão’, de mais recurso para uma universidade e menos para outra. É temerário nesse sentido. As universidades federais têm a autonomia universitária, que diz respeito também à gestão financeira...
Tribuna Independente – Mas esse contingenciamento põe abaixo essa autonomia...
Valéria Correia – Põe abaixo. Do ponto de vista do investimento, que é mais forte. Até mesmo para a aquisição de equipamento de informática. Para as universidades isso é uma perda considerável.
Tribuna Independente – Na Uerj, como a senhora citou, houve até problema em se pagar os salários. Há esse risco aqui também?
Valéria Correia – Não foi mencionado esse risco. O que a gente tem são alguns impasses em relação à contratação. Por exemplo, temos alguns cursos novos como Medicina [Arapiraca]; três cursos no Ceca [Centro de Ciências Agrárias]: Engenharia Florestal, Agroecologia, e Engenharia de Energia Renováveis; e alguns em Penedo, que ainda demanda de professores para os demais períodos. As vagas pactuadas não foram ainda integralizadas. O contrato não saiu.
Tribuna Independente – Mas já houve o concurso?
Valéria Correia – Não. Nem o edital foi liberado ainda. Nossas preocupações são também em relação aos cursos novos e às vagas pactuadas que não saíram. Essa preocupação é real em todas as universidades.
Tribuna Independente – Como a senhora vê o comportamento da comunidade acadêmica diante dessa situação, está apreensiva ou “anestesiada”?
Valéria Correia – Existe efervescência na universidade. Ontem [segunda-feira, 4]: nosso Conselho Universitário aprovou 11 cursos de pós-graduação, sendo 4 especializações latu sensu, 5 mestrados e dois doutorados. Veja, num período de desafios postos para a Universidade, esse gesto mostra o esforço hercúleo da comunidade em proporcionar formação contínua para a sociedade alagoana e brasileira.
Tribuna Independente – A senhora vê esse corte de recursos como uma forma de justificar a privatização das universidades federais?
Valéria Correia – Eu sou estudiosa da política de saúde e no processo de expansão das organizações sociais – que são entidades privadas que gerenciam a saúde – uma das justificativas era de que o modelo de gestão pública está esgotado e é preciso outra lógica, de terceirizar a gestão. Eu só posso demonstrar nossa preocupação com esse ataque com o corte de recursos com a educação superior e com essa apologia à possibilidade de cobrança [mensalidades]. Penso que o governo deu sinais de que o serviço público tem de ser limitado ao propor a PEC do limite dos gastos. Como nos próximos 20 anos as universidades públicas vão sobreviver? Tenho dito que é hora de abraçar a universidade pública brasileira. É tempo de mostrar uma agenda positiva sobre a importância das universidades públicas no Brasil para que a sociedade também as defendam.
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