Economia

Gestores podem responder por improbidade ao desrespeitarem “nova” Lei de Licitações

Legislação versa sobre exigência de publicidade em jornais de grande circulação diária para a administração pública

Por Valdete Calheiros - Colaboradora / Tribuna Independente 07/11/2023 07h59 - Atualizado em 07/11/2023 12h50
Gestores podem responder por improbidade ao desrespeitarem “nova” Lei de Licitações
Veja mais na íntegra, abaixo - Foto: Reprodução

Em Alagoas, muitos gestores públicos estão descumprindo à “nova” Lei de Licitações (nº 14.133/2021), em vigor há mais de dois anos. A legislação estabelece normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.

De acordo com o advogado especialista em Publicidade Legal e jornalista, Bruno Camargo Silva, todas as licitações feitas e anunciadas fora do que defende a Lei de Licitações não têm efeito jurídico e, por isso, podem ser anuladas. “Inclusive, todas as empresas que se sentirem lesadas por não terem participado dos processos licitatórios pela falta da devida publicidade legal podem e devem recorrer à Justiça pleiteando a nulidade do processo”, garantiu o especialista. (Confira vídeo no fim do texto)

A Lei de Licitações contém algumas mudanças em relação à legislação anterior, mas mantém a regra de publicidade legal para compras com dinheiro público, e em caso do seu não cumprimento, órgãos públicos podem ser punidos, com editais anulados e até constituição de improbidade administrativa.

Segundo Bruno Camargo, criar publicações digitais em páginas eletrônicas próprias é um meio encontrado pelos maus gestores públicos para burlar a lei. O advogado explicou que a simples criação de páginas online, em portais, é imprestável para substituir os jornais diários de grande circulação.

“A Lei não previu a publicação exclusivamente em ambiente digital. Some-se a isso o fato de a Lei não ter definido os padrões de segurança e acervo dos portais eletrônicos. Uma matéria divulgada em um portal digital pode ser facilmente alterada, a qualquer momento, fragilizando muito a validade das publicações”, considerou Bruno Camargo ao ressaltar que uma grande parte da população seria excluída da informação, pois não tem acesso à internet ou não sabe como acessar. Isto é, a publicidade dos atos oficiais em portais da internet, além de insegura, “esconde” os gastos públicos de uma grande parte da população.

Diálogo Competitivo

Diante desse cenário, com a “nova” Lei, algumas mudanças merecem destaque, como o fim da carta convite, da tomada de preços e do Regime Diferenciado de Contratação (RDC) como modalidades de licitação, além do surgimento de uma nova modalidade: o Diálogo Competitivo.

Na avaliação do advogado, muito embora a “nova” Lei de Licitações e Contratos esteja em plena vigência desde 1º de abril de 2021, a utilização é baixa, inclusive no âmbito das repartições públicas federais. “Isso porque, os servidores públicos e operadores de licitações nos órgãos públicos não se capacitaram ou, se o fizeram, não se sentem seguros. Além do mais, a prorrogação de vigência das Leis n. 8.666/93, 10.520/02 e 12.462/11é até o próximo dia 30 de dezembro”.

Até abril desde ano, para facilitar a transição, a “nova” Lei de Licitações ainda dialogava com as leis anteriores, parcialmente vigentes até àquele período. No entanto, de abril para cá os gestores públicos que ainda insistem em descumprir a Lei correm sérios riscos de serem julgados por improbidade administrativa.

Para o especialista, vale ressaltar que a regra das compras públicas será através de meios eletrônicos, fazendo com que os presenciais sejam exceção. O advogado Bruno Camargo também destacou a criação do Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), site oficial destinado à divulgação dos atos exigidos em sede de licitações e contratos administrativos.

Entretanto, em relação à publicidade dos avisos de licitações em jornais, as antigas normas foram mantidas. “Na prática, os órgãos públicos deverão continuar publicando em diários oficiais (da União, dos estados e municípios) e, também, em jornais de grande circulação – em nível estadual.

“A partir de 31 de dezembro deste ano, publicar de forma complementar em jornais de grande circulação na localidade em que está sediado o órgão licitante”, explicou Bruno Camargo que é professor de Direito Empresarial e Processual.

Conforme ainda a avaliação do especialista, a escolha do Diário Oficial ficará atrelada à origem da verba. “A licitação com o uso de recursos federais deve ser publicada no Diário Oficial da União (além do jornal de grande circulação e PNCP”, exemplificou. Bruno Camargo salientou os entes de direito privado que tiverem a pretensão de transacionar com a Administração Pública também deverão observar a “nova” Lei de Licitações.

Abralegal: É precisO informar objeto, local, data e hora da abertura do certame

A Associação Brasileira das Agências e Veículos Especializados em Publicidade Legal (Abralegal) – representada nessa reportagem pelo advogado Bruno Camargo – afirmou que o conteúdo das publicações se mantém o mesmo, sendo preciso informar objeto, local, data e hora da abertura do certame.

Tais procedimentos, justificou o advogado Bruno, garantem maior transparência e obediência ao Princípio da Publicidade. “Pois quanto mais clara fica a evidenciação do destino do erário, maior o controle social dos gastos públicos”, salientou.

As mudanças na legislação estão de olho às proposições legislativas que visem diminuir o controle da sociedade no tocante aos gastos públicos com a diminuição da transparência.

O não cumprimento da Lei no tocante às publicações oficiais acarretará algumas consequências. Conforme as explicações do advogado Bruno Camargo, a falta de publicidade constitui ato de improbidade administrativa, torna o processo licitatório nulo e induz o direcionamento de resultados.

Para o especialista, quanto mais ampla a divulgação, maior a possibilidade de aumentar o leque de concorrentes e, naturalmente, reduzir o valor a ser pago pelo Poder Público. “Substituir a publicação em jornais por quaisquer outras modalidades de divulgação é o mesmo que negar publicidade ao procedimento de licitação. Não há quaisquer ressalvas ou regras de exceções”, concluiu o advogado especialista no assunto.

Ainda segundo Bruno Camargo, está posta em lei, a obrigatoriedade de publicar em Diários Oficiais e de Grande Circulação. “Tanto a antiga Lei de Licitações quanto a nova são categóricas ao estabelecer a obrigatoriedade das publicações em diários oficiais e jornais de grande circulação, sem ressalvas ou exceções”, detalhou.

Primeiramente, é importante destacar, lembrou o advogado, que a obrigatoriedade de publicação em jornais oficiais e de grande circulação não é uma novidade trazida apenas pela “nova” Lei de Licitações. Essa exigência já estava prevista em legislações anteriores que tratavam de licitações. No entanto, a “nova” Lei de Licitações reafirma e reforça essa obrigação, deixando-a ainda mais explícita.

Bruno Camargo explicou que a transparência e a ampla divulgação dos procedimentos de compra com dinheiro público são princípios fundamentais da gestão pública.

“Nesse contexto, a publicação de avisos de licitações e extratos de contratos em jornais oficiais e privados de grande circulação desempenha um papel crucial na garantia da lisura e da legalidade dos processos licitatórios. A Lei de Licitações (Lei n. 14.133/2021) reforça essa obrigação, tornando-a ainda mais clara e robusta”, ensinou.

A “nova” Lei de Licitações, no artigo 54, § 1º, estabelece que é obrigatória a publicação de extrato do edital no Diário Oficial da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município, ou, no caso de consórcio público, do ente de maior nível entre eles, bem como em jornal diário de grande circulação. Essa disposição reforça a importância da publicação em jornais privados de grande circulação como parte essencial do processo licitatório.

“É importante ressaltar que a sociedade civil e órgãos de controle têm um papel fundamental na fiscalização dessas publicações, garantindo que elas ocorram de acordo com a legislação vigente. A Abralegal teve um papel crucial nesse contexto ao atuar junto ao Congresso Nacional para derrubar vetos presidenciais que poderiam enfraquecer a obrigatoriedade das publicações”, esclareceu Bruno Camargo.

Segundo o advogado, o resultado desse esforço foi a reafirmação da obrigatoriedade da publicação em diários oficiais e jornais de grande circulação no estado, sob pena de nulidade. A mensagem clara do Congresso Nacional é que o princípio da publicidade deve ser plenamente respeitado, permitindo que os atos da administração sejam acessíveis a todos os cidadãos.

“Vale destacar que, até 31 de dezembro de 2023, os municípios também devem realizar divulgação complementar de suas contratações por meio da publicação em jornais diários de grande circulação local, conforme previsto no artigo 175, § 2º, da Lei n. 14.133/2021. A partir de 1º de janeiro de 2024, essa exigência de publicação em jornais locais deixará de existir, mantendo-se apenas a obrigatoriedade das publicações em diários oficiais e jornais de grande circulação em nível estadual”, adiantou.

Transparência

Conforme o especialista, a importância da publicação em diários oficiais e de grande circulação no processo licitatório é inegável. “A transparência e a fiscalização são fundamentais para assegurar que os recursos públicos sejam utilizados de forma adequada e em benefício da sociedade. Nesse contexto, a obrigatoriedade de publicação em jornais é uma garantia de que os procedimentos de compra com dinheiro público sejam conduzidos de maneira transparente e conforme a lei”, destacou.

De forma resumida, o advogado, palestrante e articulista Bruno Camargo explicou que substituir a publicação em jornais por outras formas de divulgação (tais como: portais online de associações de municípios, portais online dos órgãos públicos ou divulgação no quadro de avisos) seria equivalente a negar publicidade aos procedimentos de licitação.

“Tanto a antiga Lei de Licitações quanto a ‘nova’ Lei de Licitações são categóricas ao estabelecer a obrigatoriedade das publicações em diários oficiais e jornais de grande circulação, sem ressalvas ou exceções. A recente inclusão na Lei de Improbidade Administrativa também reforça a importância da publicidade dos atos oficiais, ao dizer que negar publicidade aos atos oficiais constitui ato de improbidade administrativa (art. 11, IV, da Lei n. 8.429/92)”, explicou o advogado ao citar detalhes da legislação.

“A obrigação de dar a devida publicidade a todos os atos oficiais, sobretudo aqueles relativos aos procedimentos de compra com dinheiro do povo, é uma medida que promove a confiança e fortalece o ambiente de negócios que giram em torno dos processos licitatórios”, finalizou o mestrando em Direito pela Universidad Europea Del Atlántico (Espanha) e especialista em Direito Processual pela PUC-MINAS.

Bruno Camargo lembrou que o órgão público que realiza compra com o dinheiro do povo tem a obrigação de prestar contas e a publicação dos processos licitatórios em jornais de grande circulação é o meio mais eficaz de fazê-lo.

Ele esclareceu até mesmo o que pode acontecer, por exemplo, com um concurso público que teve todas as suas etapas anunciadas de forma inadequada, desobedecendo a lei. “A publicidade correta e completa dos atos que envolvem os concursos públicos é fundamental para validade do concurso. A escolha entre as formas de divulgação não é facultativa; a Lei prevê a publicidade em jornais diários de grande circulação comprovada. Aliás, se o órgão público optar por divulgar seus atos de forma diferente do que reza a Lei, a publicação não surtirá efeitos, por falta de previsão legal. Em outras palavras, os atos serão nulos!".

Segundo o advogado especialista, em um cenário em que a confiança na administração pública é um fator-chave para o sucesso da gestão, a clareza nas divulgações e a conformidade com as novas diretrizes legais são passos cruciais para solidez e transparência do ato, o que reflete diretamente na imagem que o gestor público quer passar para os seus eleitores.

Bruno Camargo esclareceu que a Lei não deixa brechas. “A transparência e a ampla divulgação dos procedimentos de compra com dinheiro público são princípios fundamentais da gestão pública. Nesse contexto, a publicação de avisos de licitações e extratos de contratos em jornais oficiais e privados de grande circulação desempenha um papel crucial na garantia da lisura e da legalidade dos processos licitatórios. A ‘nova’ Lei de Licitações reforça essa obrigação, tornando-a ainda mais clara e robusta, pois obriga que todos os extratos de editais de licitações, independentemente da modalidade e do valor estimado, sejam publicados no Portal Nacional das Contratações Públicas (PNCP), nos Diários Oficiais, bem como em jornais diários de grande circulação”, detalhou, com toda sua expertise.

Por isso que, nos termos da “nova” Lei, todos os editais de pregões, qualquer que seja o valor estimado da contratação, devem ter seus resumos publicados no PNCP, diários oficiais e também em jornais diários de grande circulação.

“Importante frisar que a exigência de publicações em jornais já estava prevista em legislações anteriores que tratavam de licitações. No entanto, a ‘nova’ Lei de Licitações reafirmou e reforçou essa obrigação, deixando-a ainda mais explícita”, pontuou.

Bruno Camargo acredita que os gestores públicos se convenceram que um processo licitatório bem conduzido é uma das principais ferramentas para o êxito da administração. “Por isso uma minoria, cada vez mais escassa, ainda viola procedimentos, sobretudo na tentativa de direcionar resultados e ‘eleger’ vencedores de certames públicos. Um exemplo para a escolha de vencedores é a ausência de publicidade e transparência do edital de licitação ou a publicação em jornais ou portais eletrônicos de restrito ou pouco acesso’, considerou.

Ora, “Propaganda é a alma do negócio”, citou o advogado, essa lógica também se aplica às contratações públicas, na medida em que a licitação amplamente divulgada atrai um número maior de concorrentes, e, por lógica, os preços caem.

A Abralegal vem atuando como verdadeira fiscal da Lei de Licitações, na medida que acompanha as leis que tratam das publicações em todo o Brasil. “Atualmente, nenhuma norma que trata do tema é debatida pelos parlamentares sem a participação da Abralegal”, garantiu o advogado.

Devido aos fatos, Bruno Camargo acredita que a Associação logrou em derrubar os vetos presidenciais, quando do então presidente Jair Bolsonaro, que recaiam sob a nova Lei de Licitações, mantendo a intenção dos legisladores em ampliar as publicações dos processos licitatórios.

Mais recentemente, a Abralegal participou da construção do texto do Marco Legal das Startups (LC 182/21) e vem trabalhando na elaboração de diversas normas que tratam do tema. Afinal, a quem interessa descumprir à Lei de Licitações? Apenas aos fraudadores, apontou o advogado, que tentam, através das licitações, obter benefícios, desviando recursos públicos e cometendo toda sorte de fraudes.

“Muitos órgãos, sobretudo no âmbito dos municípios, ainda precisam regulamentar a aplicação da ‘nova’ Lei. Temos menos de 60 dias. O prazo está escasso e os órgãos precisam correr a fim de que possam utilizar integralmente a nova norma”, finalizou. 

Veja a entrevista de Bruno Camargo na TV Tribuna: