Economia

'MP da Eletrobras impõe interesse de mercado'

Deputados federais tem critérios para a venda da estatal energética do país

Por Carlos Amaral 21/05/2021 08h30
'MP da Eletrobras impõe interesse de mercado'
Reprodução - Foto: Assessoria
Na noite desta quarta-feira (19), a Câmara dos Deputados aprovou – por 313 votos favoráveis, 166 contrários e cinco abstenções – a Medida Provisória (MP) 1.031, que determina os critérios para a privatização da Eletrobras. Para Lucas Nascimento, diretor do Sindicato dos Urbanitários de Alagoas, a medida tira a função social do setor elétrico e impõe o interesse de mercado. “Esse projeto tira essa autonomia do setor elétrico, tira a função social e impõe o interesse de mercado”, crava. “O Sistema Interligado Nacional funciona como uma corrente e qualquer elo que se romper e faltar energia, se consegue a energia em outro elo. Os reservatórios são baterias, que ficam a cargo do interesse nacional e as nossas hidrelétricas tem um produto essencial ao ser humano: a água, que serve tanto para abastecer o consumo humano quanto energia. Aqui no Nordeste, por exemplo, se parou de gerar energia para garantir o fornecimento de água”, completa Lucas Nascimento. O dirigente sindical ainda afirma que “a Eletrobras é uma empresa essencial e estratégica. É questão de soberania nacional mantê-la sob posse da União. A Eletrobras tem mais de 30% da geração de energia e 53% de toda a transmissão de energia no Brasil”. O modelo de desestatização aprovado pela MP prevê a emissão de novas ações da Eletrobras, a serem vendidas no mercado sem a participação da empresa. Isso resulta na perda do controle acionário de voto mantido atualmente pela União. Apesar de perder o controle, a União terá uma ação de classe especial – golden share – que garante poder de veto em decisões da assembleia de acionistas. BANCADA Dos nove deputados federais de Alagoas, apenas dois votaram contra a MP 1.031: Tereza Nelma (PSDB) e Paulão (PT). Marx Beltrão (PSD) se absteve e os demais foram favoráveis. Para Tereza Nelma, não é preciso privatizar a empresa para que se recupere capacidade de investimento. “Mesmo estatal, a empresa possui alta geração de caixa, com lucro de R$ 30 bilhões nos últimos três anos e reservas financeiras de R$ 14,5 bilhões e baixa relação dívida líquida/lucro”, pontua. “Esta medida vai impactar diretamente no bolso da população gerando o aumento imediato na conta de luz de todos os consumidores na ordem de 14%, somente por efeito da descotização, que é a liberação dos preços de venda de energia de todas as usinas, sem contar a UHE [Usina Hidrelétrica] Tucuruí que representa metade da geração total da Eletrobras no regime de cotas. Caso permanecesse estatal e mantendo os valores desse regime, o preço da energia não aumentaria – ao contrário, poderia ser reduzido imediatamente em até 7,5%”, completa Tereza Nelma. Ainda de acordo com a parlamentar, o custo da descotização para o consumidor, em 30 anos de concessão, será de quase R$ 400 bilhões. “Dinheiro que irá para as empresas privadas ao invés de diminuir a conta de energia de todos os consumidores”, critica. “A Eletrobras tem plena capacidade de investir, apresentou lucro acumulado de mais de R$ 30 bilhões nos últimos três anos. Não há absolutamente nenhuma garantia de que uma Eletrobras privada prefira investir ao invés de apenas mandar dividendos para seus acionistas. Nem a MP nem o PLV condicionam a privatização à realização de novos investimentos”, completa Tereza Nelma que ainda pondera para o risco de apagões no país por falta de investimentos devido ao enriquecimento de acionistas. Já o deputado federal Pedro Vilela (PSDB) diverge da colega de partido. Para ele, a aprovação da MP e a consequente privatização da Eletrobras são “um passo importante rumo ao estabelecimento de um Estado adequado às necessidades brasileiras, sem tamanho excessivo e com maior eficiência”. O deputado federal Arthur Lira (PP) não votou por presidir a Câmara dos Deputados, mas em suas redes sociais, ele fez o seguinte comentário: “Palavras ao vento são fáceis de pronunciar, mas se perdem no vento também. As transformações permanentes são árduas e exigem esforços, mas deixam o legado de uma sociedade melhor e de um povo mais próspero e um futuro mais promissor”. CONSÓRCIO NORDESTE Após a aprovação da MP 1.031, o Consórcio Nordeste publicou carta na qual critica a privatização da Eletrobras. “O governo federal continua seus movimentos em busca da privatização da Eletrobrás Se isso acontecer, mais uma vez o desenvolvimento do país e o bolso do consumidor serão diretamente afetados. Há várias questões envolvidas neste projeto que precisam ser evitadas”, afirma. “Entre as principais hidrelétricas que podem entrar na lista para concessão ao setor privado estão o Complexo de Paulo Afonso (na Bahia) e Xings (entre Alagoas e Sergipe), ambas operadas pela Chest, com atuação muito relevante em todo o Nordeste do Brasil. Este processo de desestatização, além de impactar a tarifa de energia para os consumidores, abrir caminho para a precarização na prestação do serviço, configurando-se um absurdo energético, hidráulico e institucional”, completa a carta do Consórcio Nordeste. O documento ainda alerta que “se concretizada, tal medida promoverá, na prática, efetiva entrega da gestão dos principais rios e reservatórios ao controle privado. Isso gerará insegurança energética, com real ameaça de déficit no fornecimento de energia, e perda de potência dos projetos de desenvolvimento regional, principalmente do Norte de Nordeste país, sabidamente regiões com menores índices de desenvolvimento humano e alto potencial de geração de energia”.