Ciência e Tecnologia
Pesquisa apoiada pela Fapeal aponta conexões afetivas entre os fatores de expansão de facções no Brasil
Estudo da Ufal foca em juventudes periféricas, suas trajetórias e redes de afeto, para compreender como muitos passam a integrar o universo criminal

Apoiadora da produção científica, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal) segue na dianteira ao apoiar estudos que investigam fenômenos centrais da sociedade brasileira contemporânea. Um exemplo expressivo deste viés é a pesquisa ‘Conexões marginais: periferias, mercados ilegais e a expansão das facções criminais no Brasil’, conduzida pelo professor Fernando Rodrigues, do Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal).
Aprovado no edital Fapeal/Fapesp de Auxílio à Pesquisa Científica, o estudo tem desenvolvido artigos e análises, publicadas em revistas científicas nacionais e internacionais de referência, situando Alagoas como um centro de produção de conhecimento de ponta sobre as juventudes periféricas e suas transformações sociais.
O professor Fernando explica que o projeto teve início a partir de investigações anteriores sobre adolescentes envolvidos em mercados ilegais e suas trajetórias. No contexto dessas observações, seu grupo de estudos percebeu que a mobilidade das famílias, muitas vezes enviando filhos para outros estados em busca de proteção ou oportunidades, revelava pistas importantes para compreender a expansão das facções e as dinâmicas dos mercados ilegais no país. E foi aí justamente nesses novos apontamentos, que até então não eram discutidos, que o professor se lançou.

“A questão hoje não é apenas combater o crime, mas pensar um planejamento de medidas de apoio às famílias desses adolescentes”, ressaltou o pesquisador. Nesse desdobramento, a análise contribui para avaliar políticas públicas de juventude, assistência social e segurança de forma integrada.
Motos, facções e a mudança dos mercados
Um dos artigos resultantes do projeto, “Mobilidades clandestinas: pessoas e motos, coronelatos e facções”, descreve a trajetória de uma motocicleta de baixa cilindrada, popularmente conhecida como “cinquentinha”, desde uma fazenda de café no Sudeste até cidades do Nordeste, passando por diferentes atores sociais e econômicos.
O estudo mostra como objetos aparentemente comuns, como esta moto, podem conectar mercados formais, informais e ilegais, evidenciando redes complexas que incluem desde grandes bancos até facções criminais locais.
O recorte ilustra igualmente como mercados ilegais não podem ser pensados somente no território urbano das grandes cidades, eles atravessam fronteiras regionais e nacionais, impactando economias locais e a vida cotidiana de trabalhadores, comerciantes e famílias.
Outro trabalho derivado do projeto “Expansão das facções, mutação dos mercados ilegais”, discute como redes criminais como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), ao longo das últimas décadas, se consolidaram para além das periferias metropolitanas, adentrando em médias e pequenas cidades, alcançando presídios, zonas rurais e até cadeias produtivas ligadas ao mercado legal.
Segundo o coordenador do Grupo de Pesquisa Periferias, Afetos e Economias das Simbolizações (Gruppaes), a expansão faccional revela dinâmicas próprias, em que redes de pertencimento e proteção passam a ocupar o espaço deixado por estruturas familiares fragilizadas. Nesse processo, jovens encontram nas facções não apenas oportunidades de inserção econômica, mas também vínculos afetivos que oferecem suporte material e emocional em momentos de ruptura.
Em momentos de fragilidade, facções e fraternidades se apresentam como espaços de acolhimento, funcionando como “novas famílias” que oferecem suporte material e emocional. É dentro deste contexto que os vínculos afetivos, e não apenas a lógica econômica, se tornam determinantes para compreender como esses jovens passam a integrar o universo criminal. Por isso tal fenômeno, longe de ser linear ou homogêneo, tem produzido transformações profundas na maneira como os mercados ilegais se estruturam e se conectam com práticas sociais, políticas e institucionais.
Perspectivas futuras da pesquisa com Alagoas no protagonismo
O próximo passo da pesquisa, segundo Fernando Rodrigues, está em compreender de forma ainda mais detalhada como a expansão dos mercados ilegais e dos grupos armados vem se estruturando em diferentes escalas, dos grandes centros urbanos às cidades médias e pequenas, alcançando zonas rurais e regiões de fronteira.
O pesquisador ressalta que, se nos anos 2000 a preocupação se voltava aos homicídios nas metrópoles do país, e na década seguinte sobre as capitais do Norte e Nordeste, hoje o desafio é compreender a interiorização dessa violência, que já atinge municípios menores e revela novas configurações de poder, onde facções e grupos locais disputam espaço.
Essa abordagem pretende lançar luz sobre os mecanismos menos visíveis que alimentam os mercados ilegais e, ao mesmo tempo, geram subsídios para pensar políticas públicas de repressão, mas principalmente de proteção social e prevenção da violência.
O pesquisador ressalta ainda que esse esforço foi possível graças ao apoio da Fapeal, cujo investimento viabilizou a produção de artigos e análises que projetam Alagoas como referência nacional e internacional. “A Fundação tem permitido transformar a pesquisa em uma rede de conhecimento que parte daqui, mas dialoga com problemas comuns a diversos países. Isso coloca o estado em posição de protagonismo no debate científico sobre violência, mobilidade e sociedade”, concluiu o sociólogo.
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