Cidades
Comunidades quilombolas aguardam por reconhecimento
São 40 territórios aguardando certificação e reconhecimento no estado
Passados 330 anos da morte de Zumbi dos Palmares, Alagoas, berço do maior quilombola de todos os tempos, tem ainda um débito histórico e cultural com cerca de 5 mil remanescentes de quilombolas distribuídos em 40 comunidades quilombolas aguardando certificação e reconhecimento, conforme dados repassados pelo coordenador-geral das Comunidades Quilombolas do Estado de Alagoas pela Ganga Zumba Alagoas, Manuel Oliveira, conhecido como Bié.
Segundo ele, as comunidades estão nos municípios de Belém (Sítio Geraldo I e Sítio Montedouro); em Carneiros (Sítio Salgadinho, Sítio Serrote da Furna, Sítio Buenos Aeres, Sítio Serrote do Mocó, Sítio Serrote do Tanque, Sítio Alto dos Paulos, Mundo Novo, Malhada, Capim Grosso e Olho d’Água da Cruz; em Coqueiro Seco, Candões; em Girau do Ponciano: Pitubas, Maluda, Boqueirão e Lagoa do Mel; em Junqueiro, Retiro; em Joaquim Gomes, Barros; em Mata Grande: Espanha, Serra Santo Antônio/Serra do Urubu, Bomfim e Olho d’Água Seco; em Olho d’Água das Flores: Olho d’Água da Cruz; em Olho d’Água do Casado: Serra Saco do Vento; em Palestina: Machado de Baixo; em Pão do Açúcar: Jacarezinho, Santiago, Imburana d’Água e Xexéu; em Piaçabuçu: Quilombo; em Porto Real do Colégio: Tabuleiro do Negro, Porto Real do Colégio, Girau Itiuba e Barra Itiuba; em Quebrangulo: Lajes; e em Traipu: Sítio Bengo, Sítio Sapo e Sítio Olho d’Água de Pedro Paulo.
“O Quilombo Sitio Alexandre, em Lagoa da Canoa solicitou a certificação e reconhecimento mais recentemente”, detalhou Bié, que também atua como coordenador nacional da CONAQ – Coordenação de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas.
Conforme a Fundação Cultural Palmares, apenas duas comunidades estão com processo aberto. São elas Alexandre e Bico do Urubu. A explicação para a diferença entre a quantidade citada pelo coordenador-geral das Comunidades Quilombolas do Estado de Alagoas pela Ganga Zumba Alagoas e o número que a Fundação reconhece está no fato que algumas comunidades fazem o cadastro pela plataforma Gov, sem ter solicitado à representação regional da Fundação.
Ainda de acordo com a Fundação, 289 Comunidades Quilombolas receberam a certificação em todo o Brasil. O que, segundo a Fundação, torna 2025 o 4º melhor ano de toda a série histórica desde 2004. Ao todo, o país tem agora 4.284 comunidades certificadas.
IBGE e Quilombolas
O estado tem 37.722 pessoas que se autodeclararam quilombolas no Censo 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Naquele ano, aconteceu, pela primeira vez, a pesquisa que levantou o quantitativo dessa parcela da população. Dos 102 municípios, 56 têm população quilombola registrada, demonstrando uma significativa presença territorial no estado. A visibilidade dada pelo Censo Demográfico mostrou quantos são e onde vivem os remanescentes de Zumbi e de Dandara.
Segundo o Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas (Iteral), as comunidades Campo do Urubu, no município de Pariconha, e Flor do Dia, no município de Jacaré dos Homens, estão ainda fazendo um levantamento histórico para entrar com processo na Fundação Cultural Palmares. Já o Quilombo Ouricuri está em processo adiantado na Fundação para ser reconhecido.
Nacionalmente, Alagoas ocupa a 6ª posição, ficando atrás apenas da Bahia, Maranhão, Minas Gerais, Pará e Pernambuco. O grupo corresponde a 1,21% da população geral do estado que luta pelas raízes centenárias da ancestralidade quilombola em Alagoas. Costumes e tradições que praticamente se perderam no tempo e encontram, em algumas poucas comunidades isoladas, seus últimos respiros e sinais de resistência e luta.
O município com maior concentração de quilombolas é Palestina, que conta com uma população expressiva (31,72% em relação à população geral). Penedo é a cidade com maior número absoluto de quilombolas (5.280), mas eles correspondem a 9% da população.
Em relação à população geral, Maceió é o município com menor número proporcional de quilombolas. Foram apenas 21 identificados, dentro de uma população de 957.916 habitantes, o que corresponde a 0,002%. Fora da capital, a cidade com menor número proporcional de quilombolas é Porto Calvo (0,04%).
Ainda segundo os dados do IBGE, em números absolutos, sem levar em conta a proporcionalidade, as cidades com menor quantidade de quilombolas são Maravilha e Porto Calvo, cada uma com apenas 10 pessoas autoidentificadas.
“Importante lembrar que nem todos os municípios alagoanos têm população quilombola. A pergunta foi destinada a apenas alguns locais (aplicação espacialmente restrita do questionário), onde havia territórios quilombolas, agrupamentos, ou demais localidades de ocupação efetiva e/ou potencial”, salientou o IBGE em Alagoas.
No município de Pariconha, existem cinco comunidades quilombolas devidamente certificadas, totalizando mais de 700 pessoas. No Alto Sertão de Alagoas, existem pelo menos 16 comunidades quilombolas distribuídas em Inhapi, Delmiro Gouveia e Água Branca, além de Pariconha.
Culturalmente, os quilombos de Alagoas são um tesouro de práticas, crenças e expressões artísticas. Músicas, danças, festivais e artesanatos são alguns dos aspectos que ilustram a rica diversidade cultural dessas comunidades. Celebrar o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra garante a identidade e a história desses povos.
Reconhecer os quilombolas significa conhecer a história do Brasil por outra perspectiva. O primeiro Censo realizado no Brasil foi em 1872. Portanto, há 152 anos o país não quantificava sua população quilombola, deixando uma séria lacuna no reconhecimento da diversidade da população brasileira.
As raízes centenárias da ancestralidade quilombola em Alagoas praticamente se perderam no tempo e encontram, em algumas poucas comunidades isoladas, seus últimos respiros e sinais de resistência e luta.
Como é o caso do povoado Pixaim, localizado ao extremo sul do estado e onde só é possível chegar de barco ou em carro de tração. Pixaim fica em Piaçabuçu e reúne 43 famílias que vivem praticamente como nômades, construindo e reconstruindo suas casas de taipa e telha brasilit ao sabor da força do vento que comanda a direção, tamanho e altura das dunas.
Banhada pelas águas do Rio São Francisco, a comunidade vive do que pesca e planta. De maneira bem rústica, a população está sempre rodeada pela natureza em uma simbiose quase perfeita. Entrar em Pixaim é praticamente conhecer o paraíso. É uma licença poética.
É na culinária rudimentar feita a base de fogo a lenha e nos costumes simples de viver extraindo da natureza tudo para seu sustento que a comunidade reflete o pouco do que ainda restou das experiências dos seus antepassados.
As 43 famílias são formadas por adultos, idosos e crianças e quase todos parentes de primeiro, segundo e terceiro graus. Os traços genéticos bastante semelhantes formam uma espécie de exame de DNA impresso a olho nu.
Lições deixadas por Zumbi
Na avaliação do professor e mestre em História pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e especialista em História de Alagoas e África, Zezito de Araújo, Zumbi dos Palmares deixou como principal lição que a liberdade, a dignidade e a justiça são conquistas que exigem luta, organização e, acima de tudo, a recusa em se curvar à opressão.
“Sua história é um farol de resistência que ilumina não apenas a luta contra o racismo, mas todas as formas de injustiça social, tornando-o uma figura eternamente relevante para o Brasil e para o mundo”, discorreu Zezito Araújo que é vice-presidente da Academia Alagoana de Educação – Acale.
Segundo Zezito Araújo, a maior conquista foi sobreviver ao genocídio da escravidão. Mesmo sob tortura e opressão, completou ele, os povos africanos e seus descendentes preservaram e adaptaram elementos cruciais de sua cultura.
“A resistência com a criação de quilombos, com destaque para Palmares, foi uma conquista monumental de autogoverno, organização social, econômica e militar. Nas políticas públicas e sociais podemos assinalar as seguintes conquistas: pautou a nível nacional a discussão sobre o racismo estrutural, mostrando que a desigualdade não é fruto do acaso, mas de um sistema de opressão”, detalhou o professor.
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