Cidades

Defensoria pede à Justiça remoção no Bom Parto

Nota técnica denuncia impactos do afundamento do solo na região, provocado pela Braskem nas comunidades do bairro

Por Ricardo Rodrigues - colaborador / Tribuna Independente 03/09/2025 07h51 - Atualizado em 03/09/2025 23h34
Defensoria pede à Justiça remoção no Bom Parto
Moradores do Bom Parto ainda sofrem com afundamento do solo - Foto: Edilson Omena

Um ofício ao juiz André Granja, da 3ª Vara Federal, a Defensoria Pública do Estado, por meio do defensor Ricardo Melro, pediu que o Tribunal Federal da 5ª Região determine a realocação imediata de todas as famílias residentes no Bom Parto, com base na inspeção judicial, realizada no bairro, “garantindo aos moradores o devido amparo assistencial, em face do risco iminente e comprovado à vida e à segurança da comunidade”.

No documento endereçado ao juiz do caso e com data do dia 14 de agosto de 2025, a Defensoria pede ainda que a Justiça Federal se posicionasse sobre a nota técnica que denuncia os impactos do afundamento do solo, provocado pela Braskem, nas comunidades fora da área de risco delimitada pela Defesa Civil de Maceió.

Portanto, o pedido envolve as comunidades não só do Bom Parto, como também dos Flexais, da Vila Saem e da Rua Marquês de Abrantes, em Bebedouro.

No ofício, o defensor diz que – além de expor o assunto do ponto de vista técnico, com base no estudo feito por cientistas experientes – sugeriu ao magistrado que se manifeste sobre a nota técnica conjunta da Defesa Civil e Serviço Geológico do Brasil (SGB), levando em consideração “a urgência da vida sobre a controvérsia técnica”.

“Excelência, o que a Defensoria Pública Estadual pediu foi para concordar ou não com os dados apresentados nos autos. Apesar de reconhecerem os dados apresentados, a Defesa Civil Municipal e o Serviço Geológico do Brasil – CPRM consideram que estes não possuem correlação direta com o processo de mineração que assola a região”, explicou o defensor, no ofício encaminhado ao juiz.

“No entanto, pesquisas independentes apresentadas pela Defensoria Pública do Estado, em 8 de agosto de 2025, levantam, no mínimo, dúvidas acerca do nexo causal.
Tais análises sugerem que a realidade do risco é mais complexa e grave do que a retratada nos mapas oficiais”, acrescentou o defensor.

“Contudo, ciente da urgência extrema que o caso requer e para não impor qualquer atraso à marcha processual, a Defensoria Pública informa que a discussão sobre a necessária ampliação do mapa de risco, abrangendo a totalidade da área apontada nos novos estudos, será objeto de ação própria, a ser ajuizada oportunamente”, revelou.

Em entrevista à Tribuna Independente, o defensor Ricardo Melro disse que “desde 14 de agosto, por meio de ofício, nos manifestamos na Ação Civil Pública do Bom Parto”. Ele fez questão de registrar essa solicitação, para fazer frente ao demais órgãos públicos envolvidos na apuração da tragédia, a exemplo dos órgãos ministeriais.

“Inclusive pedi aos membros do MPF, DPU e MP/AL para se manifestarem rápido na quinta-feira passada, pois só faltavam eles. E o juiz sairá para substituir no TRF-5 esta semana. Senão ele não decidiria. Isso eu conversei com o próprio juiz, na semana passada”, acrescentou Melro, referindo-se ao juiz André Granja, titular da 3ª Vara Federal.

Rachaduras são visíveis, diz ata de inspeção judicial

No que tange à Ata de Inspeção Judicial, que documentou a visita à comunidade do Bom Parto, realizada em 22 de julho de 2025, a Defensoria Pública entende que os fatos ali constatados e descritos falam por si. “As condições de risco iminente, as rachaduras visíveis nos imóveis, o afundamento do solo e a angústia dos moradores foram diretamente testemunhadas por Vossa Excelência, pelas partes e por seus assistentes, tornando-se prova incontestável da gravidade e da urgência da situação”, pontuou a missiva da Defensoria, endereçada ao juiz.

“A inspeção materializou o que os laudos e as fotografias já indicavam: a área objeto da lide não oferece condições de moradia segura. Dessa forma, esta Defensoria Pública Estadual não possui acréscimos a fazer ao relatório, reiterando que os elementos colhidos na inspeção são mais que suficientes para embasar a tutela jurisdicional requerida”, concluiu o defensor, no ofício à Justiça Federal.

DO PEDIDO

Nesse sentido, a Defensoria Pública do Estado, na pessoa do defensor Ricardo Melro e sua equipe, sugeriu o prosseguimento do feito, com a máxima urgência que o caso requer, e pediu para que seja proferida decisão sobre a ação que tramita na Justiça Federal. Para que, com base nela, “determine a realocação imediata de todas as famílias residentes na área que foi objeto da lide e da Inspeção Judicial, garantindo-lhes o devido amparo assistencial, em face do risco iminente e comprovado à vida e à segurança”.

OUTRO LADO

A reportagem da Tribuna Independente procurou ouvir o juiz da 3ª Vara Federal, sobre o ofício da DPE. Por meio da assessoria de comunicação do Tribunal, o magistrado afirmou que “além da DPE, DPU, MPF e MPE também se manifestarem nos autos e o processo foi concluso para o juiz hoje. A decisão deve sair em breve”.

Documento atesta falta de condições de habitações no bairro (Foto: Adailson Calheiros)

Cientistas pedem revisão do mapa de risco

Em todas essas localidades, os cientistas encontraram rachaduras, pisos afundados e casas inclinadas mesmo fora das áreas que a Defesa Civil Municipal e o próprio CAT consideram de risco.

Além disso, os eles alertaram para o problema do afundamento do solo, que não parou de ceder e continua em movimento. Por isso, eles pedem uma revisão urgente do mapa de risco V5, mais monitoramento e reparação imediata para as famílias que já estão sofrendo com os danos provocados pela mineração da Braskem, em Maceió.

OUTRO LADO

A prefeitura de Maceió, que é responsável pela Defesa Civil Municipal, foi procurada para se pronunciar sobre o assunto, por meio da sua assessoria de comunicação, mas não quis se manifestar, até o fechamento desta matéria.

ÍNTEGRA DA NOTA

“Um estudo feito por especialistas nacionais e internacionais, a pedido da Defensoria Pública de Alagoas, comprovou o que os moradores já vinham denunciando: o solo de Maceió continua afundando e o problema vai muito além do que está no mapa oficial da Defesa Civil.

O documento só foi liberado

para o público depois que foi apresentado primeiro às comunidades atingidas, por decisão do defensor público Doutor Ricardo Melro, garantindo que as vítimas soubessem antes de todo mundo.

O relatório analisou imóveis no Farol, Bom Parto, Bebedouro e até na ETA Cardoso e encontrou rachaduras, pisos afundados e casas inclinadas mesmo fora das áreas que o governo considera de risco.

Os técnicos alertam: o problema não parou e continua em movimento. Eles pedem uma revisão urgente do mapa de risco, mais monitoramento e reparação imediata para as famílias que já estão sofrendo com os danos”.

Problemas de rachaduras continuam nos Flexais de Cima e de Baixo e moradores cobram uma solução (Foto: Edilson Omena)


Moradores dos Flexais querem ouvir autoridades

De acordo com o relatório independente, encomendado pela Defensoria Pública Estadual (DPE), por meio do defensor Ricardo Melro, o afundamento do solo em Maceió, provocado pela mineração predatória da Braskem, é maior do que dizem as autoridades e órgãos públicos que investigam a tragédia, a exemplo do Comitê de Acompanhamento Técnico (TAC), coordenado pela Defesa Civil Municipal, do qual faz parte a própria mineradora.

“Esse relatório tem como base um estudo feito por especialistas nacionais e internacionais, a pedido da Defensoria Pública de Alagoas, comprovando aquilo que os moradores já vinham denunciando: o solo de Maceió continua afundando e o problema vai muito além do que está no mapa oficial da Defesa Civil de Maceió”, comentou o servidor público Maurício Sarmento, responsável para divulgação da nota nas mídias sociais.

Segundo ele, a comunidade dos Flexais estará protocolando um requerimento junto às autoridades locais para provocar a necessária discussão acerca do relatório recentemente divulgado. “Queremos ouvir o que elas têm a nos dizer”, destacou Sarmento, acrescentando que a nota foi construída coletivamente com as comunidades dos Flexais e tem como objetivo dar conhecimento público, especialmente à imprensa, sobre o teor do relatório técnico.

“O Relatório Técnico Independente demonstra que a área atingida pelo crime da Braskem é maior do que a apresentada pela Defesa Civil de Maceió e endossada pela força-tarefa que envolve os Ministérios Públicos Federal e Estadual, além da Defensoria Pública da União”, argumentou Sarmento. Ele é um 

dos coordenadores do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), mas a entidade não assina a nota.
O relatório independente de análise de dados sobre o processo de subsidência em Maceió foi apresentado às vítimas da Braskem em audiência pública, realizada no auditório do Cesmac, no Farol. O trabalho tem a coordenação técnica Marcos Eduardo Hartwig, professor da Universidade Federal do Espírito Santo, e da professora Magdalena Vassileva, PhD da Leibniz Universidade de Hannover.

O estudo teve o apoio técnico dos professores doutores Fábio Furlan Gama, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE); de Djamil Al-Halbouni, PhD da Leipzig Universidade de Hannover; e de Mahdi Motagh, PhD da Leibniz Universidade de Hannover, que é uma das mais prestigiadas universidades da Europa, com sede na Alemanha. No estudo, os cientistas disseram que analisaram os documentos da própria Defesa Civil e do Serviço Geológico do Brasil e chegaram à conclusão de que a tragédia é maior do que se pensa e que os impactos são assustadores, catastróficos.

Segundo eles, o relatório analisou imóveis no Farol, Bom Parto, Bebedouro e até na Estação de Tratamento de Água Catolé-Cardoso.