Cidades

Desmatamento: operações aplicam R$ 6 milhões em multas

Batalhão Ambiental registra 108 ocorrências em nove meses; 800 hectares são embargados em ação coordenada pelo MP/AL

Por Valdete Calheiros – colaboradora / Tribuna Independente 05/10/2024 09h15 - Atualizado em 05/10/2024 16h27
Desmatamento: operações aplicam R$ 6 milhões em multas
Operação Mata Atlântica em Pé foi responsável pelo embargo em terras onde houve desmatamento - Foto: Ascom MP/AL

Nos primeiros nove meses deste ano, o Batalhão de Polícia Ambiental atendeu a 108 ocorrências de destruição ou dano em floresta ou vegetação de especial preservação em Alagoas.

Do total, foram quatro em janeiro, seis em fevereiro, cinco em março, oito em abril, 40 em maio, três em junho, nove em julho, quatro em agosto e 29 em setembro.

As ações de combate ao desmatamento em Alagoas não param. No final do mês passado, depois de 15 dias, a Operação Mata Atlântica em Pé foi concluída com mais de 800 hectares embargados e mais de R$ 6 milhões em multas aplicadas. A ação, coordenada anualmente, pelo Ministério Público de Alagoas (MP/AL), por meio da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente.

A Operação Mata Atlântica em Pé ocorreu simultaneamente em todos os estados em que o bioma está presente. Além de Alagoas, a atividade foi realizada na Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe. A operação é a maior ação de combate ao desmatamento na Mata Atlântica.

Em Alagoas, neste ano, a operação definiu 75 alvos e confeccionou 67 autos de infração. Do total de 832,42 hectares embargados, 787,09 estavam fora da Área de Preservação Permanente (APP) e 45,33 hectares embargados estavam dentro de áreas de APP.

Com os termos de embargos e os autos de infração aplicados, os exploradores ficam terminantemente proibidos de desenvolver atividades nas referidas áreas.

A Mata Atlântica se destaca por sua grande diversidade de espécies e também um alto grau de endemismo. O bioma possui uma enorme importância ambiental, como na regulação do clima da região, proteção de encostas contra erosões e deslizamentos de terras.

Serve também de habitat e proteção para várias espécies de animais, além de fornecer matéria prima para a utilização humana em diversos fins.

A flora alagoana de Mata Atlântica possui fragmentos de mata extremamente importantes, e conta o predomínio de angiospermas, grupo que apresentar flores e frutos e também arbustos.

Embargo da FPI do São Francisco chega a mais de mil hectares

Em maio deste ano, a Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, também coordenada pelo MP/AL embargou 1.025 hectares de terra nos municípios de Craíbas, Girau do Ponciano, Jaramataia e Traipu, por desmatamento de vegetação nativa.

O desmatamento da caatinga representa um grave problema ambiental com implicações significativas para a biodiversidade e a sustentabilidade da região. A supressão de flora da caatinga pode agravar processo de desertificação e facilitar alagamentos no Agreste e Sertão.

Entre as implicações, encontram-se o empobrecimento do solo, a redução da biodiversidade, a extinção de espécies, a degradação na qualidade de vida da população, a desertificação crescente no bioma e os alagamentos no seu entorno.

Fiscalização Preventiva Integrada da Bacia do Rio São Francisco atuou em diversas regiões de Alagoas (Foto: Ascom MP/AL)

De acordo com a FPI do São Francisco, por se tratar de um bioma em uma região climática semiárida, a caatinga já apresenta uma fragilidade maior, e o seu desmatamento intensifica processos de aridificação e desertificação.

Isso porque deixa o solo exposto e susceptível a processos erosivos, redução de nutrientes e, a depender do uso dado ao solo após o desmatamento, pode ocorrer o processo de salinização, tornando essas áreas improdutivas e difíceis de recuperar.

Segundo a FPI do São Francisco, outro impacto negativo relacionado ao desmatamento e ao processo de desertificação é a redução de acúmulo de água no solo, que é um processo natural devido ao tipo de solo encontrado na caatinga, que são solos jovens e, por isso, com pouca profundidade, essas características somadas à redução da vegetação reduzem ainda mais o processo de infiltração, impactando no Ciclo Hidrológico.

A FPI do Rio São Francisco destacou ainda que as coberturas de vegetação que se localizam nas margens de rios, nascentes, lagos e represas, retêm parte da água, reduzem o fluxo de escoamento de água e protegem as margens dos processos erosivos. Sem essa vegetação, esse volume de água é direcionado com maior velocidade e intensidade para os rios, causando os alagamentos.

Choquinha-de-Alagoas: pequeno pássaro ameaçado de extinção

Uma das maiores vítimas do desmatamento generalizado, é choquinha-de-alagoas (Myro motherula snowi). A espécie está prestes a desaparecer. A ave habitava fragmentos de Mata Atlântica nos estados de Alagoas e Pernambuco e passou de 18 indivíduos, em 2017, para 14 em 2018-2019, para 11 em 2020-2021, para nove em 2021-2022, em para seis em 2022-2023 e para 4 em 2023-2024. A quantidade inclui indivíduos jovens e adultos.

Pequena e insetívora, a ave deixou de ser vista nos locais onde antes era seu habitat. Nos últimos 25 anos, segundo estudo da Save Brasil, choquinha-de-alagoas desapareceu do estado pernambucano e agora se mantém apenas na Estação Ecológica de Murici, em Alagoas. Desde 2016, uma equipe da Save Brasil e do Parque das Aves vem monitorando a espécie e trabalhando para protegê-la.

Choquinha-de-Alagoas pode desaparecer em Alagoas por causa do desmatamento na Mata Atlântica (Foto: Reprodução)

A Estação Ecológica de Murici é uma das áreas mais importantes para a biodiversidade no Nordeste, sendo último local de ocorrência da choquinha-de-alagoas e da jararaca-de-murici.

Segundo os pesquisadores, as medidas de conservação realizadas até o momento – proteção de ninhos, esforços para estabelecer métodos de reprodução sob cuidados humanos e melhor proteção da floresta – têm sido insuficientes para deter o declínio da população.

As causas, segundo eles, estão associadas ao desmatamento histórico generalizado nos dois estados, além da presença de populações elevadas de predadores de ninhos (como cuícas e serpentes) – provável efeito da caça excessiva na região e de alterações na qualidade da floresta.

Segundo o analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e chefe da Estação Ecológica de Murici (AL), Marco Antonio de Freitas, o processo de regularização é complexo e estratégico para a área, no entanto a burocracia vem dificultando a resolução há anos.

“A Estação Ecológica de Murici foi criada em 2001 e, por diversos motivos, nenhum dos 30 processos de regularização fundiária teve andamento positivo”, disse.