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Caso Casas Bahia: por que a recuperação extrajudicial ainda é pouco utilizada no Brasil?

Mesmo com o processo mais célere, medida é pouco conhecida e segue alguns critérios para ser aplicada

Por Assessoria 24/05/2024 14h23
Caso Casas Bahia: por que a recuperação extrajudicial ainda é pouco utilizada no Brasil?
Victor Lages - advogado especialista em recuperação judicial e falência - Foto: Divulgação

Nas últimas semanas a empresa Casas Bahia anunciou um pedido de recuperação extrajudicial, uma decisão que dá sequência ao plano para estender o pagamento de uma dívida que supera R$ 4,1 bilhões. Conforme a proposta apresentada, o novo prazo para quitação das dívidas saltará de 22 meses (um ano e dez meses) para 72 meses (seis anos). Além disso, haverá a redução de 1,5 ponto percentual no custo médio do endividamento com os credores.

O chamado "reperfilamento" altera o cronograma de pagamentos dos débitos, fazendo com que a empresa desembolse menos nos primeiros anos de amortização da dívida. Esse é um processo que recebeu o apoio de bancos parceiros, que irão sustentar a recuperação.

Apesar de atrativa para empresas nessa situação, a recuperação extrajudicial ainda representa um processo de reestruturação de dívida menos utilizado no Brasil. O processo, no entanto, é mais simples e barato. Segundo o advogado especialista em recuperação judicial e falência, Victor Lages, com a ação, a empresa endividada já ingressa diretamente com o pedido da homologação da proposta de pagamento dos débitos.

“Ao entrar com um pedido de recuperação extrajudicial, em síntese, a negociação é prévia e se dá de uma forma mais célere. Essa negociação é feita com um grupo seleto de credores que tenham ligação com o tipo de produto que a empresa em processo de recuperação trabalha. Após isso, o processo segue para o judiciário para a homologação com algumas propostas já acordadas, chamado de acordo de maioria”, explica.

Este processo é regulamentado pela Lei de Falências e Recuperação de Empresas (Lei nº 11.101/2005) e representa uma alternativa para as empresas que enfrentam dificuldades financeiras, mas ainda possuem condições de reestruturar suas dívidas. Nesse caso, a empresa negocia diretamente com seus credores para chegar a um acordo sobre a reestruturação das dívidas. Esses acordos podem envolver prazos mais longos para pagamento, descontos nos valores devidos, redução de juros elevados, entre outros.

Já na recuperação judicial, o credor vai até o judiciário, faz a postulação dos documentos exigidos e vai para universalidade de credores, ou seja, todas as dívidas existentes e ainda não vencidas. As dívidas com funcionários são consideradas de classe 1, onde existe uma prioridade de pagamentos, dada a natureza alimentar. No judiciário é suspenso todas as ações e execuções de todos os credores e em um prazo de 60 dias corridos, vai ser apresentado um plano de recuperação judicial.

Esse primeiro plano não é definitivo, a partir dele é que vai haver uma solução negociada. A empresa estabelece parâmetros e passa a negociar. Após isso, será convocada a assembleia de credores para ser votado o plano. Esse plano pode ser alterado na assembleia e cada classe vai negociar as suas condições de pagamento. Sendo aprovado o plano, o judiciário homologa e aí concede a recuperação judicial. Se o plano for rejeitado, é decretado a quebra da empresa.

Dentro de uma recuperação extrajudicial, até 2020, não se poderia tratar de créditos trabalhistas. Após a reforma, os critérios são que deva existir uma comunicação prévia ao sindicato. “Tanto na recuperação extrajudicial como na judicial, a transparência é ponto essencial e para isso o legislador criou uma figura para desburocratizar, que é o administrador judicial, que garantirá a transparência ao processo por meio dos relatórios mensais de atividades. Essa é uma pessoa que não tem ligação com as partes”, salienta.

O advogado ainda desmistifica o senso comum de que a recuperação judicial e extrajudicial seria impreterivelmente uma “falência e calote”. As duas modalidades são aplicadas como tentativa de reerguer a empresa, para assim evitar declarar a falência.

“Com um processo bem conduzido, o mercado reage muito bem. No caso das Casas Bahia, as ações chegaram a subir após a recuperação extrajudicial. Porém, para chegar nessas vias de forma extrajudicial, é necessário que a empresa esteja em crise pontual com algum credor. Já quando as dívidas atingem a empresa como um todo, é preciso recorrer a recuperação judicial, para restabelecer o fluxo de caixa e continuar a cumprir com as suas obrigações”, destaca.

Além disso, existe uma resistência prévia das empresas ao entrar com o pedido, mas ultimamente isso tem sido desmistificado através de exemplos de empresas que conseguiram sucesso. “A recuperação judicial busca a manutenção da fonte produtora, circulação de riquezas e empregos. Se ela for feita no momento certo, é garantido o sucesso, apesar de ter algumas partes não tão boas para se relevar e alguns ramos, como o da construção civil, sofrerem mais do que outros, já que pode se instalar uma crise de confiabilidade. Com a imagem arranhada, as vendas caem e atrapalha as empresas em conseguir se reerguer”, relata Victor Lages.