Cidades
'Bomba relógio': cabos e fios fora de norma podem causar incêndios de grandes proporções
Ao TH Entrevista, Ênio Rodrigues afirma que comércio prejudica toda população, inclusive com risco de acidentes fatais; em Maceió, mais de 150 rolos de cabos e fios foram apreendidos
O mercado irregular de fios e cabos elétricos tem crescido assustadoramente no Brasil, empresas idôneas e preocupadas com a qualidade do produto competem com fabricantes desonestos que vendem o produto muito abaixo do preço de mercado com baixíssima quantidade de cobre. O resultado? Acaba sobrando para toda a população, uma vez que esses produtos irregulares provocam o desperdício de energia, podem provocar curto-circuito nas instalações e até causar incêndios.
Ao TH Entrevista, o diretor executivo do Sindicato das Empresas que Fabricam Fios e Cabos (Sindicel), Ênio Rodrigues, confirmou que a comercialização não prejudica apenas os empresários do setor como toda a população. “Com as vendas de produtos irregulares, todos saem perdendo. Combater o comércio ilegal é a prioridade do Sindicel junto aos parceiros, como o Inmetro. Nisso a gente consegue garantir a segurança da população”, ressaltou Ênio em entrevista exclusiva para a TV Tribuna.
O diretor do Sindicel esteve em solo alagoano no período de 31 de maio a 2 de junho durante uma operação para combater o comércio ilegal de cabos e fios em Alagoas. Na ocasião, Ênio disse que apenas no mês de junho deste ano foram realizadas quatro grandes apreensões de fios e cabos irregulares em diferentes regiões do Brasil, mas precisamente em Sergipe, Pará, São Paulo (região metropolitana) e Amazonas. Questionado sobre a ação em Alagoas, ele disse que no estado não foi diferente. Veja a entrevista na íntegra no vídeo abaixo.
“Tivemos sim apreensões em duas lojas de Maceió de cabos e fios fora de norma, ou seja, material pirateado que pode provocar danos severos ao consumidor e a todo o comércio regular. Os estabelecimentos foram autuados e 150 rolos de fios foram apreendidos. A gente realiza essa ação justamente como falei porque pode acontecer um curto-circuito, além das perdas materiais, podem acontecer acidentes fatais”, alertou o sindicalista.
Rodrigues diz que as ações realizadas são uma forma de alerta para que o consumidor pare de comprar gato por lebre e não leve para dentro de sua casa um possível indutor de incêndios. “O Inmetro vem cumprindo seu papel fiscalizador, tanto em parceria com o Sindicel, como em ações como a 10ª semana do Plano Nacional de Vigilância de Mercado, quando o alvo foram os fios e cabos elétricos. No total, mais de 24 mil unidades foram verificadas e 11 foram reprovadas. A maior irregularidade na apreensão de fios e cabos é a baixa quantidade de cobre, que quando substituído por outros metais, baixa também a qualidade e, principalmente, a segurança nas instalações elétricas. Fato comprovado pelo aumento constante de incêndios originados em sobrecargas de energia: o fio aquece, derrete a proteção e pega fogo. Segundo a Abracopel, somente em 2022 foram 874 incêndios deste tipo no Brasil e que mataram 55 pessoas”, ressaltou.
O especialista do setor diz que o mercado irregular enxerga uma oportunidade de negócio no setor. “Em 2022, a estimativa de venda destes produtos ilegais foi R$ 2,4 bilhões. Então, o mercado legal perdeu mais de 30% do dinheiro em vendas. Ressalto que do mercado hoje em dia 70% dos fabricantes estão dentro dos padrões e têm o cuidado com o produto levado ao consumidor. Já em relação às marcas, olha aqui que interessante, apenas entre 30 e 40 marcas hoje têm conformidade técnica e mais de 115 marcas não estão no mercado e não têm conformidade técnica. 70% das delas e dos fabricantes que estão no mercado não fazem produtos dentro da norma”, pontuou Ênio.
Em relação à conformidade, Ênio disse que é difícil perceber. “É difícil para um leigo. Se você olhar a olho nu um cabo e falar, nossa, esse cabo está ruim, está bom? O que a gente costuma recomendar é que o consumidor preste atenção nas marcas mais conhecidas, nas marcas que já têm uma notoriedade, comprar em lojas em que se tem uma confiança maior. Por lojas que têm uma reputação melhor e também existe um site que a gente tem faz 30 anos, um instituto. A associação que faz o controle da qualidade de fios e cabos elétricos lá tem tanto as marcas boas quanto as marcas ruins. Então, se você for comprar um filme, pode olhar em qualifyo.org.br e lá você vai poder identificar o que fio é bom, que fio é ruim porque a olho nu é muito difícil”, orientou.
PROBLEMAS
Para o sindicalista, mesmo sendo difícil saber a olho nu quais materiais são regulares e irregulares, a população tem que buscar as melhores lojas e marcas.
“Você tem uma residência com um cabo bom, uma residência com um cabo ruim, iguaizinhas, mesmo número de quartos, mesmo número de chuveiros e o mesmo número de pessoas. Essa residência com um cabo ruim, ela gasta 30% em média mais de energia elétrica. Então, o vizinho começa a conversar quando fala: ‘pô, quanto está gastando de energia elétrica, eu estou gastando 100, você gasta 70, mas porque que você gasta 70?’ Começa a brigar com a família, que está muito tempo no chuveiro. Isso é ruim para o bolso, mas o importante é pensar na segurança. Se você coloca um cabo ruim na tua parede. Ele fica dentro de um conduíte na tua parede e esse cabo ruim ele esquenta. Então, a cobertura dele que te protege para não dar choque, ela derrete o cabo, cola um polo no outro. Aí dá um curto e aquela cobertura que devia ser antichamas vai pegar fogo. Ela começa a queimar dentro da tua parede e você nem percebe. Você vai sentir um cheiro de queimado e vai entender que está tudo OK, mas não está. Isso pode provocar um incêndio de seríssimas proporções”, orientou Rodrigues.
INCÊNDIOS E MAIS INCÊNDIOS
Sinistros podem ter relação com fios e cabos ilegais
O grande vilão de instalações elétricas em situação de risco é representado pelos fios e cabos chamados no mercado de ‘desbitolados’. Explicando de forma simples: os fios e cabos são feitos de cobre, que é um material nobre e, por isso mesmo, são a garantia de uma condução da energia com segurança. Muitas empresas fabricantes de fios e cabos diminuem drasticamente a quantidade de cobre no interior dos cabos, ou pior, misturam o cobre a outros metais, o que o torna resistente à passagem da energia elétrica.
Ênio diz que resistente não significa ser ‘mais forte’, “o termo resistente se refere à oposição da passagem da eletricidade e o que acontece quando o cabo se torna resistente? Ele aquece, muito! Aquecendo, ele vai derreter a camada de proteção (a parte de fora ‘colorida’ dos cabos que atua como isolamento elétrico) e pegar fogo! É assim, simplificando muito, que acontecem os incêndios por sobrecarga de energia e consequentemente curto-circuito. E é, provavelmente, o que aconteceu quando o fio do ventilador no quarto das crianças aqueceu e se incendiou”, comenta o especialista lembrando-se do incêndio iniciado em um ventilador que matou quatro Crianças em Canapi, sertão de Alagoas, no dia 14 de maio deste ano, um domingo.
O CASO
Na madrugada daquele domingo, quatro crianças morreram carbonizadas dentro de um quarto trancado em uma residência localizada no Centro de Canapi, cidade do Sertão de Alagoas. Informações da imprensa local deram conta que o incêndio teria começado no ventilador e que se alastrou para o colchão onde estavam dormindo as vítimas.
Duas das crianças eram moradoras da casa e as outras duas seriam filhas de um pastor, que as deixou na residência de um casal de amigos. O pai de duas das crianças ainda tentou arrombar a porta, mas ao entrar encontrou os pequenos abraçados e já sem vida.
O Corpo de Bombeiros Militar de Alagoas não chegou a ser acionado para a ocorrência. O Instituto Médico Legal foi acionado. As crianças foram identificadas como Davy Lucas Silva de Jesus e Aylla Ludmyla Silva de Jesus, tinham 9 e 7 anos. Eles eram filhos de Lucas Santana, que saiu junto com o pastor identificado como Aldo, para socorrer um vizinho que estava passando mal. As meninas Ayslla Alves Oliveira Silva e Maria Ariela Alves Oliveira Silva, eram filhas do pastor identificado como Aldo.
A prefeitura de Canapi emitiu nota por meio de suas redes sociais. Confira abaixo a nota na íntegra: "Nós Canapienses estamos de luto pelo falecimento de quatro crianças ocorrido nessa madrugada. Que Deus em sua infinita misericórdia console todos os familiares nesse momento de dor".
Para Rodrigues, este caso pode ter acontecido devido aos fios e cabos irregulares, o que não é uma informação oficial. No entanto, ele lembra que agentes do Corpo de Bombeiros estiveram presentes no treinamento realizado em junho pelo Sindicel em Maceió e foram orientados para nessas ocorrências avaliarem a fiação também.
“O Corpo de Bombeiros esteve presente no treinamento. Nós conversamos com eles. A Polícia Científica também estava lá e a gente debateu sobre esses incidentes. Conversamos muito sobre esse assunto porque não está na lista. No checklist deles está a análise dos cabos e muitas vezes o cara fala: ‘olha o meu ar-condicionado que explodiu’. Mas por que ele explodiu? O que pode ter tido é um problema no cabo, né”, questionou.
Rodrigues também se lembrou dos acidentes elétricos que estão ocorrendo no país e em Alagoas na construção civil. “Tanto aqui, como em outras regiões do país há esses incidentes e até com vítimas fatais. Um caso que chamou atenção foi no Espírito Santo, em um condomínio inteiro teve que ser refeita a fiação, porque foi identificado um produto irregular”.
Segundo o Anuário, os incêndios deste tipo (que em 2021 somaram 590 ocorrências com 47 mortes), em 2022 saltaram para 819 ocorrências e 55 mortes, um total de 874 incêndios por sobrecarga de energia, originada em fios e cabos de péssima qualidade que podem estar dentro da sua casa!
FUMAÇA TÓXICA
Um dos principais problemas de fios e cabos sem qualidade é que ao pegar fogo eles liberam uma fumaça altamente tóxica e a pessoa envolvida em um incêndio originado em sobrecarga de energia pode não morrer queimada e sim por aspirar fumaça tóxica.
MERCADO PROSTITUÍDO
O Sindicel, que é o Sindicato das Empresas que Fabricam Fios e Cabos, luta bravamente pela moralização deste mercado, mas tem perdido essa batalha para empresas que insistem em fabricar produtos de baixíssima qualidade e invadir o mercado com um preço muito abaixo do praticado pelas empresas certificadas.
O Sindicato, por meio da Qualifio, uma entidade criada especialmente para fiscalizar, ensaiar e certificar os fios e cabos, tem ‘comprado brigas’ com estas empresas usando o Inmetro, o Ipem e até a Delegacia de Defesa do Consumidor para mostrar à população o risco que ela corre ao aceitar que um profissional que esteja construindo ou reformando sua casa compre ‘qualquer’ fio, ou aquele mais baratinho ‘já que eles ficam dentro das paredes mesmo’.
“Para se ter uma ideia, em 2022 a Qualifio coletou 742 amostras de fios e cabos, ensaiou 716, sendo que 523 apresentaram não conformidade e apenas 193 estavam de acordo com todos os índices de qualidade exigidos pelo Inmetro! É urgente que os meios de comunicação mostrem à população brasileira o risco de construir ou reformar suas casas, comércios e indústrias usando produtos de baixa qualidade. O risco não é uma mancha na parede pela tinta ruim ou um piso quebrado de baixa qualidade, o risco ao usar fios e cabos desbitolados pode ser uma tragédia. Assim, quando falamos da segurança com eletricidade, principalmente dentro da sua casa, estamos falando de fios e cabos de qualidade”.
O sindicalista finaliza a entrevista orientando que o consumidor não compre fios e cabos pelo preço, antes de qualquer compra verifique o site da Qualifio (www.qualifio.org.br) “e vejam as empresas idôneas que trabalham com produtos de qualidade e exija de seu eletricista que ele trabalhe com produtos de qualidade”.
Primeiro semestre de 2023 já contabiliza 992 acidentes com eletricidade
A Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade (Abracopel) divulgou os dados inéditos e exclusivos dos acidentes de origem elétrica durante o primeiro semestre de 2023 e, infelizmente, as notícias não são boas.
Segundo a associação, os números totais aumentaram tanto no que se refere a acidentes, quanto a mortes. Em 2022 neste período foram 949 acidentes totais (choques, incêndios e raios), em 2023 os números subiram para 992. As mortes também aumentaram. Se em 2022 foram 384, em 2023 elas já chegaram a 399.
Os choques elétricos continuam se destacando, se em 2022 foram 458 acidentes por choque elétrico, o número em 2023 subiu para 521 acidentes. As mortes em 2022 foram 330 e em 2023, 350. Mas os incêndios não ficam para trás, em 2022 tivemos um aumento muito grande de incêndios por sobrecarga, no meio de 2022 eles eram 441 com 33 mortes. O ano fechou em 874 acidentes e 55 mortes (quase 40% a mais que 2021). Mas em 2023, os números continuam altos, foram 421 incêndios no 1º semestre com 35 mortes.
Se continuarmos neste ritmo, teremos novamente um recorde alto e negativo. As descargas atmosféricas (raios que geraram alguma consequência, seja de vítimas ou perda de patrimônio) foram 28 no 1º semestre de 2022 e subiram para 50 em 2023. As mortes, porém, caíram: em 2022 foram 21 e em 2023, 14.
POR REGIÃO
O Nordeste continua se ‘destacando’ nos números de acidentes, mas vale ressaltar que são nove estados na região e em muitos deles a energia elétrica é muito precária. O número total de acidentes por choque elétrico no Nordeste somou 149 ocorrências com 112 mortes em 2023, enquanto em 2022 foram 138 ocorrências com 109 mortes.
Mas o problema no que se refere às regiões brasileiras tem sido a região Sul, que tem apresentado nos últimos anos um crescimento constante, tanto em acidentes por choque, quanto em incêndios por sobrecargas. Em 2022, esta região apresentou 92 ocorrências por choque elétrico e 59 mortes. Em 2023, os números subiram para 125 e 69, respectivamente. No ranking de mortes por choque elétrico por estado, o Rio Grande do Sul é o grande destaque negativo, mas seguido de perto pelos outros dois estados do Sul: Paraná e Santa Catarina. A Bahia que sempre foi a Top 1 neste ranking ‘caiu’ para a 4ª colocação. Os menores números continuam sendo disputados entre as regiões Centro-Oeste e Norte.
A Abracopel afirma que nos últimos anos, os incêndios por sobrecarga de energia têm mantido um alerta. “Em parceria com o Sindicel e Qualifio, monitoramos de perto a situação (péssima) do mercado nacional de fios e cabos elétricos, cujas consequências são mostradas todas as vezes que os dados de ocorrências de incêndios no país são divulgados. Sabemos que na quase totalidade dos casos, a origem destes incêndios está na péssima qualidade dos fios e temos alertado constantemente à imprensa, à sociedade e às autoridades. Como apresentado anteriormente, não houve um aumento no número de incêndios por sobrecarga – 441 em 2022 e 421 em 2023, porém esta pequena queda não representa, para nós, motivo de comemoração, já que quando olhamos o número de mortes percebemos um aumento e não uma queda – 33 em 2022 e 35 em 2023. A Região Sul, novamente, é o destaque negativo nestes números”, comenta a direção da Abracopel.
“As residências continuam a representar quase 50% da totalidade das ocorrências de incêndios por sobrecarga de energia e pior: são responsáveis por mais de 80% das mortes nestas ocorrências. No primeiro semestre de 2023, foram 210 incêndios em residências e 29 mortes, o segundo local com maior ocorrência de incêndios são os comércios que tiveram 91 ocorrências, felizmente sem nenhuma morte. Um tipo de local que chamou nossa atenção pelo aumento foram as escolas que em 2022 apresentaram 15 ocorrências e, em 2023, o número subiu para 26 ocorrências, sem nenhuma fatalidade. A Abracopel continua sua luta pela diminuição destes números, todas as ações da entidade buscam um único objetivo: conscientizar a população, seja leiga, seja de profissionais, a entender e praticar boas práticas em segurança com a eletricidade. São pequenos gestos, pequenas mudanças dentro de sua própria casa que podem nos ajudar nesta batalha pela eletricidade segura. Conheça mais as ações da Abracopel e venha conosco! www.abracopel.org”.
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