Cidades
Vida Nova nas Grotas: a inclusão dos esquecidos urbanos
Programa começou pequeno, se agigantou e foi abraçado pelo ONU-Habitat; Estado concluiu infraestrutura em 53 grotas em vulnerabilidade social e já chegou ao interior
De escadarias a espaços de lazer, o olhar social do Vida Nova
Grota do Gelo, bairro do Jacintinho, periferia de Maceió. Sábado, 4 de abril, 10 horas da manhã. Embora o nome no local sugira algo como baixa temperatura, muito distante disso o sol é causticante na comunidade. Mesmo assim, dezenas de pessoas se apinham para disputar espaço e acompanhar a comitiva governamental capitaneada pelo governador Paulo Dantas e a primeira-dama e coordenadora-geral da nova fase do Programa Vida Nova nas Grotas, Marina Dantas. No sobe e desce de ladeiras íngremes na Grota do Gelo, eles inauguram as melhorias na 40° grota totalmente estruturada pelo Governo do Alagoas, de um total de 74 com obras de intervenção do Estado. Dessas, outras 13 estão prontas para inaugurar e outras 21 em execução.
As obras garantem à população local subir e descer as ladeiras com segurança, escadarias totalmente reformadas, pintadas, corrimão, além de espaços para as crianças brincarem. Isso sem falar nas melhorias revitalização importantes para o comércio local, que, antes, convivia com muita lama na porta dos estabelecimentos e, atualmente, contam com asfalto, meio-fio, escadarias e toda a infraestrutura para o atendimento aos clientes. E como se isso não bastasse, alguns moradores também são contemplados com reformas de seus imóveis.
Numa pausa no ir e vir em becos, vielas e ladeiras na Grota do Gelo ou entre abraços e afagos da comunidade, a comitiva concede uma entrevista coletiva. Nela, o secretário de Estado de Transporte e Desenvolvimento Urbano, Mosart Amaral — responsável por tocar o projeto que modificou a vida de quem mora em 74 grotas da capital — é emblemático, ao lembrar o início do programa: “Tudo isso começou tão pequenininho, inclusive com o nome de pequenas obras”.
Mas a realidade mudou. E o que era pequeno ganhou o mundo.
Nesta reportagem especial, a Tribuna traz o que mudou na vida da gente simples das dezenas de grotas já contempladas com o projeto do governo estadual que pretende melhorar a vida de mais de 100 mil pessoas, diminuindo a exclusão social urbana das pessoas que habitam as grotas e favelas. O material revela ainda o que pensa a nova gestora do Vida Nova nas Grotas, a primeira-dama de Alagoas, Marina Dantas, responsável por dar continuidade ao programa que a Organização das Nações Unidas (ONU) abraçou, através do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat).
E mais: com o sucesso na capital, o governador Paulo Dantas anuncia a extensão do programa com o nome Vida Nova na Sua Casa, que também vai transformar a vida dos habitantes do interior de Alagoas, promovendo obras beneficiam as famílias em situação de vulnerabilidade social. Entre outros municípios, Cacimbinhas, Coqueiro Seco, Penedo, Paripueira e Barra de Santo Antônio.
Sonho começou pequeno, mas ganhou chancela internacional
Antes do programa, moradores das grotas se sentiam excluídos das demais áreas da cidade. A execução do Programa Vida Nova nas Grotas exigiu atuação de diversos atores dentro do governo do Estado.
Era 2015 quando a ideia do programa nasceu como “Pequenas Obras, Grandes Mudanças” e tinha foco apenas em mobilidade urbana. Mas o tino administrativo do ex-governador e atual ministro dos Transportes, Renan Filho, ampliou o pensamento e buscou parcerias. Fez as tratativas e fechou, em 2017, parceria com o ONU-Habitat - Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos. Da área social, com atividades culturais nas comunidades, às obras estruturantes, hoje praticamente todos os órgãos estaduais se encontram engajados na viabilização do programa. Mas cabe à Secretaria de Transporte e Desenvolvimento Urbano (Setrand) as intervenções marcantes: dar uma nova roupagem às grotas com a construção de escadarias, canaletas, corrimão, muros de contenção de barreiras, pontilhões, calçadas e pavimentação.
“Nossas principais demandas são as que dizem respeito à acessibilidade, mobilidade urbana e inclusão social nas comunidades”, diz Paulo Bandeira, braço direito do secretário Mosart Amaral, e coordenador técnico das obras. Ele acompanhou a Tribuna na visita à Grota do Grutão, cujo nome dado é por ser justamente no bairro da Gruta de Lourdes, na parte alta da capital alagoana.
Vida Nova: mudança urbanística potencializa empreendedores nas grotas
Ana Cecília Santos da Silva chegou menina e diz que vai fazer 40 anos de moradia na Grota do Grutão, uma das 74 localidades beneficiadas com o Vida Nova nas Grotas. Os serviços de revitalização executados na comunidade mudaram sua vida — e para melhor.
Há pouco mais de 12 anos, lutou muito para colocar seu pequeno negócio, mas lembra que antes do Vida Nova nas Grotas o comércio local convivia com muita lama na porta dos estabelecimentos e era difícil crescer. “Mas com asfalto, meio-fio, pintura, graças a Deus estamos todos preservando e fazendo mais clientes. Que Jesus ilumine os governadores Renan {Filho) e o Dr. Paulo {Dantas} que melhoraram a vida da gente”, emociona-se, ao ser “traída” por uma lágrima que faz a empreendedora recordar os momentos difíceis que já viveu e agradecer ao ex-governador e ao atual pelas obras no Grutão.
Ela teve sua casa reformada pela Secretaria de Infraestrutura (Seinfra), que a ajudou a melhorar a estrutura da residência para tocar o negócio, uma vez que é gestora de um pequeno restaurante que fornece comida caseira. Com uma filha e um rapaz que lhe ajudam na logística do negócio, Ana tem ainda dois motoqueiros para as entregas das refeições aos clientes. “Vendo muito para os trabalhadores da empresa que faz o serviço nas grotas e alguns clientes de fora”, conta a empreendedora do Grutão.
“Ah, esse tipo de relato não tem preço, com o antes e o depois na vida dessas pessoas. As palavras dos moradores de grota, por si só, já dizem da grandiosidade do programa. Isso é muito importante para toda a equipe e nos motiva a fazer ainda mais”, diz Paulo Bandeira.
De tocador da pife a bebum, todos mudaram de vida com as melhorias
Ele se caracteriza com um indefectível chapéu de lampião à Luiz Gonzaga e é uma figura inconfundível na Grota Santa Helena. É conhecido na redondeza como “Petrúcio Pell do Pife”, da banda de pife Sagrado Coração de Jesus. O morador famoso da Santa Helena conta o que modificou na sua vida depois do Vida Nova nas Grotas.
“Moro há 24 anos aqui e não tinham essas residências que tem. Não tinham. Só mata e barro”, diz Petrúcio, que sem pestanejar, emenda: “A obra [do Vida Nova nas Grotas] aqui melhorou 100% pelo que a gente passava. Hoje, a opção melhor, que vai determinar isso, vai ser quando fizerem o acesso da rodagem, que tão fazendo. E quando terminar, aí pronto, melhorou tudo”, completa o artista da Santa Helena, que afirma viajar para Juazeiro todo ano, pois é devoto de Padre Cícero.
“A Praça Padre Cícero fui eu quem mandei fazer. O terreno era meu. Faço as festinhas aí todo ano. Eu tinha que ter um lugar adequado para fazer as festinhas”, diz Petrúcio, ao finalizar: “Ficou maravilhosa essa obra. Faço duas festas por ano: a festa de Padre Cícero e a festa de Nossa Senhora Aparecida. Dia 12, Dia das Crianças, faço um quebra-pote e festejo com as crianças”.
“Uma senhora nos disse outro dia que as obras nos corrimões das grotas hoje ofertam segurança até mesmo para os que gostam de tomar uma cachacinha e costumam ficar bêbados. Eles pelo menos não caem mais como antigamente por causa dos corrimões”, afirma o coordenador técnico da Setrand, Paulo Bandeira.
Da ONU a prêmios: Pequenas Obras se agiganta e ganha o mundo
O “Pequenas Obras, Grandes Mudanças” saiu de sua estatura de projeto “minúsculo” e tomou outra dimensão, agora gigante com a chancela de nada menos que a Organização das Nações Unidas (ONU). A ideia nasceu em 2015 e em 2016 o programa ONU-Habitat foi procurado pelo governo do Estado. Daí foram iniciadas as tratativas com a agência internacional, que se interessou e topou o desafio. Na largada, foi inaugurado um escritório em Maceió, em outubro de 2017. Um calhamaço do projeto ao qual a Tribuna teve acesso foi entregue ao Governo do Estado pela entidade internacional, a quem coube a missão de mapear as condições de infraestrutura, drenagem de água, mobilidade urbana, padrão construtivo, perfil socioeconômico, grau alfabetização e percepção de problemas nas grotas.
E foi dado também o start para o antigo nome “Pequenas Obras, Grandes Mudanças” se aposentar e dar lugar ao “Vida Nova nas Grotas”.
O programa cresceu com embasamento forte. “Começamos indo à Colômbia verificar uma experiência muito parecida com a nossa realidade. Mais tarde o ONU-Habitat chegou e nos subsidiou com pesquisas e dados”, revelou Mosart Amaral.
No novo projeto, o ONU-Habitat identificou mais 26 grotas, fora as 74 já mapeadas pelo Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). Resultado: após anos de atuação, o programa Vida Nova nas Grotas venceu:
-> Em 2019, o Concurso Gobernarte: A Arte do Bom Governo – Prêmio Eduardo Campos, concedido pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
-> Em 2020, o Prêmio World Smart City Awards 2020 na categoria “Qualidade de Vida e Inclusão”, a premiação mais importante da área no mundo, concorrendo com mais de 50 países. O anúncio foi feito em cerimônia realizada em Barcelona, na Espanha. Nessa premiação, o Vida Nova foi o único brasileiro vencedor, na ocasião.
-> E ainda em 2020, foi apresentado no Fórum Mundial das Cidades, realizado pela ONU em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos.
-> Em 2021, concorreu como finalista ao Prêmio Excelência em Competitividade, iniciativa brasileira realizada pelo Ranking de Competitividade dos Estados, do Centro de Liderança Pública (CLP).
Sob nova direção
Coordenadora-geral da nova fase do Vida Novas nas Grotas, a primeira-dama Marina Dantas revela, nesta entrevista à Tribuna, como pretende dar continuidade e gerir o programa que é uma das “meninas dos olhos” do governo do Estado.
Marina Dantas é uma mulher acostumada a enfrentar desafios. Prefeita do município de Batalha por duas vezes, licenciada em 2022, imprimiu a marca da renovação em seu município ao tempo em que se manteve sensível às demandas da população.
E foi este gosto pelas pessoas mais simples que a fez assumir, como primeira-dama de Alagoas, a coordenação-geral do Vida Nova nas Grotas.
“Desde que conheci melhor as grotas, andando por elas no ano passado, vi o quanto poderíamos fazer pelas pessoas e o que o Vida Nova nas Grotas já está fazendo ao trazer infraestrutura para aqueles locais”, ressalta, ao acrescentar:
“Estamos aqui para somar junto às pastas do estado na implementação de políticas públicas que venham trazer dignidade e cidadania para as pessoas que moram nas grotas. A parceria com o ONU-Habitat reforça ainda mais a importância deste programa.”
Hoje, com coordenação própria, criada em janeiro de 2023, o programa visa à concretização de diferentes políticas públicas nos territórios ocupados pelos assentamentos humanos
Nesta entrevista, concedida à Tribuna, Marina fala do papel da coordenação e dos atores relacionados a este projeto. Conheça um pouco mais os trabalhos desenvolvidos e veja a condução deste novo desafio das causas sociais sob a regência de sua coordenadora-geral.
Tribuna - O Vida Nova nas Grotas é um dos maiores programas do Estado de Alagoas. Como foi assumir a coordenação-geral desta política pública tão abrangente?
Marina Dantas - Um desafio enorme, mas assumi com a convicção de realizar um bom trabalho! O Vida Nova é um programa grandioso, que traz resultados concretos à vida de milhares de pessoas. Eu tenho experiência de gestão e sei da importância de uma iniciativa desse porte. Desde que conheci melhor as grotas, andando por elas no ano passado, vi o quanto poderíamos fazer pelas pessoas e o que o Vida Nova nas Grotas já está fazendo ao trazer infraestrutura para aqueles locais. A criação da coordenação foi uma consequência de toda essa avaliação, a necessidade de sistematizar ações direcionadas a esta população tão vulnerável.
Tribuna - Quais os principais objetivos da coordenação do Vida Nova nas Grotas?
Marina Dantas - Estamos aqui para somar junto às pastas do estado na implementação de políticas públicas que venham trazer dignidade e cidadania para as pessoas que moram nas grotas. A parceria com o ONU-Habitat reforça ainda mais a importância deste programa. A coordenação dialoga com gestores e técnicos, e mantém contato com instituições importantes, que podem contribuir para a expansão do Vida Nova. Nosso objetivo é implementar políticas públicas que afetem positivamente a vida dessas pessoas. Estamos construindo isso, planejando nossos passos com prudência e determinação. A equipe é especializada, formada por profissionais de diferentes áreas, que estão empenhados em fazer um bom trabalho. Sei que construiremos uma plataforma de ações, direcionada aos que mais precisam de serviços do poder público estadual.
Tribuna - O Vida Nova nas Grotas foi implementado desde 2016 quando ainda era o programa Pequenas Obras, Grandes Mudanças. O que a coordenação pode trazer de novo a essa iniciativa?
Marina Dantas - Pode renovar e ampliar o que já vem sendo feito de maneira tão eficiente. A coordenação vai agregar ações de várias pastas e colocá-las em prática dentro de um cronograma objetivo. O Vida Nova nas Grotas precisava de um setor que agregasse e dialogasse com diferentes áreas, que servisse como plataforma de planejamento e execução. Estamos em fase de estudo, mapeando as grotas, entendendo as regiões, visitando os locais, conversando com a população e com lideranças comunitárias. Levantando suas principais necessidades. Além disso, mantemos uma agenda de reuniões com os secretários e técnicos estaduais das mais diversas pastas. A coordenação vai unificar as ações disponíveis no estado e direcioná-las às grotas após um estudo minucioso que envolve toda a equipe. Fazemos um trabalho responsável para ser realizado por longo tempo.
Tribuna - Quais as principais políticas públicas que a coordenação pretende levar às grotas de Maceió?
Marina Dantas - Tudo está sendo feito de forma responsável, segura e planejada. Não é nossa intenção agir de maneira precipitada e não poder cumprir os nossos compromissos. O orçamento precisa estar garantido e ser executado com responsabilidade para dar a todos os envolvidos a segurança na realização de seus trabalhos. Temos eixos temáticos, que nos garantem uma visão macro da realidade social daquelas comunidades. As ações irão envolver saúde, educação, esporte, lazer, segurança, geração de emprego e renda, além da continuidade dos serviços de mobilidade urbana e melhoria habitacional, mas serão executadas racionalmente, de forma esquematizada, para que todas as grotas de Maceió possam realmente sentir os impactos positivos da intervenção do estado.
Tribuna - Para finalizarmos, quem é Marina Dantas?
Marina Dantas - Sou mãe da Paula e da Luíza, esposa do Paulo. Tenho duas cachorrinhas lindas, a Lolita e a Lara, e uma terceira de minha filha Paula, a Mafalda. Todas elas são meus xodós. Sou uma mulher simples, aguerrida, que gosta das pessoas simples, de conversar, de rir, de estar perto da minha família e dos meus amigos. Eu gosto de trabalhar, conheço gestão pública e sei da necessidade das pessoas. Eu gosto de ajudar as pessoas, de estar com elas.
Um olhar inclusivo nas grotas
Com investimentos até agora superior a R$ 160 milhões do Tesouro estadual e que vai atingir cerca de 100 mil pessoas, o Vida Nova nas Grotas é um projeto de intervenção urbana em áreas de vales sinuosos, conhecidos popularmente como “grotas”, as quais funcionam como calhas.
Entre as 53 grotas já concluídas, uma delas está dotada de espaços de esporte e lazer em uma área de 6 mil m². O Parque Linear da Grota do Cigano, no Jacintinho, é uma espécie de “menina dos olhos” do Vida Nova nas Grotas. A obra resultou em duas quadras poliesportivas, um campo de futebol, uma quadra de areia, academia ao ar livre, pista para caminhada, basquete ao ar livre e bicicletário para a população, além de mesas para jogos de tabuleiro, playground para crianças e espaços de convivência com bancos. Em breve, o Governo de Alagoas entregará uma creche por meio do Programa Criança Alagoana (Cria), equipada com berçário, fraldário, cozinha, lavanderia, lactário, salas de alimentação e de administração, e capacidade para atender 200 crianças entre 0 e 3 anos.
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