Cidades
“Acesso às armas aumenta a violência”
Revogação de normas que facilitavam aquisição é vista como necessária e positiva pela Comissão de Estudos Criminais da OAB

Nos últimos anos, foi registrado um aumento exponencial no registro de armas de fogo em todo o país, atingindo a marca de um milhão de armas registradas. De acordo com dados do Exército do Brasil, em Alagoas e outros estados do Nordeste, a quantidade de armas registradas nos últimos três anos mais do que dobrou, principalmente, em virtude dos decretos que foram editados durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Após tomar posse como presidente, no dia 1º de janeiro, Lula assinou o decreto que revoga uma série de normas do governo Jair Bolsonaro (PL) que facilitavam e ampliavam o acesso da população a armas de fogo e munição. Segundo o presidente da Comissão de Estudos Criminais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/AL), Marcelo Herval, muitos dos decretos do governo Bolsonaro sofriam de vícios de inconstitucionalidade.
“Esses decretos contrariavam o que se encontra disposto na legislação que trata da matéria ― a saber, o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003). O Decreto Executivo tem apenas o objetivo de esclarecer e facilitar o cumprimento daquilo que está previsto em uma lei. Ele não pode ser contrário ao que a lei dispõe, porque sua hierarquia é inferior a esta”, explicou.
Além das questões formais, Herval considera preocupante a tendência de maior acesso às armas de fogo entre a população civil, sobretudo diante da existência de diversos estudos que apontam que a facilidade no acesso às armas promove aumento no número de crimes violentos, principalmente o homicídio.
“É o que pode ser observado, entre outros estudos, a partir dos levantamentos realizados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Estudo IPEA: Impactos do Estatuto do Desarmamento sobre a Demanda Pessoal por Armas de Fogo) e pela Fundação Getúlio Vargas (Balas & Vidas Perdidas: o paradoxo das armas como instrumento de segurança)”, exemplificou.
Para o presidente da Comissão de Estudos Criminais da OAB/AL, o decreto editado pelo atual presidente da República revogando vários outros decretos que haviam sido editados na gestão passada e estabelecendo diversos outros limites para aquisição e registro de novas armas de fogo é necessário e positivo.
“Tais mudanças são necessárias e positivas, seja porque os antigos decretos presidenciais sofriam dos já referidos vícios de inconstitucionalidade (havendo, inclusive, ações perante o Supremo Tribunal Federal para discutir tais questões), seja porque a facilidade ao acesso às armas de fogo potencializa (e não reduz) a violência na sociedade”, afirmou.
Para André Sampaio, membro da Comissão de Estudos Criminais da OAB/AL, a utilização de armas de fogo deve ser feita, em regra, pela polícia, que é quem deveria ter o preparo psicológico e técnico, além da devida fiscalização contínua, acerca de sua utilização.
“Armar a população significa, em última análise, ‘terceirizar’ o ofício público da manutenção da segurança social para o indivíduo, o que em um primeiro momento abrange os mais ricos, tendo em vista o custo para a aquisição de armas de fogo, mas que em última instância também alcança as populações pauperizadas, já que a maioria das armas clandestinas no Brasil são adquiridas justamente por meio da subtração de armas legais”, afirmou.
Sampaio ressaltou que um maior número de armas de fogo não só não aumenta a segurança como incrementa o risco de crimes violentos. “Quando se fala de causas de crime o problema é sempre complexo, pois se tratam de múltiplos fatores, mas há inúmeros estudos que comprovam a tendência de um aumento de crimes violentos com a introdução de mais armas de fogo, como os citados acima”, disse.
A psicóloga Emanuelle Lima é credenciada pela Polícia Federal, realiza avaliações e emite laudos para comprovação de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo. Para ela, todo cidadão deve ter direito à posse de arma.
“Eu acredito que todo cidadão deva ter o direito de defender sua família e propriedade, tendo sua posse de arma, ou seja, arma em sua residência. O aumento de posse de armas de fogo se deu por uma política armamentista do ex-presidente Bolsonaro, situação que agradou a alguns e desagradou a outros. Já o governo Lula comunga de uma outra ideologia, principalmente, no tocante a armas nas mãos da população”, afirmou Lima.
Campanha para Entrega Voluntária de Armas de Fogo pode voltar
Na gestão do governo Bolsonaro, a Campanha para Entrega Voluntária de Armas de Fogo, realizada pela Secretaria de Estado de Prevenção à Violência (Seprev) conveniada com o Governo Federal, foi cancelada.
De acordo com a pasta, ainda não se sabe como será na atual gestão. Se o Governo Federal sinalizar com o retorno, o órgão pretende retornar. “A posição da Seprev quanto à temática vai de encontro com o posicionamento do Governo Federal. Como o controle de armas é uma questão nacional, a Seprev, no âmbito local, vai se adequar à política nacional”.
O órgão ressaltou ainda que houve um crescimento no número de armas em todo o Brasil. “Realmente, houve um crescimento exponencial de armas no país e isso precisa ter um controle maior. A Seprev está aguardando o posicionamento do Governo Federal para retorno ou não da Campanha de Entrega Voluntária de Armas de Fogo, como acontecia no passado”.
DECRETO
O decreto foi publicado no Diário Oficial da União no dia 2 de janeiro e já está em vigor. O texto suspende novos registros de armas por caçadores, atiradores e colecionadores (CACs) e por particulares; reduz os limites para compra de armas e munição de uso permitido; suspende novos registros de clubes e escolas de tiro; suspende a concessão de novos registros para CACs; cria grupo de trabalho para propor nova regulamentação para o Estatuto do Desarmamento, de 2003.
Além disso, o decreto também revoga a expansão do limite de armas de uso permitido estabelecida em junho de 2019. Assim, os colecionadores, caçadores e atiradores têm o limite de três armas, devendo apresentar “comprovação de efetiva necessidade” para comprar uma arma.
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