Cidades

Intolerância religiosa: Evento marca 105 anos do Quebra de Xangô

Mais de 100 grupos tradicionais da capital e do interior reforçaram a importância do combate à intolerância religiosa

Por Tribuna Independente 03/02/2017 09h23
Intolerância religiosa: Evento marca 105 anos do Quebra de Xangô
Reprodução - Foto: Assessoria

Grupos de matriz africana reforçaram a importância do combate à intolerância religiosa na sexta edição do projeto Xangô Rezado Alto. O evento, realizado ontem (2), marca os 105 anos do “Quebra de Xangô”.

As atividades, distribuídas nas Praças da Assembleia e dos Martírios, tiveram a participação de mais de 100 comunidades tradicionais de Maceió e do interior do estado. Ao todo, 28 grupos se apresentaram.

Vinícius Palmeira, presidente da Fundação Municipal de Ação Cultural (Fmac), disse que o papel do poder público é viabilizar ações que combatam o preconceito, a intolerância e o desrespeito. “Há seis anos referendamos nosso compromisso. Somos interlocutores e temos orgulho em realizar ações como essas e aumentar o nível de integração entre os grupos culturais”.

Realizado a partir de convênio com o Ministério da Cultura (MinC), o evento teve apresentações de afoxés, maracatus e orquestras de percursionistas e capoeira. Também houve cortejo pelas ruas do Centro de Maceió relembrando os acontecimentos da “Quebra de Xangô”.

Iara Miguel, de 22 anos, é integrante da Casa de Ilê Axé. Para ela o evento serve como reforço para o combate à intolerância religiosa. “Nos preparamos o ano inteiro para dizer não ao preconceito. Se expor não é tão fácil, mas estamos aqui contra a intolerância religiosa”, disse a jovem.

Ela explicou que a articulação para o evento começa bem antes. Convocando os grupos para a adesão ao evento e planejando as atividades que serão desenvolvidas para o público.

Amaurício de Jesus, coordenador de políticas culturais da Fmac, explicou que a sexta edição do projeto contou com articulação direta de produtores e artistas negros combatendo o preconceito racial. “É uma ação extremamente nova, de uma comunidade que há mais de 100 anos está num espaço de invisibilidade, para vir à rua mostrar a presença negra”.

Participante

“Temática não pode ser debatida em tom festivo”

Para Bárbara Moraes, articuladora do Afoxé Povo de Exú, a temática não pode ser debatida em tom festivo e sim como forma de protesto contra a intolerância religiosa, que segundo ela ainda é presente.

“Para mim é importante relembrar o evento de quebra, não é uma coisa que acontece todos os dias. Estamos sempre discutindo isso porque ainda sofremos consequências, ainda sofremos preconceito. Agora é que estamos nos desprendendo, colocando os tambores na rua, mais livres, mas ainda existe repressão”.

Apesar da baixa adesão do público, Amaurício reforçou que o evento tem crescido ao longo dos anos. “Nós entendemos que é um processo formativo. Existe um estranhamento por conta do processo de perseguição, mas cada vez mais tem crescido a ação. A juventude tem se aproximado como uma proposta nova”.

Segundo Bárbara, todos os dias os religiosos sofrem preconceitos. “Trazer para rua, falar com a população, para que saiba o que aconteceu, desmistifica, faz com que a gente se encontre e a cada dia esse preconceito seja derrubado”, destacou.

A data foi incorporada às agendas dos grupos para reforçar a importância da participação.

“Apesar de ser um dia de semana, tivemos um resultado muito bom. Chamamos os grupos para participar e eles se fizeram presentes contra a repressão que sofremos e os preconceitos existentes”, aponta.

 

HISTÓRICOAto foi o mais violento contra religiões de matriz africana

Em 1º de fevereiro de 1912, casas de culto de matriz africana foram fechadas e destruídas em Maceió e em diversos municípios do interior do estado.

Conhecido como ‘Quebra de Xangô’ o ato é lembrado desde então como o mais violento contra as religiões de matriz africana em Alagoas.

Em 2012, durante as comemorações dos 100 anos do episódio violento, o Governo de Alagoas, assinou um pedido de perdão às comunidades negras e representantes do candomblé e umbanda do estado.

Bárbara Moraes explica que por muito tempo as comunidades realizavam seus rituais de forma escondida por medo de sofrer represálias.

Na época a milícia intitulada Liga dos Republicanos Combatentes incendiou casas de candomblé e umbanda, além de espancar integrantes.

“Durante o Xangô Rezado Alto os grupos reforçam a necessidade de combate ao preconceito religioso, racial e cultural existente contra esse segmento”, explicou Amaurício de Jesus.

Segundo dados do projeto Xangô Rezado Alto, em Alagoas existem cerca de 2 mil centros de cultos afros.