Política

Sem território demarcado, povo Xukuru-Kariri se frustra com governo federal

Em nova leva de demarcações, indígenas de Palmeira dos Índios aguardam nova medida do presidente Lula

Por Emanuelle Vanderlei - colaboradora / Tribuna Independente com Agências 07/12/2024 09h38 - Atualizado em 07/12/2024 09h53
Sem território demarcado, povo Xukuru-Kariri se frustra com governo federal
Governo Lula vai entrar em contato com o governador Paulo Dantas para tratar sobre a demarcação das terras Xukuru-Kariri, no município de Palmeira dos Índios - Foto: Assessoria Cimi

Com a homologação de três novas demarcações de terras indígenas na última quarta-feira (4), o presidente Lula (PT) se aproximou de cumprir a promessa de demarcar pelo menos 14 terras durante o seu mandato. Ainda dentro do prazo, ele já demarcou 13 locais, ficando faltando apenas uma, justamente a alagoana Xukuru-Kariri, localizada em Palmeira dos Índios.

Cícero Albuquerque, coordenador em Alagoas da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, lamenta que a etnia de Palmeira dos Índios tenha ficado sem a concretização do direito. “Infelizmente, mais uma vez, o povo Xucuru-Kariri sofreu a frustração de não ter a homologação de suas terras realizada. O povo está cansado de sinalizações, espera ato efetivo. Não há data prevista porque essa data já está vencida”.

A frustração se dá, em grande parte, porque não é foi primeira vez que a homologação é esperada. Em abril desse ano, quando foram homologadas novas terras, havia uma grande expectativa de que os Xukuru-Kariri seriam contemplados. Segundo reportagem do jornal O Globo, de maio de 2024, “Ela [terra dos Xukuru-Kariri] foi tirada de última hora de uma lista de territórios que seriam homologados em razão de um ‘problema político’ — conforme justificou o presidente”. Informações de bastidores contam que as lideranças já estavam em Brasília, e voltaram decepcionados com a mudança.

Foram demarcadas, nesta última leva, as terras indígenas Potiguara de Monte-Mor, na Paraíba, e de Morro dos Cavalos e Toldo Imbu, em Santa Catarina. Reconhecendo a pendência de Alagoas, Lula falou durante a cerimônia que está em contato com o governador Paulo Dantas (MDB) e pretende fechar o pacote das 14 terras com a homologação da Xukuru-Kariri antes de acabar 2024.

“Eu liguei para o governador e ele vem na segunda-feira [9] para Brasília para se reunir com o ministro Márcio Macêdo e com a ministra Sonia Guajajara para ver se a gente resolve ainda este ano essa terra de Alagoas”, afirmou Lula.

Em abril de 2023, já havia a expectativa de que as duas etnias alagoanas teriam as demarcações homologadas neste primeiro pacote. Em entrevista à Tribuna Independente na época, o superintendente de Políticas para os Povos Originários, Maynamy Santana, confirmou essa informação.

“Alagoas tem duas terras em processo de finalização, Xukuru-Kariri, de Palmeira dos Índios, e os Kariri Xocó, de Porto Real do Colégio. A avaliação que nós fazemos é que há um ganho principalmente na preservação de biomas porque a maior área de proteção ambiental está dentro da demarcação. Assim como em Porto Real do Colégio que também tem áreas de biomas extremamente relevantes não apenas para Alagoas, mas para o Brasil e o mundo, que vive hoje uma crise climática imensa”.

As terras dos Kariri-Xocó foram contempladas com a homologação nesse primeiro momento, quando foram anunciadas as primeiras seis etnias em abril de 2023. Foi a primeira demarcação homologada de terras indígenas aqui no estado. Ainda naquele período, o cacique Cicínho, da Xukuru-Kariri explicou que o processo de demarcação dos Xukuru-Kariri já tinha mais de 15 anos. “Já está há quase oito anos com tudo finalizado, esperando só a homologação da presidência. A expectativa com esse novo governo é que aconteça”.

Ao longo desse tempo, ele relatou que as demarcações físicas têm sido desrespeitadas. “Demarcada a área já está, as demarcações físicas. As placas foram arrancadas, o desrespeito com a lei brasileira, com a Constituição é terrível. As pessoas ficam violando, trazendo a violência incitando medo nas comunidades indígenas”.

Só na Xukuru-Kariri, a demarcação deve contemplar em torno de 3500 indígenas, de acordo com o cacique. Ele afirma que a área tem em torno de 450 títulos de terra. “A mudança não é fácil, e a terra sendo homologada pelo presidente da república não é fácil para os indígenas enquanto não desentrosar ela. Aí tem que gerar muito recurso para o pagamento das benfeitorias para o pessoal [posseiros]”.

“COMPROMISSO”

Em contato com a reportagem da Tribuna Independente, a Prefeitura de Palmeira dos Índios, ainda gerida pelo prefeito Júlio Cesar (MDB), informou que tem compromisso para solucionar questões tão sensíveis e importantes como a demarcação de terras indígenas.

“Reconhecemos a relevância do tema e defendemos que todas as discussões ocorram de forma respeitosa, transparente e em conformidade com a legislação vigente, sempre buscando o equilíbrio entre os direitos das populações indígenas, os interesses das comunidades locais e o desenvolvimento sustentável do município. Nossa gestão acredita que a união de esforços pode trazer soluções justas e pacíficas para todos os envolvidos”, informou, por meio de nota.

Presidente diz que legado é definir o território indígena

Durante a solenidade que homologou a demarcação de mais três terras indígenas - das terras indígenas de Potiguara de Monte-Mor, na Paraíba, e de Morro dos Cavalos e Toldo Imbu, em Santa Catarina - o presidente Lula disse que também faz parte do seu legado à medida que garante legalidade às comunidades indígenas.

“Se um dia perguntarem para mim qual é o meu legado na presidência, eu vou dizer: o cara que mais autorizou terras indígenas nesse país. Foi no meu governo”, destacou Lula durante a cerimônia de homologação, realizada em Brasília.

A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, ressaltou durante a assinatura que a homologação cumpre compromissos assumidos durante a transição de governo, em 2022. “Hoje completamos a 13ª terra indígena homologada desde o início da gestão. Esse ato reafirma nosso compromisso com os povos indígenas e com a proteção de seus territórios. E nós estamos confiantes que, até o final do ano, a gente consiga alcançar essa meta de 100%”, afirmou.

Em abril do ano passado, o governo Lula assinou a demarcação definitiva de seis terras indígenas em seis estados.

Segundo o governo, foram as primeiras demarcações homologadas desde 2018. Nos últimos quatro anos, o governo Jair Bolsonaro não avançou no tema – o ex-presidente se gabava, em discursos, de não fazer novas demarcações.

Ao todo, as áreas somam 612.863,3 hectares – ou 6.128 quilômetros quadrados. Atualmente, o Brasil tem 732 áreas indígenas demarcadas que, juntas, ocupam 117.377.533 hectares – 13,8% da extensão do país.

As demarcações ocorreram nas terras indígenas Arara do Rio Amazônia, no Acre; Kariri-Xocó, em Porto Real do Colégio, em Alagoas; Rio dos Índios, no Rio Grande do Sul; Tremembé da Barra do Mundaú, no Ceará; Uneiuxi, no Amazonas; Avá-Canoeiro, em Goiás.